Amnistia Internacional lamenta falha de Portugal no apoio a refugiados

por RTP
Muhammad Hamed - Reuters

Ao território português chegaram em 2017 menos de metade dos refugiados que o país se tinha comprometido a receber ao abrigo do programa da União Europeia. A Amnistia Internacional, que publicou esta quinta-feira o seu relatório anual, lamenta que muitos tenham deixado o país, apontando responsabilidades aos serviços fronteiriços. Casos de discriminação de minorias, violência policial ou contra as mulheres são outros pontos do documento.

Portugal recolocou 1.518 requentes de asilo que se encontravam na Grécia e Itália, deixando mais de 1.400 lugares por preencher, de acordo com compromisso legal feito ao abrigo do Programa de Recolocação da União Europeia. Contudo, as autoridades relataram que, dos que foram recolocados, mais de 720 tinham deixado o país no final do ano.

No relatório anual que denuncia os problemas de Direitos Humanos de 159 países, Portugal é retratado como um país que discrimina as comunidades africanas e ciganas, falhando-lhes na garantia de habitação digna.

Em fevereiro de 2017, no relatório da sua visita a Lisboa e ao Porto, a relatora especial das Nações Unidas Leilani Fahra já alertava para o direito à habitação condigna, realçando que muitas comunidades ciganas e pessoas de ascendência africana “viviam abaixo dos padrões do Direito Internacional dos Direitos Humanos e enfrentavam discriminação no acesso a habitação condigna”.

De acordo com a Amnistia Internacional, a relatora exortou as autoridades, entre outras recomendações, a abordar a habitação condigna como uma prioridade e a garantir que dos desalojamentos e das demolições não resultassem sem-abrigo.

Em março do ano passado, o comissário de Direitos Humanos do Conselho da Europa visitou Lisboa e Torres Vedras. Também ele expressou preocupação relativamente às condições de habitabilidade das comunidades ciganas, “não só por não cumpriram os mínimos internacionais, mas também porque são frequentemente segregados”, revela o mesmo relatório.

Na altura pediu que fosse desenvolvido um novo programa de habitação social para todos os grupos vulneráveis.

A violência sobre os presos, as condições na prisão e prisão preventiva e a situação dos pacientes em unidades psiquiátricas portuguesas são também motivo de preocupação da Amnistia Internacional.
Violência contra as mulheres

Dos sete pontos abordados no relatório da Amnistia Internacional sobre Portugal, salienta-se a violência contra as mulheres, nomeadamente o caso do juiz Neto de Moura.

Em outubro de 2017, o Tribunal da Relação do Porto confirmou a pena suspensa de dois homens condenados em 2015 por agressão violenta de uma mulher. O ex-amante sequestrou-a e o ex-marido espancou-a com um bastão com pregos. Os juízes justificaram a sua decisão aludindo a crenças religiosas e estereótipos de género, afirmando que “o adultério da mulher foi um ataque muito sério à honra e dignidade do homem”.

O ponto positivo destacado pela Amnistia Internacional é que, em dezembro, o Conselho Superior da Magistratura abriu um procedimento disciplinar contra os dois juízes responsáveis pelo acórdão.

O documento destaca ainda como ponto negativo um episódio de violência policial. O caso aconteceu em fevereiro de 2015, mas só no ano passado foi deduzida a acusação. Dezassete elementos da PSP da Esquadra de Alfragide vão ser julgados por tortura, sequestro, injúria e ofensa à integridade física agravada contra seis jovens do Bairro Cova da Moura.

Um episódio que a Amnistia Internacional destaca para que Portugal não volte ao mapa de países com problemas de violência policial.

O Parlamento português merece os elogios da organização por ter proposto uma lei para proteger a comunidade lésbica, gay, bissexual e transgénero e pelas novas normas que reforçam as penas para crimes relacionados com discriminação.
Ódio entre os líderes mundiais
“Em abril, uma lei da iniciativa do Governo com vista a uma maior proteção dos direitos das pessoas LGBTI de acordo com os padrões internacionais foi levada ao Parlamento. No final do ano a lei estava a ser discutida. A lei propõe a retirada do requisito de uma avaliação psicológica e introduz o consentimento expresso para a realização de qualquer tratamento médico com o objetivo de determinar o género, para pessoas intersexuais, incluindo menores com mais de 16 anos”, revela ainda o relatório da Amnistia Internacional.

A Amnistia Internacional alerta para o crescimento dos discursos de ódio entre os líderes mundiais. No relatório sobre Direitos Humanos, a organização destaca a discriminação contra refugiados e emigrantes, nos Estados Unidos.

Os protestos em Luanda contra o ministro da Administração do Território angolano, em Fevereiro do ano passado, deixaram marcas em Luaty Beirão e outros ativistas.

No relatório anual sobre direitos humanos, a Amnistia Internacional denuncia este e vários outros episódios de violência policial contra manifestantes, detenções arbitrárias e restrições à liberdade de associação e de imprensa.

Problemas que se estendem a Moçambique, onde a intimidação de repórteres e membros da oposição persiste, refere o mesmo documento.
Brasil, caso preocupante
No núcleo de países de língua portuguesa, o Brasil surge como o caso mais preocupante. A violência nas ruas, sobretudo em favelas, intensificou-se, multiplicando-se as execuções, atos de tortura e detenções arbitrárias.

Parte dos 60 mil homicídios registados no ano passado ocorreu nas sobrelotadas prisões brasileiras, palco de motins de extrema violência.
Pelo menos 120 pessoas morreram e perto de 1.200 ficaram feridas nas manifestações venezuelanas. Há relatos de tortura, buscas ilegais, interferência do Executivo no poder judicial e perseguição de oposicionistas.
A população prisional também disparou na Venezuela, num ano marcado por mais de cinco mil detenções, no seguimento de protestos contra o regime de Nicolás Maduro.

Os Estados Unidos também lidaram pior com os Direitos Humanos, no primeiro ano do mandato de Donald Trump. O país, recorde-se, restringiu a entrada de emigrantes de alguns países muçulmanos e de refugiados, acabou com programas de acolhimento de jovens estrangeiros e insistiu na intenção de erguer o muro na fronteira com o México.

Na Síria, a Amnistia Internacional denuncia os vários ataques do regime de Bashar Al-Assad e das forças russas que mataram centenas de civis.

Massacres também em Myanmar no conflito entre o exército e o povo rohingya que foram assassinados, torturados e viram as suas casas destruídas. Mais de 650 mil tiveram que fugir para o Bangladesh.

Atropelos dos Direitos Humanos que se registaram em muitos outros dos 159 países analisados pela Amnistia Internacional, preocupada com o rumo que as lideranças internacionais querem dar às nações que governam.
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