Berlim redobra pressão após mergulho grego na austeridade

por Paulo Alexandre Amaral, Carlos Santos Neves - RTP
O ministro grego das Finanças, Euclid Tsakalotos, e o primeiro-ministro Alexis Tsipras durante o debate parlamentar de quarta-feira Alkis Konstantinidis - Reuters

Uma greve geral, o sim do Parlamento a novo pacote de austeridade e a Praça Sintagma a arder noite dentro, enquanto os deputados do Syriza rasgavam as vestes contra o próprio líder, que foi a Bruxelas buscar um acordo de espinhos. Alexis Tsipras parece vergar-se ao cabo de quase meio ano de braço-de-ferro. Mas o que pode esperar agora a Grécia? Do ministro alemão das Finanças, mais do mesmo - a insistência num Grexit temporário. Do norte da Europa, em particular da Finlândia, um impulso ao garrote.

Com a praça em frente a arder, com o OXI do povo transformado em NAI pelos deputados, a Grécia prepara-se para tempos difíceis. Aprovado que está o pacote de austeridade acordado por Alexis Tsipras com os credores, os gregos deverão ser confrontados nas próximas semanas com cortes nas pensões, aumento de impostos e alterações à lei laboral.O pacote de austeridade foi aprovado por larga maioria: 229 votos a favor, 64 contra e e seis abstenções.

Há umas semanas cifravam-se as necessidades de financiamento de Atenas em dez mil milhões de euros - que "não são pequenas", sublinhou Wolfgang Schäuble, a figura de proa das Finanças europeias - e agora fala-se de mais de 80 mil milhões de euros.

Tratava-se portanto de uma aprovação determinante para o terceiro resgate financeiro estimado em mais de 80 mil milhões de euros. Em causa está ainda o apoio de emergência de sete mil milhões de euros e que deve ser decidido ainda esta semana pelos ministros das Finanças da Zona Euro.

Contra a luz verde a este pacote esteve parte da população: 12 mil preencheram na última noite a Praça sintagma, frente ao Parlamento. Foram destruídas caixas multibanco e meia centena de manifestantes acabaram detidos pela polícia antimotim.

Quarta-feira foi também dia de greve, a primeira no consulado de Tsipras, uma paralisação de 24 horas dos trabalhadores da Função Pública que afectou principalmente os sectores da Saúde e dos Transportes. Também houve farmacêuticos que fecharam as portas para se juntar ao protesto.

É pura ironia constatar que o plano europeu subscrito por Alexis Tsipras em Bruxelas passou no Parlamento graças às bancadas da oposição. Os deputados da Nova Democracia vão votar “sim” em consciência e não por disciplina partidária", declarou o deputado Kyriakos Mitsotakis. Tsipras contou desde logo com o apoio desses 76 parlamentares.

O Parlamento grego tem 300 lugares, 149 são Syriza. Mais de 30 votaram contra o próprio primeiro-ministro.
Schäuble exige mais
"O melhor caminho para a Grécia talvez seja uma saída temporária do euro", declarou já esta manhã o ministro alemão das Finanças. Mesmo com o “sim” do Parlamento grego a um novo resgate que se adivinha duríssimo, Wolfgang Schäuble volta a defender que está fora de questão um perdão da dívida grega e que sem isso Atenas não terá condições para se manter dentro do grupo dos 19.

O corte da dívida voltou a ser colocado em cima da mesa pelo Governo Syriza, que assumiu as rédeas do país após uma vitória nas eleições de 25 de Janeiro. Cinco meses de negociações conduzidas por um ministro das Finanças – Yanis Varoufakis – acusado de tentar impor em Bruxelas a Teoria dos Jogos de que é um discípulo confesso, os analistas apontaram a inevitável capitulação grega às mãos de uma Zona Euro mantida sob as rédeas da Alemanha.

O que conseguiram os gregos neste meio ano? Referem os especialistas que nada, apenas parar um ciclo económico cheio de promessas de recuperação e irritar Wolfgang Schäuble.

Mas talvez a dupla Alexis Tsipras-Yanis Varoufakis tenha deixado alguma coisa de herança: a ideia da urgência de um corte da dívida foi posta em cima da mesa e o Fundo Monetário Internacional pegou nela. Tornou-se, aliás, no seu maior defensor e já ameaça não entrar no clube de credores do terceiro resgate se não se fizer o haircut.
Schäuble concorda mas diz não
O ministro alemão das Finanças admite que a gravidade da situação coloque o problema nesses termos: a Grécia dificilmente “pode continuar sem um corte da dívida”. Trata-se no entanto de um intróito que apenas serve o propósito de voltar a um tema que, de acordo com fontes da eurozona, foi inaugurado por Wolfgang Schäuble quando, há semana e meia, se discutia o pacote de austeridade a cumprir pelos gregos para desbloquear novo empréstimo dos credores: uma saída temporária de cinco anos da Zona Euro.

Nem a saída definitiva nem a saída temporária constam das figuras de estilo dos tratados europeus, pelo que o assunto, apesar de apadrinhado pela mais alta figura política desta Europa, era discutido como um cenário imaterializável.

No entanto, o primeiro-ministro grego Alexis Tsipras terá alterado a lista de prioridades e, nas últimas semanas, mostrou-se especialmente cooperador, um colaborador fiel das instituições europeias no sentido único de manter o país na Zona euro. Ao ponto de ter confessado esta quarta-feira que assinou um acordo de resgate com o qual não concordava em absoluto, mostrando através da linguagem corporal aquando da conversa com os jornalistas que era um assunto que o incomodava.

A assinatura nos papéis de bruxelas poderá ter sido ao mesmo tempo a assinatura da sentença de morte deste executivo, já que esta madrugada, apesar do sim do Parlamento grego ao documento lavrado em Bruxelas, mais de três dezenas dos deputados do seu Syriza – que se sentam precisamente na bancada que apoio o Governo – votaram contra o seu trabalho. Entre eles, Varoufakis e a vice-mistra da Finanças, que ainda ontem apresentou a demissão.

Ou seja, Tsipras optou pelo que diz ser uma inevitabilidade e arriscou desfazer a sua própria equipa governamental.

E apesar de tudo, do sim do Parlamento ao novo pacote de austeridade – a pior de sempre, diz-se –, o que espera os gregos ao virar desta esquina? Wolfgang Schäuble, com as rédeas da Europa nas mãos, quer mais. Acusado por Yanis Varoufakis de querer usar Atenas como exemplo para os parceiros europeus – uma tese que parece ser sustentada por Timothy Geithner, o antigo secretário do Tesouro dos Estados Unidos.
Via verde finlandesa
Sempre próximo de Schäuble na arena do Eurogrupo, o ministro finlandês das Finanças recebeu entretanto do Parlamento do seu país a aprovação às negociações do terceiro resgate da Grécia.

O que acaba por constituir um apertar da malha austeritária em torno do Governo do Syriza e dos Gregos Independentes.

“Temos mandato da Grande Comissão do Parlamento para aprovar quer o financiamento temporário de sete mil milhões proposto pela Comissão Europeia, quer a decisão, sujeita a condições estritas, de aprovar no Eurogrupo o início das negociações para um plano de financiamento ao abrigo do Mecanismo Europeu de Solidariedade da União Europeia para a Grécia”, declarou em Helsínquia Alexander Stubb.

Na mesma linha de Berlim, porém, o governante finlandês deixou vincada a oposição a qualquer forma de perdão da dívida soberana grega.


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