Abusos sexuais, fome e ameaças. Agentes fronteiriços dos EUA acusados de maus-tratos a migrantes

por RTP
Os documentos revelam mais de 160 casos de má conduta e abuso por parte de agências governamentais. Jose Luis Gonzalez - Reuters

Abuso sexual de crianças, fome forçada, ameaças de violação e condições de detenção degradantes. Estes são alguns dos maus-tratos físicos e psicológicos contra migrantes de que os agentes norte-americanos de controlo fronteiriço estão a ser acusados, depois de a ONG Human Rights Watch ter finalmente conseguido aceder a documentos guardados a sete chaves pelo Departamento de Segurança Interna dos EUA.

Há cerca de seis anos que a Human Rights Watch, organização não-governamental de defesa dos Direitos Humanos, tentava que o Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos lhe fornecesse informações sobre as condições dos migrantes na fronteira do país.

Apesar das leis de liberdade de informação que, nos Estados Unidos, dão a qualquer pessoa o direito de exigir o acesso a informações de agências federais, só agora a ONG conseguiu pôr as mãos nos ficheiros.

Os documentos revelam mais de 160 casos de má conduta e abuso por parte de agências governamentais, nomeadamente da Proteção de Alfândega e Fronteiras (CBP, na sigla original) e da Guarda Fronteiriça dos EUA.

Os acontecimentos registados ocorreram entre 2016 e 2021 e alguns deles envolvem alegada atividade criminal por parte de agentes federais: abuso sexual de menores, ameaças de violação, fome e condições degradantes de detenção são alguns dos crimes citados pela Human Rights Watch.

“Os documentos pintam a imagem de um Departamento de Segurança Interna que parece ter normalizado abusos chocantes na fronteira dos Estados Unidos. Os EUA devem tomar ações urgentes e sustentadas para travar tais abusos”, defende a ONG internacional.
Migrantes alegadamente impedidos de apresentar reclamações
Um dos casos mais perturbantes diz respeito ao alegado abuso sexual de uma criança denunciado por um supervisor num abrigo de migrantes em São Francisco.

“Uma criança pequena foi abusada sexualmente por alguém que acreditamos ser um agente da CBP ou da Guarda Fronteiriça. A menina foi forçada a despir-se e foi tocada de forma inapropriada por um guarda que vestia verde”, lê-se num dos documentos.

Outro episódio terá ocorrido em 2018, quando um requerente de asilo do sexo masculino foi levado para um centro de detenção na Califórnia. De acordo com os documentos a que a Human Rights Watch teve acesso, um guarda disse ao homem que “se este lhe desse sexo, o libertaria”. Quando o migrante recusou, “o agente insultou-o em inglês e disse-lhe que iria prendê-lo para o castigar”.

Este tipo de abusos por parte das autoridades fronteiriças não é novidade. Há muito que os agentes que operam junto da fronteira entre os Estados Unidos e o México são acusados de maltratar migrantes. Também as condições das instalações onde os requerentes de asilo são mantidos têm sido criticadas, com muitos a queixarem-se das temperaturas geladas que têm de suportar.

Um migrante das Honduras descreveu ao Guardian as condições do asilo onde esteve em 2019. “Estive lá sentado durante dez dias, não podia mexer-me porque estávamos 67 pessoas numa cela. Dissemos que precisávamos de papel higiénico e água e queixámo-nos dos animais, dos escorpiões que por lá andavam. Havia escorpiões, formigas, carraças, pulgas e diziam-nos que estava tudo bem, que isso se devia ao nosso cheiro”, relatou.

Os documentos a que a Human Rights Watch conseguiu agora aceder referem 27 possíveis casos em que migrantes foram impedidos de escrever reclamações ou forçados a assinar papéis que não compreendiam.

Um homem vindo das Honduras garante que um agente da Guarda Fronteiriça lhe disse que se não desistisse do pedido de asilo, seria “enviado para a prisão e violado”.

As informações divulgadas pela organização de defesa dos Direitos Humanos chegam pouco tempo depois de mais um episódio de maus-tratos a migrantes: há cerca de um mês, agentes da Guarda Fronteiriça que se deslocavam a cavalo e transportavam chicotes foram filmados em comportamentos agressivos para com os migrantes que tentavam atravessar a fronteira.
Tópicos
pub