Agente russa apontada como potencial ligação dos republicanos ao Kremlin

por Paulo Alexandre Amaral - RTP
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A agente russa Maria Butina foi acusada nos Estados Unidos de envolvimento num plano para interferir na política americana e colocar o Partido Republicano numa rota de convergência com Moscovo. Butina seria uma das peças-chave da estratégia russa que contava com a participação de altos responsáveis do Kremlin para introduzir a agente na alta esfera da política americana. O estabelecimento de um canal privilegiado entre Donald Trump e Vladimir Putin seria um dos objectivos da agente de 29 anos.

Maria Butina foi acusada de estar ao serviço de Moscovo, tendo viajado como agente secreta para os Estados Unidos, onde se encontrou recentemente com outro elemento sobre quem recai a suspeita de ser também ele um membro dos serviços de informações da Rússia. Circunstâncias essas que a colocam no seio de uma conspiração que estará a ser trabalhada há anos pelo Kremlin para influenciar o rumo político norte-americano, de acordo com os procuradores responsáveis pela investigação.

Os procuradores apontam uma vida dupla à agente russa, que estudou numa universidade americana e manteve um relacionamento com um membro do Partido Republicano para compor o seu disfarce, ao mesmo tempo que continuava a manter contacto com um alto responsável da hierarquia russa.

“Da ré é considerado que mantém contactos com outros agentes russos”, pode ler-se na acusação que a classifica como uma agente estrangeira não registada, envolvida numa conspiração. Ainda de acordo com os investigadores, teria tentado “um lugar numa organização de interesse” oferecendo sexo a outro americano.

O processo contra Maria Butina, que foi detida no último domingo em Washington, pede prisão sem hipótese de fiança por ser considerado um caso de perigo de fuga do país. No dia anterior à sua detenção foram cumpridas outras 12 ordens de prisão contra cidadãos russos, o que eleva para 26 o número de membros dos serviços de informações de Moscovo recentemente detidos em solo americano.

Butina estará envolvida numa conspiração patrocinada pelo Kremlin que remonta às eleições americanas de 2016 para tentar estabelecer um canal de comunicação “clandestino” entre o presidente russo, Vladimir Putin, e o então candidato Donald Trump.

As vias contempladas passariam por organizações do Partido Republicano e pela NRA (Associação de Armas Norte-americana). Para esse disfarce terá contribuído a personagem que Maria Butina já mantinha viva nas redes sociais como defensora do direito ao uso das armas, em total consonância com a ideologia da direita americana - um papel que lhe abriria as portas nesses círculos activos durante a campanha das presidenciais que Donald Trump viria a vencer.

De acordo com os investigadores, tanto a campanha de Jef Bush como a de Marco Rubio, ambas republicanas, cedo terão evidenciado que não se alinhariam com os interesses russos, pelo que, assim que Trump ganhou força nas primárias do partido, os esforços russos concentraram os seus esforços nesse objectivo.

A investigação que levou agora à detenção de Maria Butina não partiu do gabinete do procurador-especial Robert Mueller, que está a trabalhar no alegado conluio entre russos e americanos para fazer Trump presidente. Do processo de Mueller consta um encontro na Trump Tower entre o filho mais velho do presidente e uma cidadã russa que teria em mãos dados comprometedores contra Hillary Clinton, a adversária democrata de Donald Trump na corrida para a Casa Branca.

Natalia Veselnitskaya, uma advogada com ligações ao Kremlin terá convencido Trump Jr. a aceder à reunião com a promessa de informação comprometedora para Hillary Clinton. O encontro foi marcado e decorreu a 9 de Junho de 2016. Na altura em que foi revelado, o encontro tornava-se no primeiro dado palpável de um contacto entre interesses russos e membros da campanha de Trump.

Questionado sobre estes factos, Donald Trump Jr. admitiu que a reunião foi agendada sob esse pretexto de ser passada informação prejudicial para a candidata democrata, garantindo contudo que a reunião acabou por revelar que Natalia Veselnitskaya nada tinha de concreto a fornecer sobre Hillary Clinton: “A mulher disse ter informações de que pessoas com ligações à Rússia estavam a financiar o Comité Nacional Democrático e a apoiar [Hillary] Clinton, [mas] as suas declarações eram vagas, ambíguas e não faziam sentido. Não nos foi fornecido ou sugerido qualquer detalhe ou informação de apoio. Rapidamente percebemos que não tinha nenhuma informação significativa”.

O canal de Butina terá sido outro, através de participações em reuniões da NRA e de acções de base dos republicanos. Viajou por todos os Estados Unidos desde 2015, muitas vezes com vistos emitidos depois de ser convidada para conferências patrocinadas pela associação de armas, eventos em que manifestava particular interesse em encontrar-se com potenciais candidatos presidenciais do lado republicano. Teve mesmo a oportunidade, em Las Vegas, de questionar Donald Trump sobre as suas ideias em relação à política externa e às sanções económicas contra a Rússia.

Enquanto frequentava as aulas na Universidade da América, teve a disponibilidade para tecer uma rede de relacionamentos dentro do grupo republicano de defesa da posse de armas e a grupos religiosos conservadores.

O agente apontado como próximo a Maria Butina é, de acordo com os investigadores, Alexander Torshin, o vice-governador do Banco Central da Rússia. Torshin, implicado em vários esquemas duvidosos com os serviços de segurança e o crime organizado, pertence ao grupo de cerca de vinte oligarcas e cidadãos russos alvo de sanções já este ano por alegada tentativa de interferência na política interna de vários países ocidentais.
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