Ricardo Salgado responsabiliza Banco de Portugal pelo fim do BES

por RTP
Rafael Marchante - Reuters

O ex-banqueiro garante que nunca foi hostilizado pelos lesados do BES e que compreende as razões de queixa que apresentam. Em entrevista ao Dinheiro Vivo, Ricardo Salgado acusa o Governador do Banco de Portugal de ser também o responsável pelos lesados e garante que sempre teve a intenção de pagar tudo aos clientes do BES e que só não o fez porque a resolução avançou.

Ricardo Salgado diz que é contra a venda do Novo Banco ao fundo norte-americano Lone Star e considera que a Instituição devia ficar em mãos portuguesas.

“A venda forçada do Novo Banco foi e é um erro. Basta ver onde chegarmos: vai ser entregue gratuitamente a um conglomerado misto estrangeiro, com uma reputação que devemos questionar. O Lone Star é conhecido por ser um fundo oportunista que só irá adquirir o banco se tiver garantido, à partida, que quando vender, parte ou a totalidade, terá rendibilidade elevada. Será esta a solução que o país precisa para gerir o que resta do BES, maior banco de PME em Portugal? Porque não se olha para o que se passa na Europa (Espanha, Itália) e se arrepia caminho?”, questiona Ricardo Salgado, na entrevista ao Dinheiro Vivo.

O antigo presidente e acionista do BES continua a defender que a resolução do banco que liderou durante décadas era evitável e volta a atirar as culpas para o Banco de Portugal e para o Governo liderado por Passos Coelho.

“A resolução era perfeitamente evitável. Sei que hoje, passados três anos, já não sou o único a pensar assim. O argumento principal para ter sido desencadeada a resolução, de não haver capital disponível em 48 horas antes do final de julho de 2014, é falso. Este foi o argumento dado pelo Banco de Portugal. Pôs uma espada em cima da cabeça do Vítor Bento [ex-presidente do Novo Banco], ou seja, que tinha de encontrar em 48h uma solução de recapitalização”, referiu Salgado.

E acrescenta: “O governador não diz nada a respeito de ter recusado duas recapitalizações anteriores. O BdP rejeitou pelo menos duas hipóteses, uma a 11 de julho e outra a 16 de julho. Eu saí do banco no dia 13. O governador nem sequer recebeu esses investidores e eles pegaram nas malas e voltaram imediatamente para Londres. Um deles o Third Point LLC, liderado por Daniel Loeb, foi ao Banco de Portugal dizer que estava interessado em recapitalizar o banco e não lhe responderam”.
“Se o objetivo era destruir-me, não era preciso tanto”
Para o ex-presidente do BES, a causa do fim foi a resolução do Banco de Portugal, associada à “decisão inusitada de se acabar com o nome Espírito Santo que apagou das fachadas dos prédios uma marca com mais de 140 anos. É absolutamente inexplicável! Foi também o BdP que, para justificar uma resolução injustificável, que imediatamente declarou culpados os gestores do banco e iniciou um processo de intoxicação da opinião pública. É preciso lembrar que já nem estava no BES no momento da resolução. Se o objetivo era destruir-me, não era preciso tanto”.

Ricardo Salgado não poupa críticas à atuação do governo de Passos Coelho no processo que conduziu ao fim do banco e diz que “qualquer outro governo com o mínimo de responsabilidade e sem intuitos populistas teria evitado a resolução de um banco com a dimensão do BES. Não houve até hoje na Europa nenhuma resolução de um banco que tivesse 20% de quota de mercado, que representasse 27% das operações com as PME, tinha 30% no financiamento do comércio internaciona e 2 milhões de clientes”.

Já quando questionado diretamente sobre qual seria a atuação de um Governo do PS, o ex-banqueiro refere: “Qualquer outro governo. Eu não sou político, embora me quisessem colar a uma certa política do último governo do PS. O governo de Sócrates? Não vou poder entrar muito por aí, como sabe. O caso Operação Marquês está a aguardar informações. Isso ficará demonstrado com o tempo. Nunca me envolvi em políticas nenhumas neste país, apesar de muitos comentadores quererem referir isso”.
"Vou lutar até ao fim, até à exaustão"
Nesta entrevista desde o colapso do BES, o ex-banqueiro admite que entre os erros que cometeu está o de "julgamento". Ricardo Salgado acusa Álvaro Sobrinho e Hélder Bataglia de terem feito uma "gestão ruinosa" e de terem contribuído para a "destruição do Banco em Angola".

Enquanto prepara a defesa, Ricardo Salgado está a preparar um livro com as suas memórias, que ainda não têm título mas que gostaria de ver publicadas antes do final de 2017.

Arguido em centenas de processos, Ricardo Salgado deixa um aviso aos que querem fazer dele o responsável por tudo o que aconteceu no BES: “Eu vou lutar até ao fim, até à exaustão. Eles estão a perceber isso”.
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