Multinacionais devem financiar desenvolvimento da região

por Lusa

O Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD)de Moçambique defendeu hoje que o financiamento da Agência de Desenvolvimento Integrado do Norte (ADIN), instituição estatal que vai implementar projetos no norte de Moçambique, deve ser feito pelas petrolíferas multinacionais.

"É em sede dos contratos com as multinacionais que deve ser garantido o financiamento para o desenvolvimento local", disse o diretor do CDD, Adriano Nuvunga.

O CDD é uma das mais destacadas organizações da sociedade civil moçambicanas e expõe a sua tese sobre o financiamento da ADIN numa análise intitulada "1 bilião de dólares [mil milhões de dólares] para ADIN: Nova dívida não declarada ao Parlamento?".

Na análise, o CDD critica um recente anúncio do ministro da Agricultura e Desenvolvimento Rural de Moçambique, Celso Correia, de que o Governo está a mobilizar mil milhões de dólares (841 mil milhões de euros) para o financiamento das atividades da ADIN.

"A forma como o financiamento está a ser mobilizado pode comprometer os resultados esperados: recorrer ao endividamento público para mobilizar um bilião de dólares vai agravar a já insustentável dívida pública", lê-se no texto.

O desenvolvimento do norte de Moçambique visa, em última instância, criar um ambiente de aceitação dos projetos de exploração de gás natural, observa o CDD, citando o diretor da organização.

"É possível encontrar formas de as multinacionais adiantarem o dinheiro para o Estado moçambicano para garantir o desenvolvimento local. Quando a produção [de gás natural] começar, lá mais para frente, as empresas podem fazer esse desconto sem onerar o Estado com dívidas", afirmou Adriano Nuvunga.

O CDD critica o facto de a mobilização do financiamento ser feita "antes mesmo" da aprovação do plano estratégico da ADIN, "denominado" Estratégia Resiliente do Desenvolvimento Integrado do Norte.

"O documento ainda está em consulta pública nas três províncias onde serão implementados os projetos da agência", assinala aquela organização da sociedade civil.

O ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, devia apresentar a proposta de financiamento da ADIN à apreciação da Assembleia da República (AR) para que seja aprovada dentro do sistema nacional de governação e de gestão das finanças públicas, defende o CDD.

"Permitir que se mobilize um bilião de dólares fora do sistema nacional das contas públicas, estamos a voltar a fazer novas dívidas ocultas", comentou Adriano Nuvunga.

As "dívidas ocultas" são empréstimos que o anterior executivo moçambicano avalizou a favor de empresas públicas ligadas à segurança marítima e pescas, no valor de cerca de dois mil milhões de euros, à revelia da Assembleia da República (AR) e do Tribunal Administrativo (TA) e que acabaram dando origem a processos judiciais em Moçambique e no estrangeiro.

A ADIN foi criada em março de 2020 pelo Conselho de Ministros moçambicano, para a promoção de ações de caráter multiforme visando o desenvolvimento socioeconómico das províncias de Cabo Delgado, Niassa e Nampula e criação de emprego para os jovens do norte de Moçambique.

O Governo moçambicano defende que a promoção de emprego tem o objetivo de desencorajar os jovens de se juntarem-se aos "grupos terroristas" que têm protagonizado ataques nos distritos do centro e norte de Cabo Delgado desde outubro de 2017.

O CDD sustenta que "através de projetos de desenvolvimento socioeconómico e de criação de emprego para jovens, a agência pode desempenhar um papel estratégico na eliminação das causas internas do conflito ou dos problemas locais que tornam a juventude vulnerável a recrutamento pelos grupos terroristas".

A violência armada em Cabo Delgado começou há mais de três anos, mas ganhou uma nova escalada há mais de duas semanas, quando grupos armados atacaram pela primeira vez a vila de Palma, que está a cerca de seis quilómetros dos multimilionários projetos de gás natural.

Os ataques provocaram dezenas de mortos e obrigaram à fuga de milhares de residentes de Palma, agravando uma crise humanitária que atinge cerca de 700 mil pessoas na província, desde o início do conflito, de acordo com dados das Nações Unidas, e com cerca de 2.500 óbitos desde o início do conflito, segundo contas feitas pela Lusa.

Tópicos
pub