Gás russo. Petrolífera italiana Eni tenta quadratura do círculo para pagar à Rússia

por RTP
A Gazprom ainda não respondeu aos pedidos de comentário na sequência dos esclarecimentos da Comissão Europeia Anatoly Maltsev/ EPA

A petrolífera italiana Eni anunciou que deu início ao processo de abertura de uma conta em rublos e outra em euros no Grazprombank. É uma preventiva e temporária que visa assegurar o pagamento do gás russo "nos próximos dias". A abertura de conta em rublos não viola as sanções da União Europeia a Moscovo, garante a empresa, mas a Comissão Europeia entende o contrário. A confusão entre Estados e empresas está instalada.

"A empresa vai abrir temporariamente as duas contas sem prejuízo dos seus direitos contratuais, que ainda prevêm o pagamento em euros", refere a empresa italiana Eni em comunicado.

Na nova forma de pagar o gás russo importado por Itália, será feita uma “transferência de euros”, a moeda de faturação e de pagamento prevista em contrato. Depois, "um operador da Bolsa de Valores de Moscovo efetuará a conversão em rublos em 48 horas e sem intervenção do banco central da Rússia", refere a petrolífera italiana.

Desta forma, a Eni, um dos maiores importadores de gás russo, quer assegurar que o novo procedimento não é incompatível com as sanções aplicadas a Moscovo pela Comissão Europeia e continuar a garantir o abastecimento de gás russo.

Controlada em 30,3 por cento pelo Estado italiano, a Eni referiu que a decisão foi tomada em desacordo com o governo, tem um caráter temporário e deveu-se ao pedido unilateral da Gazprom de alterar os contratos existentes para um novo esquema de pagamento do gás.

Num primeiro momento, o Kremlin exigia que se fizesse uma transação através do banco central russo, o que é proibido pelo regime de sanções da União Europeia (UE), na sequência da invasão da Ucrânia. Depois, Moscovo introduziu o pagamento em duas fases: um valor inicial em euros ou em dólares numa conta do Gazprombank, seguindo-se a conversão em rublos numa segunda conta aberta junto da mesma instituição.

Comissão insiste em declaração de pagamento

Países e empresas procuram há semanas obter esclarecimentos da Comissão Europeia sobre como podem proceder com os pagamentos sem violar as sanções postas em prática após a invasão da Ucrânia pela Rússia.

Na sexta-feira, Bruxelas disse aos Estados membros que as sanções europeias não impedem as empresas de abrirem contas num determinado banco, mas repetiu que o mecanismo de conversão em rublos constituía uma forma de contornar as sanções. Quase todos os contratos de empresas europeias com a Gazprom prevêm o pagamento em euros ou dólares.

Esta terça-feira, o porta-voz da Comissão Europeia veio dizer que a abertura de uma conta em rublos viola o regime de sanções. “Vai além das indicações que demos aos Estados-membros do que era permitido ao abrigo do regime”, disse.

De acordo com Eric Mamer, as indicações consistem em “abrir uma conta nas moedas previstas no contrato, efetuar um pagamento nesta moeda e fazer uma declaração a dizer que encerra o pagamento da entrega de gás em causa”.

 
Com a "declaração clara" de que, ao pagarem em euros ou dólares, consideram cumpridas as suas obrigações sob os contratos existentes, as empresas poderiam evitar envolver-se em negociações com o banco central russo, que está sob sanções, para o processo de conversão de euros em rublos, referem as orientações da Comissão Europeia.

A Eni referiu que vai tomar uma decisão relativa ao pagamento do gás russo nas próximas horas ou dias. A empresa tem até 20 de maio para fazer o pagamento em rublos, caso contrário Moscovo corta o fornecimento de gás. Já Mario Draghi garantiu que a Eni pagaria a tempo, mas não especificou se o iria fazer em euros ou em rublos.

Ainda segundo o primeiro-ministro italiano, a maioria dos importadores de gás russo "já abriu contas em rublos".

Também a maior importadora de gás russo da Alemanha, a Uniper, revelou que vai proceder à transferência de euros para uma conta no Gazprombank, de modo a cumprir as exigências de Moscovo. Contudo, não mencionou uma conta separada em rublos, nem uma data específica para o pagamento do gás importado. No mesmo sentido, o grupo alemão RWE tornou pública a abertura de uma conta na Rússia para pagar o gás em euros.

A francesa Engie disse também que o próximo pagamento à Gazprom seria feito em euros antes do final do mês.

Eni e Gasum recorrem a tribunal de arbitragem

Para resolver a incerteza sobre as alterações nos pagamentos, a petrolífera italiana também anunciou que pretende recorrer à arbitragem internacional, com base na lei sueca, de acordo com os contratos atuais.

Junta-se ao fornecedor estatal finlandês Gasum, que também tornou público que não ia aderir ao sistema de pagamentos definido pela Gazprom e que ia levar o assunto do pagamento em rublos à arbitragem.

"Nesta situação, a Gasum não teve escolha senão levar o contrato à arbitragem. Nesta situação desafiante, vamos fazer o nosso melhor para sermos capaz de fornecer os nossos clients finlandeses com a energia que precisam”, declarou o CEO da empresa, Mika Wiljanen.
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