Futuro do Reino Unido indefinido em véspera de eleições

por Christopher Marques, RTP
Cathal McNaughton, Reuters

O Reino Unido vai esta quinta-feira a votos, naquelas que são as eleições mais renhidas e indefinidas dos últimos anos. O Partido Conservador e o Partido Trabalhista disputam o primeiro lugar, mas muito longe dos resultados eleitorais do passado. As sondagens colocam o Partido Nacionalista Escocês (SNP) como terceira força na Câmara dos Comuns, mas com um número de lugares insuficiente para permitir uma coligação maioritária com um dos partidos tradicionais. Os britânicos votam esta quinta-feira, mas o futuro do Reino só deverá ficar decidido nos próximos dias, após muito jogo de bastidores.

Um reino indefinido, uma eleição onde tudo parece possível. As sondagens não antecipam, sequer, qual será o partido mais votado no Reino Unido. Conservadores e trabalhistas estão taco-a-taco nas preferências de voto.

As sondagens consagram o que se antevia há já largos meses: não haverá maioria de uma formação política no próximo Parlamento britânico. O futuro do Reino Unido poderá mesmo passar por um Governo de coligação. Uma situação longe de ser inédita – David Cameron já governa em coligação com os democratas liberais, - mas que este ano poderá assumir novos contornos.

Em primeiro lugar, é muito difícil prever qual será o partido mais votado. Conservadores e trabalhistas encontram-se muito próximos nas sondagens. Uma proximidade inferior à margem de erro, com os dois partidos tradicionais a irem alternando a pole position.



As previsões colocam em terceiro lugar o Partido da Independência do Reino Unido, o UKIP. Cresce de forma substancial face às eleições de 2010. Na mais recente projeção do Yougov, o partido de extrema-direita de Nigel Farage obtém 12 por cento das intenções de voto e há projeções onde supera mesmo os 15 por cento. Em 2010, o UKIP tinha obtido apenas 3,1 por cento dos sufrágios.

No entanto, o elevado número de votos deverá valer de pouco ao UKIP. O sistema eleitoral inglês passa pela eleição de apenas um deputado por cada círculo eleitoral, o que tende a favorecer os grandes partidos. Os partidos de David Cameron e Ed Milliband continuam a disputar a maior presença no Parlamento, estando muito próximos um do outro – cada um deverá conquistar cerca de 40 por cento dos assentos em Westminster.

O sistema favorece também os partidos com grande implantação em regiões específicas. É precisamente o que acontece na Escócia e o que deverá ser decisivo no futuro britânico.



O Partido Nacionalista Escocês (SNP - Scottish National Party) deverá ocupar o terceiro lugar. Embora tenha uma percentagem mínima dos votos do panorama nacional, deverá conquistar a maioria dos círculos eleitorais escoceses. Apesar da importante percentagem de votos conquistada, o UKIP deverá eleger apenas três deputados no Parlamento britânico.

O partido beneficia da elevada projeção que, apesar da derrota, conquistou no referendo à independência da Escócia, e poderá mesmo ser um potencial parceiro de coligação.

Os Democratas Liberais, atuais parceiros de coligação dos conservadores, deverá passar a ser a quarta força política no Parlamento britânico com 24 lugares, aponta a projeção. Um número de lugares insuficiente para renovar a atual coligação ou uma parceria alternativa com o Partido Trabalhista.
Que coligação?

Conquistar uma maioria na Câmara dos Comuns é improvável, formar uma coligação neste tabuleiro afigura-se difícil. Não é ainda claro qual será o partido com mais deputados eleitos e poderá mesmo não ser o partido mais votado a formar Governo. Após as eleições, terão início as negociações e jogos de bastidores.

Caso não haja nenhum vencedor destacado, será o próprio David Cameron, como primeiro-ministro ainda em funções, a ter a primeira oportunidade para formar um novo executivo. Um aspeto oficial que, evidentemente, não impede o seu principal adversário de iniciar conversações com os restantes partidos.Que partidos poderão aceitar trabalhar em conjunto e a que preço? Como se constituirá a maioria de pelo menos 326 lugares na Câmara dos Comuns? Enquanto não chegam as respostas, todos podem tentar construir a sua própria coligação num simulador disponibilizado pela BBC.

Nas últimas eleições, em 2010, David Cameron não conquistou a maioria, tendo sido cinco dias suficientes para que este formasse uma coligação com os democratas liberais. Em 2015, o cenário parece ser bem mais difícil, face à grande dispersão de votos – uma coligação de dois partidos dificilmente será suficiente.
 
A esta realidade, há de juntar as exigências que cada partido fará. O Partido Nacionalista Escocês (SNP) – partido independentista, o que já por si poderá representar um problema, deverá exigir o fim dos cortes no setor público e insistir no desmantelamento do poder nuclear britânico.

Os Liberais democratas querem mais financiamento para a saúde e para a educação. O UKIP quer um referendo à permanência na União Europeia do reino ainda em 2015.

Permanece ainda a possibilidade de serem elaborados acordos para que o novo Governo seja aprovado pelo Parlamento, sem ser fruto de uma coligação formal. Uma solução com menor estabilidade mas que que não deixa de ser uma possibilidade face a um Parlamento, previsivelmente, fragmentado.

“Quinta-feira pode não ser o fim do processo. Poderá ser apenas a chamada para intervalo”, defende James Landale, responsável editorial na BBC.
O fim do bipartidarismo
O ato eleitoral deverá consagrar o fim do bipartidarismo que já se antevia nas últimas idas às urnas. Apesar de manterem a maioria dos lugares no Parlamento, trabalhistas e conservadores terão de esforçar-se para conquistar mais de 70 por cento dos assentos.

Há 50 anos, os dois partidos partilhavam 90 por cento dos lugares disponíveis. A mudança vai ao encontro do que tem acontecido na Europa.

Em Portugal, as sondagens veem como difícil que um partido consiga a maioria absoluta nas próximas legislativas. Em Espanha, numa situação inédita, quatro partidos lutam pelo poder. Em França, a extrema-direita surge como potencial primeira força política.

A Alemanha é já governada por uma coligação entre os conservadores de Angela Merkel, os socialistas de Sigmar Gabriel e os cristãos democratas da CSU.

A Europa dos bipartidarismos torna-se, cada vez mais, na Europa das coligações. No Reino Unido, até a formação da coligação se avizinha difícil.
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