União Europeia e imigração preocupam britânicos em véspera de eleições

por Christopher Marques, RTP
François Lenoir, Reuters

Os britânicos vão esta a quinta-feira às urnas, para um ato eleitoral cujo resultado é imprevisível e que poderá trazer grandes mudanças para eles, britânicos, e também para nós, europeus. A imigração e a presença britânica nas instituições comunitárias estão em debate e o resultado eleitoral promete influenciar as relações de Londres com Bruxelas. A Europa assiste de fora, mas com a impressão que uma parte do seu futuro também vai a votos esta quinta-feira.

Os britânicos votam, a Europa assiste com atenção. A presença do Reino Unido na União Europeia está longe de ser tema consensual e a história das relações entre os dois está repleta de altos e baixos. Em dezembro, apenas 30 por cento dos inquiridos pelo Eurobarómetro revelaram ter uma imagem positiva da União Europeia – a terceira percentagem mais baixa, apenas superior à registada na Grécia e no Chipre.

O país é conhecido como um dos mais eurocéticos e a questão volta a estar na calha neste ato eleitoral.

David Cameron já prometeu referendar, caso se mantenha em Downing Street, a permanência do reino na comunidade europeia - um referendo que se realizará até finais de 2017 e que poderá ser um novo quebra-cabeças para Bruxelas, a comparar com anteriores experiências referendárias relacionadas com a comunidade.
Reportagem de António Esteves Martins e Pedro Escoto, enviados especiais

A promessa de David Cameron foi feita sob pressão da ala mais à direita do Partido Conservador e como resposta ao crescimento do UKIP. O partido de extrema-direita, que defende a saída da União Europeia, venceu mesmo as últimas eleições para o Parlamento de Estrasburgo. O UKIP exige a realização de um referendo ainda este ano.

A questão europeia não dominou a campanha eleitoral, mais centrada nos assuntos económicos, na imigração e nos serviços sociais. Mas mostrou a sua presença, não fosse esperado que um partido eurocético seja o terceiro mais votado.

Uma eventual saída do bloco comunitário preocupa sobretudo os empresários, que veriam a sua atividade exportadora prejudicada. Atualmente, 40 por cento das exportações britânicas têm como destino a União Europeia.
Reportagem de Sandra Machado Soares, Paulo Maio Gomes e Dores Queirós, enviados especiais

Novas restrições à presença de cidadãos europeus no Reino Unido estarão na agenda de um eventual Governo conservador. Estes são mecanismos que poderão alterar o acesso a benefícios e de certa forma condicionar a liberdade de circulação de pessoas e capitais vigente na União Europeia.

Já o UKIP afirma preto no branco que quer recuperar o controlo das fronteiras - uma bandeira de que Jean-Claude Juncker promete não abdicar.
“Quero um acordo justo com a Grã-Bretanha, mas a Grã-Bretanha não está numa posição para impor a sua agenda exclusiva aos restantes estados membros da Europa. Sou um forte defensor da liberdade de movimento dos trabalhadores”, afirmou o Presidente da Comissão Europeia.

Muitos britânicos associam a União Europeia à contribuição que sai dos cofres britânicos para Bruxelas e a uma política agrária que contestam. O UKIP associa ainda a abertura de fronteiras e a presença na União Europeia ao aumento da imigração, um tema quente por terras de sua Majestade.
O fim da terra prometida?

Uma ilha atrativa: para milhares de pessoas, europeus e não europeus, o Reino Unido transformou-se na terra perfeita para iniciar uma nova vida.

Apesar dos problemas que o país enfrenta e da crise internacional não ter deixado Londres de fora, o Reino Unido cresceu 2,8 por cento em 2014. Um valor que contrasta com o crescimento de 0,9 por cento que se registou na zona euro.

O Reino Unido apresenta ainda uma taxa de desemprego de 5,6 por cento, muitíssimo inferior à taxa média de 11,3 por cento que se regista nos países da moeda única europeia. O Reino Unido apresenta-se como uma oportunidade, que foi a escolha de mais de 30 mil portugueses em 2013, de acordo com o Observatório da Emigração.
Reportagem de Sandra Machado Soares e Paulo Maio Gomes, enviados especiais

“Acho que foi longe demais, há demasiados imigrantes a vir. Podem vir e pagar impostos e trabalhar, mas não, eles vêm e só querem exigir benefícios”, defende uma moradora de Ongar, a cerca de 35 quilómetros de Londres.O partido de extrema-direita que venceu as últimas eleições europeias e que poderá conquistar, revela a última sondagem do Yougov, mais de 12 por cento dos votos.

Estas são opiniões que se repetem, especialmente nas pequenas localidades. Ideias que vão ao encontro das defendidas pelo UKIP que quer impor barreiras à imigração.

Apesar da grande percentagem de votos, a presença do partido nacionalista em Westminster será reduzida e não deverá ter influência governativa. O que não quer dizer que a política de imigração do Reino não mude.

Os conservadores querem legislar alterações nos sistemas de benefícios para reduzir a atratividade do reino para os imigrantes.

Fotografia: Paul Hacket, Reuters

Mesmo o Partido Trabalhista poderá ter influência na atratividade do Reino Unido para os migrantes, uma vez que promete reprimir as empresas que usem mão-de-obra estrangeira barata.

“Somos uma ilha muito pequena. A nossa infraestrutura está a ter dificuldades em aguentar. Não temos escolas suficientes, casas, hospitais, empregos. Está a criar problemas na nossa sociedade”, explica Pamela Humphrets, também ela moradora de Ongar.

“Não é por causa da cor da pele de uma pessoa”, garante.

Sistema Nacional de Saúde
É nos momentos de maiores dificuldades que os discursos anti-imigração mais crescem. No caso britânico, este também está ligado à atual situação do Sistema Nacional de Saúde. Este símbolo do país também passa por dificuldades: atravessa a mais grave crise financeira desde 1948, data da sua criação.
Reportagem de Sandra Machado Soares, Paulo Maio Gomes e Dores Queirós, enviados especiais

Nas instituições de saúde, faltam médicos, enfermeiros e, sobretudo, financiamento. Muitos britânicos queixam-se da dificuldade em conseguir marcar uma consulta. Espera-se para marcar consultas, mas também para aceder às urgências hospitalares.

“Acho que em 2014, 70 por cento dos serviços de urgência no Reino Unido falharam no tempo de espera de quatro horas”, explicou um responsável sindical aos enviados especiais da RTP.

Os partidos prometem aumentar o orçamento da saúde, embora não expliquem de onde virá o dinheiro para alimentar aquele que, apesar dos problemas, permanece com um dos melhores sistemas de saúde do mundo.

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