Comissão de Trabalhadores acusa Santander Totta de ameaçar funcionários que não aceitam rescisões

por Paulo Alexandre Amaral - RTP
Edgard Garrido, Reuters

A Comissão Nacional de Trabalhadores do Santander Totta acusa a administração do banco de estar a "coagir" e "ameaçar" funcionários para que aceitem o plano de rescisões que arrancou na instituição este mês de Outubro. De acordo com um membro do secretariado da CT, é uma empresa externa de auditoria que está a contactar os funcionários, insinuando que as rescisões não são voluntárias mas obrigatórias.

João Pascoal, membro do Secretariado Executivo da Comissão Nacional de Trabalhadores do Santander Totta, acusa a administração do banco de estar a levar a cabo uma campanha de intimidação  sobre os trabalhadores que não aceitem as propostas de rescisão por mútuo acordo previstas no plano de reestruturação que arrancou este mês de Outubro na instituição.

“A maioria dos trabalhadores que foram chamados às reuniões não querem rescindir e são ilegalmente ameaçados nessas reuniões, de terem de assinar porque o banco não os quer e que depois serão despedidos sem essas indemnizações”, avança João Pascoal, denunciando que “a Administração do Banco Santander Totta deu início a um processo de despedimentos de trabalhadores”.

A Comissão de Trabalhadores distancia-se aqui da terminologia usada pelo Santander Totta, que, segundo este membro da CT, refere as saídas como parte de uma “reorganização permanente” e não de uma “reestruturação”, processo que, no final do primeiro semestre deste ano, dispensou já 167 trabalhadores e fechou 25 balcões, face à estrutura que existia doze meses antes, de acordo com os números avançados pelo próprio banco.

“Este processo dá-se numa altura em que o banco está a contratar novos trabalhadores a menor custo e também a proceder a novos contratos com empresas de outsourcing”, acrescenta a Comissão de Trabalhadores, assinalando que um dos critérios da dispensa de trabalhadores passa pela opção por trabalho precário.
Negociação em clima hostil

Dando a ideia de que as negociações estão a ser levadas a cabo sob um clima hostil, João Pascoal explica que “as reuniões decorrem em edifícios do Banco em Lisboa, Porto e Faro” com “os Recursos Humanos a fazerem-se assessorar por uma empresa de consultores externos que pressionam os trabalhadores e chegam mesmo a ameaçá-los”.

De acordo com João Pascoal, o “trabalho sujo” do processo de dispensa dos trabalhadores cabe à referida empresa de consultoria que, após as reuniões, passa a exercer uma “pressão inqualificável e manifestamente ilegal” sobre aqueles funcionários que não aceitem os valores ou as condições da rescisão.

Neste sentido, sublinha aquele representante dos trabalhadores, “a consultora não tem direito legal a contactar os trabalhadores ou a dizer-lhes que têm de assinar um contrato de rescisão”.
Sindicatos atentos à consultoria externa

Um comunicado desta quinta-feira dos sindicatos do sector bancário assumia a mesma linha crítica da Comissão de Trabalhadores do Santander Totta, advertindo que não iria permitir quaisquer pressões ou ameaças sobre os trabalhadores.

Confirmando que “muitos trabalhadores” do Santander Totta estão a ser chamados para rescisões por mútuo acordo, os sindicatos do Setor Financeiro (Mais) e dos Bancários do Centro (SBC) lembram que esses trabalhadores são livres de aceitar ou recusar o que lhes é proposto durantes as reuniões.

“Muitos trabalhadores do Banco Santander Totta estão a ser convocados para uma reunião com os recursos humanos, na qual está também presente um consultor externo. O objetivo é apresentar-lhes uma proposta de rescisão por mútuo acordo, tendo como contrapartida uma indemnização”, refere o comunicado conjunto do Mais Sindicato e do SBC, avisando desde logo o Santander de que não aceitarão que os trabalhadores venham a ser alvo “de qualquer tipo de pressão ou ameaça”.

O Mais sindicato e o SBC aconselham ainda a administração do banco a que descarte qualquer cenário de extinção do posto de trabalho ou de despedimento coletivo; aos trabalhadores, os sindicatos reiteram a sua disponibilidade para os ajudar no decorrer do processo e aconselham para já que recorram a apoio jurídico para que estejam seguros “das consequências da sua decisão”.

Contactado pela RTP para responder a estas acusações, o Santander Totta não respondeu aos nossos emails até à hora de publicação deste artigo.
Menos 167 trabalhadores e menos 25 agências

Em Julho, o Santander Totta revelou os resultados semestrais segundo os quais contava no final do primeiro semestre com menos 167 trabalhadores (6.163) e 25 (491) balcões relativamente ao mesmo período de 2019.

Os lucros de 172,9 milhões de euros até junho representavam uma queda de 37% face ao período homólogo. O banco, detido pelo grupo espanhol Santander, anunciava então prejuízos recordes de quase 11 mil milhões de euros no primeiro semestre, de acordo com o comunicado.
Crise da banca ameaça trabalhadores

Os bancos que operam em Portugal tinham no final do primeiro semestre 3.965 agências, menos 117 face a junho de 2019, segundo a Síntese de Indicadores do Setor Bancário divulgada pela Associação Portuguesa de Bancos (APB).

Quanto a trabalhadores, na atividade doméstica, eram 46.714 no final do primeiro semestre, neste caso praticamente estável (mais 41) face ao primeiro semestre de 2019, ainda de acordo com a associação que representa os principais bancos que operam em Portugal.

Nos últimos anos tem vindo a ser operada uma redução da estrutura dos bancos e, apesar do ligeiro ganho de trabalhadores indicado nestes dados, os analistas preveem que nos próximos meses o setor venha a cortar no pessoal em termos agregados.

No final de julho, numa análise contextualizada pela actual pandemia de covid-19, a agência de 'rating' Fitch considerava que, face a esta nova ameaça, uma das medidas que os bancos tomariam seriam novas reestruturações.
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