Afeganistão luta para impedir conquista taliban das grandes cidades

por Inês Moreira Santos - RTP
Jalil Rezayee - EPA

Desde sexta-feira que as forças islamitas tentam conquistar a cidade afegã de Lashkar Gah, capital de Helmand, e controlam já o sétimo bairro da cidade, pressionando a conquista de outras áreas vitais para a segurança. Nos últimos dias, os combates entre as forças governamentais do Afeganistão e os taliban intensificaram-se e há três províncias debaixo de fogo.

Depois das ofensivas do fim de semana, as forças afegãs continuam a tentar combater com os taliban em Lashkar Gah, no sul do Afeganistão, para impedir a conquista de uma primeira capital provincial pelos rebeldes que apertam o cerco em diversas cidades importantes. Na noite de segunda-feira, os islamitas atacaram pelo menos três capitais provinciais - Lashkar Gah, Kandahar e Herat - mas os confrontos prosseguiram nas ruas na capital da província de Helmand, onde os taliban lançaram ataques coordenados contra o centro da cidade e a sua prisão.

De acordo com a BBC, os taliban terão já invadido uma estação de televisão e milhares de pessoas começaram a fugir das áreas rurais.

"Há combates por toda parte", disse um médico do hospital de Lashkar Gah à emissora britânica, acrescentando que as vítimas e os civis mortos e feridos não param de aumentar.

"Houve tiroteios, ataques aéreos e explosões em áreas densamente povoadas. As casas estão a ser bombardeadas e muitas pessoas estão a ficar gravemente feridas", disse também Sarah Leahy, coordenadora dos Médicos Sem Fronteiras em Helmand, num comunicado. "É muito perigoso e a vida está suspensa".

Se as forças islamitas conquistarem Lashkar Gah, esta tornar-se-á na primeira capital provincial conquistada pelos taliban desde 2016. E isso, para Maj Gen Sami Sadaat, comandante militar afegão na cidade, teria um "efeito devastador na segurança global".

"Esta não é uma guerra do Afeganistão, é uma guerra entre a liberdade e o totalitarismo", disse o militar à BBC.

"Há combates, cortes de energia, doentes hospitalizados, redes de telecomunicações desligadas. Não há medicamentos e as farmácias e os centros de saúde estão fechados", lamentou à AFP Hawa Malalai, uma moradora local.

Entretanto, o chefe do conselho provincial de Helmand, Ataullah Afghan, acusou os taliban de "se refugiarem em casas de civis" e usá-los como escudos.

Já na segunda-feira, o Ministério da Informação do Afeganistão confirmou que, na província de Helmand, 11 estações de rádio e quatro de televisão foram obrigada a deixar de transmitir as suas emissões devido a "ataques e ameaças" taliban.

"Em breve testemunharemos a queda de Lashkar Gah se a situação continuar", disse aos media locais Shogufa Nawrozi, parlamentar de Helmand.

Os confrontos intensificaram-se nos últimos dias, após o Governo ter anunciado que ia enviar centenas de militares para combater nas ruas da cidades sob ameaça.

"A luta está a decorrer em Lashkar Gah. As forças de segurança não estão em boas condições lá", disse Mohammad Jami, um ativista da sociedade civil de Helmand, citado pelo canal de notícias afegão Tolo News.
Kandahar sob ameaça
Para além de Lashkar Gah, Kandahar e Herat – segunda e terceira cidades do país – estão desde há vários dias sob a ameaça direta dos taliban, que se confrontam com forças governamentais nos arredores. As tentativas de lançar assalto a Kandahar, a segunda maior cidade do Afeganistão, prosseguiram depois de o aeroporto da cidade ter sido atingido no domingo - a instalação é fundamental para garantir a logística e o apoio aéreo necessários para evitar que os insurgentes invadam a cidade.

Assumir o controlo de Kandahar daria aos islamitas poder sobre o sul do país.

Já em Herat, no oeste do Afeganistão, as forças do Governo estão a tentar combater os insurgentes há vários dias, tendo já conseguido libertar das forças islamitas algumas áreas, embora tenha sido atacado um edifício da ONU na cidade.

Nas redes sociais têm sido partilhados vários vídeos nos quais se vêem civis afegãos nas ruas de Herat a gritar "Allahu akbar" ("Deus é o maior") em apoio às conquistas das forças militares do país.

Na segunda-feira, o Presidente afegão, Ashraf Ghani, atribuiu a degradação da situação militar à "brusca" decisão dos Estados Unidos de retirarem as suas tropas e os efetivos da NATO do país. A conclusão da retirada das forças estrangeiras, presentes no país há 20 anos, está prevista para 31 de agosto e está praticamente concluída.

De facto, a conquista de uma grande cidade por parte dos taliban levaria sua ofensiva a outro nível e aumentaria as preocupações quanto à capacidade do exército afegão de defender o seu território dos islamitas.

"Se as cidades afegãs caírem (...) a decisão dos EUA de se retirarem do Afeganistão será lembrada como um dos erros estratégicos mais notáveis da política externa norte-americana", comentou o investigador Nishank Motwani, citado pela AFP.

Ghani afirmou, contudo, ter elaborado um plano de seis meses para contrariar a ofensiva taliban sem revelar detalhes. Um porta-voz dos insurrectos, Zabihullah Mujahid, qualifou de "absurdas" estas declarações.

Nos últimos três meses os taliban assumiram o controlo de vastas zonas rurais do Afeganistão durante uma ofensiva-relâmpago e que coincidiu com o início da retirada internacional. As forças afegãs opuseram uma fraca resistência e apenas controlam as capitais provinciais, que tentam defender a todo o custo.

Os combates também alastram por Helmand, bastião taliban e palco de alguns dos combates mais intensos dos 20 anos de intervenção internacional, e a província mais mortífera para a NATO.
Tópicos
pub