Ferrovia, aeroporto, alívio fiscal a empresas e uma maior recessão. O que prevê o plano de recuperação económica para Portugal?

por RTP
Lusa

António Costa Silva entregou na quinta-feira o plano de recuperação económica para Portugal pós pandemia. O consultor entregou ao executivo um plano de 119 páginas, com uma aposta na ferrovia, num novo aeroporto, bem como um alívio fiscal a empresas. Costa Silva é mais pessimista no que toca ao futuro próximo, estimando uma recessão maior do que a antecipada para o Governo este ano.

“Não vamos ter ilusões: a crise sanitária causada pela doença COVID-19 traz consigo uma profunda recessão económica que tem características globais e que vai ferir profundamente a nossa economia”, lê-se no início do documento que o consultor António Costa Silva submeteu ao governo e a que o jornal Expresso teve acesso.

“A queda do PIB em 2020 pode chegar aos 12%; a queda do consumo aos 11%; a queda do investimento aos 26% e a taxa de desemprego aos 11,5%”, refere o documento.
No atual cenário macroeconómico do Orçamento Suplementar para 2020, o governo só admite quedas de 6,9% para o PIB.
A situação pode deteriorar-se em setembro e tem de estar no terreno um programa agressivo para evitar que empresas rentáveis caiam, diz o consultor. Razões para serem necessárias respostas urgentes.

“O espaço temporal que vai mediar entre a significativa deterioração da economia no segundo semestre de 2020 e a chegada da ajuda europeia em 2021, pode ser fatal para muitas empresas se não existirem respostas adequadas”, argumenta.

António Costa Silva considera essencial para o país terminar a construção de algumas infraestruturas indispensáveis para o sucesso futuro. “O país tem acumulado muitas polémicas sobre as infraestruturas. É agora o tempo de as fazer”, lê-se na proposta de 119 páginas que submeteu ao governo, citada pelo Expresso.

O consultor considera que a construção de infraestruturas será uma alavanca económica numa primeira fase, “arrastando todo o setor da construção, dinamizando as empresas nacionais e os fornecedores de equipamentos e serviços e, consequentemente, promovendo o emprego”.

São 14 as prioridades para o investimento na rede de infraestruturas de transportes e mobilidade:

Ligação aérea

▪ Construir o Aeroporto para a grande Área Metropolitana de Lisboa, tendo em conta que as ligações aéreas são fundamentais na performance da economia portuguesa, tanto para o turismo como para outras fileiras económicas.

▪ Assegurar que todo o país, em particular a região norte, onde há uma concentração elevada de empresas exportadoras, tenha uma cobertura adequada de ligações aéreas.

Ferrovia

▪ Concretizar o Plano Ferroviário do país;

Considera que uma rede ferroviária elétrica nacional é mais competitiva, mais limpa e está em sintonia com os esforços de descarbonização da economia.

Destacam-se dois projetos em curso: a construção do eixo Sines-Madrid e a renovação da Linha da Beira Alta, essenciais para o tráfego de mercadorias para Espanha e aumentando a quota de transporte internacional de mercadorias para o centro da Europa.

▪ Construir um eixo ferroviário de alta velocidade Porto-Lisboa para passageiros. Esta ligação potenciará a afirmação das duas áreas metropolitanas do país e o seu funcionamento em rede;

Uma posterior ligação a Espanha pode favorecer todo o litoral português e facilitar o equilíbrio financeiro da exploração. A ligação Porto-Vigo, bem como outras “amarrações ibéricas”, devem ser equacionadas no médio prazo.

▪ Ampliar a rede de ligações ferroviárias nacionais para o país ficar dotado de uma rede de transportes públicos e de mercadorias que seja competitiva e mais sustentável quando comparada com o transporte rodoviário.

Marítimo-portuário

▪ Investir nos portos de Sines e de Leixões;

▪ Consolidar um hub portuário nacional polivalente e que responda às exigências da procura nos segmentos da navegação comercial, turismo, transporte de longa e curta distância;

▪ Construir em Sines um terminal portuário de minérios para exportação dos recursos minerais estratégicos;

▪ Resolver o problema dos portos do Algarve, apostando em Portimão, tendo em conta as melhores acessibilidades, as infraestruturas existentes e a capacidade de expansão;

▪ Resolver os problemas estruturais do porto de Lisboa, criando condições para o estabelecimento de uma plataforma de negociação que conduza a um pacto entre as empresas e as entidades sindicais que salvaguarde o funcionamento de uma estrutura que é vital;

▪ Desenvolver um plano para reconverter o Porto da Praia da Vitória, nos Açores, numa espécie de estação para fornecer gás natural liquefeito aos navios que cruzam o Atlântico;

Transportes públicos e mobilidade sustentável

▪ Alargar a rede de Metropolitano de Lisboa para zonas densamente povoadas da cidade e da sua periferia imediata, e introduzir novas formas de transporte;

▪ Reforçar a oferta e promover a expansão de sistemas de metro ligeiro na Área Metropolitana do Porto, em zonas onde a procura justifique esta tecnologia e construindo uma nova ponte para o metro a montante da ponte da Arrábida;

▪ Desenvolver sistemas de transportes coletivos nas cidades de média dimensão (Braga, Guimarães, Aveiro, Coimbra, Leiria, Évora, Faro, entre outras), aumentando a oferta de transportes públicos de passageiros que conduza à redução da dependência de transporte individual nos acessos aos principais centros urbanos e à descarbonização.
Alívio fiscal para pequenas e médias empresas
António Costa Silva pede ao Governo que equacione um alívio da carga fiscal das pequenas e médias empresas que empregam mais de 75% das pessoas em Portugal e representam 95% do tecido empresarial.

É a forma de as empresas poderem “sair do estado de coma”, recuperar e criar condições para crescerem de novo, além de reduzir uma “carga fiscal muito elevada e que torna o país menos competitivo”.
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Na visão de Costa Silva, “é importante reconhecer o papel das empresas como motor real do crescimento e da criação de riqueza” e que “é muito importante pensar num Pacto Estado/Empresas, que regule o papel de ambos”, defende o documento entregue ao Executivo.

“O papel do Estado na economia tem de ser explicitado juntamente com os critérios de apoio às empresas e as condicionalidades associadas para a manutenção do emprego e a exigência de um esforço das empresas para reinventarem os seus planos de negócio, serem mais competitivas e lutarem por nichos do mercado global, onde podem fazer a diferença”.

Defende a procura de nichos de mercado na globalização, um aumento da competitividade pela inovação tecnológica e não através de salários baixos, e uma aposta na internacionalização, por exemplo.

O Pacto é a via para corrigir vulnerabilidades do tecido empresarial português, no sentido de produzir uma nova geração de “campeões globais” capazes de venderem não só produtos, mas também ideias e serviços à escala global.

No entanto, o pano de fundo para a tomada de medidas é bastante mais pessimista do que o do Governo. “Não vamos ter ilusões”, considera Costa e Silva, alertando que queda do PIB português pode chegar aos 12% em 2020.

Costa Silva quer indexar financiamento da segurança social ao rendimento das empresas. Propõe programa de reformas antecipadas para os professores mais idosos e a criação de um programa de apoio à manutenção de postos de trabalho menos qualificados.

Este deve “garantir que sectores menos qualificados da população ativa cujo emprego esteja ameaçado pela modernização da economia possam ver os seus postos viabilizados durante um período de transição, por via de apoios públicos à manutenção de serviços em processo de automatização, por exemplo, em funções de atendimento”.

Também sugere ao Governo que desenhe um programa de criação de emprego social para quebrar ciclos de pobreza e de exclusão económica e social que a atribuição de subsídios não garante. Postos de trabalho sem grande valor económico mas de elevado valor social.
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