Algemado, amordaçado e em hipotermia. Investigação culpa soldados israelitas por morte de idoso na Palestina

por Joana Raposo Santos - RTP
As'ad, de 80 anos, era um cidadão norte-americano e viveu várias décadas em Chicago. Mohamad Torokman - Reuters

A investigação à morte de um palestino-americano de 80 anos uma hora depois de ser detido por soldados das Forças de Defesa de Israel (FDI), há duas semanas, revelou agora que o idoso poderia estar a sofrer de hipotermia no momento em que foi algemado e amordaçado, acabando por sofrer um ataque cardíaco.

Omar Abdalmajeed As’ad, de 80 anos, era natural da vila de Jiljilya, a norte da Cisjordânia. A 12 de janeiro deste ano, acabou por morrer depois de soldados israelitas o terem detido e algemado num posto de controlo provisório em território palestiniano.

Apesar de se encontrar, naquele momento, na terra natal, As’ad era um cidadão norte-americano e viveu várias décadas em Chicago, pelo que os Estados Unidos se apressaram a exigir uma investigação às circunstâncias da sua morte.

Na passada semana, o porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, Ned Price, avançou que Washington iria exigir a Israel clarificações sobre o assunto e que as Forças de Defesa desse país “indicaram que têm em curso uma investigação”.

De acordo com as FDI, As’ad estava a conduzir um carro com “aspeto suspeito” quando foi mandado parar pelos soldados junto ao posto de controlo. Os militares quiseram garantir que o homem não trazia armas e acabaram por prendê-lo depois de, alegadamente, este ter começado a gritar e a atrair atenções.

Segundo a investigação preliminar norte-americana, As’ad foi submetido a um interrogatório num edifício em construção onde, depois, foi deixado sozinho, ao frio, durante uma hora. Teria as mãos atadas, uma venda nos olhos e uma mordaça. A morte de Omar As’ad fez capas de jornais nos EUA, de onde era cidadão, e originou exigências sobre a clarificação dos factos por parte do Departamento de Estado norte-americano.

Fontes próximas da investigação referiram ao Haaretz que a mordaça deverá ter dificultado a respiração do idoso e impedido que este pudesse pedir ajuda. A condição do homem foi agravada pelas temperaturas baixas, que deverão ter causado um estado de hipotermia.

Quando regressaram para junto do homem, os militares removeram-lhe as algemas mas não chamaram assistência médica nem se certificaram do seu estado de saúde. Tiveram de ser habitantes locais a chamar ajuda quando os soldados deixaram o local. O idoso foi então transportado para o hospital de Ramallah, onde foi declarado o óbito.

As conclusões desta investigação serão agora entregues ao advogado das forças militares, que irá por sua vez decidir se devem ser tomadas ações contra os soldados envolvidos no episódio.
Soldados queriam “travar terrorismo”
Os militares disseram aos investigadores ter detido não só As’ad mas também outros palestinianos, por receio de que estes voltassem à vila e revelassem aos habitantes que estava em curso uma inspeção surpresa naquela zona.

Já as autoridades palestinianas garantem que o corpo do idoso foi encontrado com restos da algema improvisada, em plástico, em redor de um dos pulsos, e acreditam que a causa do ataque cardíaco foi o stress causado pelo incidente.

O departamento israelita da Defesa, que está a defender os soldados sob investigação, veio já esclarecer que estes estavam a conduzir “uma operação de controlo para travar o terrorismo” e que “os palestinianos foram detidos legalmente devido aos seus comportamentos, que puseram em risco a atividade e os militares”.

Ainda de acordo com a defesa dos soldados, os palestinianos detidos “foram libertados no final da operação, com a saúde de todos intacta e sem necessitarem de intervenção médica”, pelo que as circunstâncias da morte de As’ad “não estão relacionadas com a conduta das forças militares”.
Ações dos militares com impacto negativo para Israel
Para especialistas no conflito israelo-palestiniano, o incidente veio expor um antigo problema: as ações de soldados da base da cadeia de comando das Forças de Defesa de Israel têm, muitas vezes, um impacto negativo para a região, uma vez que há quem retrate este tipo de episódios como incidentes diplomáticos e os utilize para exemplificar as injustiças de Israel para com palestinianos.

Por esta razão, esses especialistas instam Israel a ser transparente na investigação à morte de As’ad, fornecendo aos Estados Unidos todas as informações necessárias. E, caso os soldados envolvidos na morte do homem de 80 anos sejam efetivamente culpados, o executivo israelita deverá responsabilizá-los.

Ao Jerusalem Post, um especialista aconselhou ainda Israel a explicar as razões pelas quais são realizadas estas paragens de civis em postos de controlo em território palestiniano, nomeadamente as razões de segurança – com este controlo, Israel tenta, alegadamente, travar eventuais ataques terroristas.
Tópicos
pub