Prevenção é a melhor ferramenta contra os fogos em Portugal

Segundo dados do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), um terço do território geográfico português é ocupado por floresta, numa área aproximada de três milhões e 200 mil hectares. Todos os anos, parte desta mancha verde é subtraída pelos fogos.

Dados do inventário florestal nacional indicam que Portugal implementou uma forte política de florestação durante o século XX, devido à crescente procura por parte da indústria, e que já em meados dos anos 90 estabilizou.


De acordo com a informação preliminar, que consta do 6.º Inventário Florestal Nacional (IFN6, de fevereiro de 2013), os espaços verdes em Portugal continental, de floresta, matos e silvestres, registaram um aumento de 67 por cento, face ao anterior apuramento (IFN5-baseado numa cobertura aerofotográfica digital nos anos 2004 a 2006 e  levantamentos de campo entre dezembro de 2005 e junho de 2006), representando cerca de seis milhões de hectares, em termos de uso do solo.

Ainda com base neste estudo, verifica-se uma diminuição da área ocupada por floresta (4,6 por cento) que se deve sobretudo à sua conversão para a classe de usos matos e pastagens.

No mesmo inventário há referência a uma redução do uso agrícola do solo, a qual se deve essencialmente à conversão do uso para “matos e pastagens”, resultantes do abandono da produção agrícola.

São estes alguns dos elementos associados à diversidade do país a nível geográfico, climático, sociocultural e infraestrutural, conjuntamente com fatores de despovoamento do interior e envelhecimento da população rural, às alterações relativas à prática de aproveitamento e exploração da floresta, agora praticamente abandonada, acrescidas das alterações climáticas e à acumulação de elevada carga de combustível, reúnem condições cada vez maiores e mais favoráveis ao desenvolvimento de incêndios florestais mais complexos e violentos.



A nível de ocupação da flora e ocupação dos espaços florestais nacionais, a nossa floresta continua centrada em três espécies:

  • Eucalipto (espécie principal na ocupação florestal do Continente): 26 por cento do território nacional, correspondendo a cerca de 812 mil hectares.
  • Sobreiro: 23 por cento do território nacional, correspondendo a cerca de 737 mil hectares.
  • Pinheiro Bravo: 23 por cento do território nacional, correspondendo a cerca de 714 mil hectares.
Nesta análise verifica-se que o eucalipto e o sobreiro ultrapassam em muito a ocupação verificada com o pinheiro-bravo, que até aqui era a espécie com maior representação.

Constata-se ainda neste relatório que entre 1995 e 2010 a principal alteração da ocupação florestal se verificou na diminuição da espécie pinheiro-bravo, menos 13 por cento, sendo que a maior parte desta área se transformou em matos e pastagens.

Em contraponto a área total de eucalipto aumentou os mesmos 13 por cento, dentro do mesmo período.

Para além destas destaca-se o aumento das áreas de pinheiro-manso e castanheiro (46 e 27 por cento em área total, respetivamente).

Floresta, espaço económico
Os recursos florestais em Portugal têm estado num ponto bastante positivo, com uma conservação regular ao longo das décadas, sendo estes um elemento muito contributivo para a riqueza do nosso país.

Atualmente o espaço florestal nacional contribui todos os anos com produtos que ascendem a valores de 1.400 milhões de euros de mais-valias para a economia interna.

Quem olha para os espaços verdes e floresta existente, economicamente, vê, para além da madeira, outros produtos: resina, biomassa, cogumelos, cortiça e papel, entre outros.

Mas a floresta é também um ser vivo que ajuda na manutenção dos solos, biodiversidade, captura de dióxido de carbono e fonte rica em oxigénio. Fatores mais do que válidos para a preservação deste meio, muitas vezes desprotegido pela ação imprudente ou criminosa do homem.

Estes fatores são, para o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), pontos fundamentais a defender e a preservar, como referiu ao site da RTP o engenheiro João Pinho, do ICNF.

"Os incêndios florestais são vistos com muita preocupação. Os incêndios florestais são uma das áreas principais de intervenção do ICNF e têm merecido uma atenção particular, não só por parte dos serviços públicos mas também por parte dos sucessivos governos. Em alguns casos, os incêndios contribuem para diminuição da área florestal mas em muitos casos é preciso ter em atenção que a nossa floresta, o tipo de povoamentos florestais, felizmente é razoavelmente resiliente, isto é, a seguir à passagem do fogo têm uma capacidade de recuperação assinalável, é o caso do pinhal bravo e do sobreiro".




Defesa da Floresta (D.L. 124/2006)
Só este ano, entre 1 de julho e 30 de setembro, as forças da Guarda Nacional Republicana efetuaram 619.480 fiscalizações, tendo elaborado mais de 1.100 contraordenações por infração ao Decreto-Lei 124/2006 do Sistema Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios e detido 70 pessoas.

E as formas de proteção do povoamento florestal estão programadas na mesma lei (D.L.124/2006) com infrações puníveis com coimas que podem ascender os cinco mil euros, em casos de pessoas singulares e montantes que podem chegar aos 60 mil euros, caso sejam coletivas.

Nos casos florestais definidos nos planos municipais de defesa da floresta contra os incêndios, a entidade responsável é obrigada:

  • Pela rede viária providencie a gestão do combustível numa faixa lateral de terrreno confinante numa largura não inferior a dez metros;
  • Pela rede ferroviária, a gestão do combustível numa faixa lateral de terreno confinante contada a partir dos carris externos numa largura não inferior a dez metros;
  • Pelas linhas de transporte e distribuição de energia elétrica, em alta e muita alta tensão a gestão do combustível correspondente à proteção vertical dos cabos condutores exteriores acrescidos de uma faixa de largura não inferior a dez metros para cada um dos lados;
  • Pelas linhas de transporte e distribuição de energia elétrica, em média tensão a gestão do combustível correspondente à proteção vertical dos cabos condutores exteriores acrescidos de uma faixa de largura não inferior a sete metros para cada um dos lados.

É obrigatório proceder à gestão de combustíveis numa faixa mínima de 50 metros à volta das edificações ou instalações (habitações, estaleiros, armazéns, oficinas, fábricas ou outros equipamentos) inseridas nos espaços rurais. Esta faixa é medida a partir da alvenaria exterior da edificação.

No caso dos aglomerados populacionais esta faixa de proteção estende-se até aos 100 metros.

Compete contudo aos proprietários, arrendatários, ou entidades que, a qualquer titulo, detenham terrenos inseridos na faixa referida no número anterior à gestão de combustível nesses terrenos.

No caso dos parques de campismo, nas infraestruturas e equipamentos florestais de recreio, nos parques e polígonos industriais, nas plataformas de logística e nos aterros sanitários inseridos ou confinantes com os espaços florestais é obrigatória a gestão de combustível, e sua, manutenção de uma faixa envolvente com uma largura mínima não inferior a 100 metros, competindo à entidade gestora, ou na sua inexistência ou não cumprimento da sua obrigação, à Câmara Municipal realizar os respetivos trabalhos , podendo esta, para o efeito, desencadear os mecanismos necessários ao ressarcimento da despesa efetuada.

Sempre que, por força do disposto dos elementos anteriores, as superfícies a subter os trabalhos e gestão de combustível se intersetem, são as entidades referidas que têm a responsabilidade da gestão de combustível.
 


Regras e coimas em vigor que muitas das vezes não são cumpridas pelos proprietários, levando as autoridades a efetuar cada vez mais contraordenações.

Para o ICNF a gestão de combustíveis, ou vulgarmente designada por limpeza dos matos, é fundamental para uma melhor salvaguarda da floresta.

João Pinho, vice-presidente do ICNF, nota que apesar de os anos de 2003 e 2005 terem sido devastadores para a floresta em Portugal, os erros então cometidos servem agora de base à construção de melhores métodos de combate aos incêndios florestais.

“Uma das questões é que depois dos anos de 2003, 2005, esse período difícil que passámos, aumentámos muito o conhecimento e a capacidade de fazer melhor, que foi precisamente aquilo a que chamamos a gestão estratégica de combustíveis. E esta estratégia é, com os recursos limitados que temos e que sempre teremos no futuro, como é que poderemos executar com o máximo de benefício posterior para a defesa daquela área florestal as ações de gestão de combustíveis, ou limpeza dos matos”, explica.

“A questão da limpeza não tem de ser feita a eito na paisagem, tem de ser feita nos sítios estratégicos de forma a aumentar aquilo que é a eficiência, como, por exemplo, tapando os caminhos preferenciais do fogo, ou serem feitas em locais que permitam aos bombeiros atacar os incêndios e isso não acontece em todo o lado”, refere o vice-presidente do ICNF.




Temos que ter a consciência de que a floresta que vamos deixar para as gerações futuras será a neste momento a garantir.

Olhar para a floresta portuguesa não é só olhar para um elemento que existe num determinado período do ano, como é o caso dos incêndios.

E a maioria das vezes os portugueses só se lembram de que existe floresta e de como ela poderia ter sido cuidada quando o fogo lhes bate à porta.




A floresta tem de ter uma atenção permanente, com um trabalho conjunto e uma forte aposta quer dos serviços públicos, Estado, produtores de associações florestais e bombeiros, quer de toda a população.

Atores que se podem tornar proativos, sendo estes, no seu conjunto e sinergias, elementos-chave para a manutenção e conservação de um bem  valioso: a floresta em Portugal.