Aprovação da revisão do Orçamento de Cabo Verde tira 4,1 MEuro ao endividamento interno

por Lusa

A revisão do Orçamento do Estado cabo-verdiano, aprovada hoje no parlamento, vai cortar 4,1 milhões de euros ao limite do endividamento interno, depois da recusa da oposição à flexibilização temporária das regras orçamentais devido à pandemia.

A proposta de lei do Orçamento Retificativo para 2021, apresentada pelo Governo devido à quebra de 12,2% nas receitas projetadas para este ano face à ausência de retoma do turismo devido à pandemia, foi aprovada esta noite, ao fim de várias horas de discussão, em votação final, com 38 votos a favor do MpD (maioria) e três da UCID (oposição), enquanto os 28 deputados do PAICV (oposição) votaram contra.

Após a votação, os deputados do PAICV criticaram a proposta, afirmando que o Orçamento original, aprovado em dezembro, era "irrealista" e "eleitoralista", face às eleições legislativas de abril -- que o MpD voltou a vencer com maioria absoluta -, com "projeções marteladas" e "traquinices contabilísticas".

Já o MpD acusou o PAICV de ter colocado os interesses do partido à frente dos do país, neste processo -- Orçamento Retificativo e alteração ao limite do endividamento interno -, quando o arquipélago vive a "maior crise económica e sanitária" da sua história, acrescentando que "na hora da verdade é que se fica a saber quem é que gosta de Cabo Verde e dos cabo-verdianos".

No Orçamento do Estado em vigor, recorrendo ao limite de 3% do Produto Interno Bruto (PIB) projetado, o Governo inscreveu a previsão de se endividar no mercado interno em mais de 5.869 milhões de escudos (52,6 milhões de euros).

Com a ausência de retoma económica no arquipélago, o PIB projetado pelo Governo para 2021 é revisto em baixa neste documento, o que, face também às necessidades de reforço dos apoios sociais, económicos e sanitários, levou o executivo a apresentar uma proposta de lei de "flexibilização temporária" das regras orçamentais da Lei de Bases do Orçamento, devido à pandemia de covid-19, prevendo elevar esse limite a 5% do PIB.

Contudo, esta alteração obrigava a uma maioria qualificada de dois terços dos deputados, tendo reunido, na votação realizada na quarta-feira, 41 votos a favor do MpD e da UICD -- e um contra - dos 46 que necessitava para fazer passar a medida, e perante a abstenção de 27 deputados do PAICV, que acabaram por travar a proposta governamental.

Na primeira proposta de revisão do Orçamento de 2021, orçada em 78 mil milhões de escudos (707 milhões de euros) que deu entrada, a contar com o aumento de 5% do limite do endividamento interno, o Governo contava poder endividar-se em até 8.800 milhões de escudos (cerca de 79 milhões de euros). Contudo, face a esse chumbo e devido à quebra no PIB projetado, mantendo o limite de 3%, viu a proposta de lei do Orçamento Retificativo permitir apenas um endividamento interno máximo de 5.401 milhões de escudos (48,5 milhões de euros).

Na prática, após dois dias de discussão no parlamento, trata-se de um limite de endividamento interno que fica 468 milhões de escudos (4,1 milhões de euros) abaixo da proposta em vigor.

Esta revisão aos limites do endividamento interno levou ainda à redução, na segunda proposta de revisão, em mais de 3.327 milhões de escudos (29,9 milhões de euros), no reforço de verbas da proposta de Orçamento Retificativo inicial para os setores da saúde, da família e inclusão social, do fomento empresarial e da economia do mar.

Assim, revendo a proposta de Orçamento Retificativo, esse reforço de verbas para estes setores -- após reajustes entre vários programas e áreas do Orçamento em vigor - baixou para 5.401 milhões de escudos (48,5 milhões de euros).

Em causa estava a intenção de aumentar, apenas este ano, de 3% para 5% do PIB o limite do endividamento interno e para compensar a quebra no PIB projetado e na arrecadação de receitas. Tudo porque no Orçamento do Estado em vigor o Governo cabo-verdiano estimava um PIB -- toda a riqueza produzida no país -- de 194.320 milhões de escudos (1.743 milhões de euros) até final do ano, prevendo um crescimento de 6,8% a 8,5% face a 2020, quando na revisão agora aprovada baixa para 175.616 milhões de escudos (1.576 milhões de euros), face a uma previsão de crescimento económico que baixa para 3,0% a 5,5%.

O Governo e o MpD dramatizaram no parlamento a necessidade deste aumento do endividamento interno, no quadro da proposta do Orçamento Retificativo, que esteve a ser discutido em simultâneo. Isto para manter os apoios às empresas, famílias e economia, face à queda na previsão de arrecadação de receitas do Estado tendo em conta o inicialmente estimado, pela ausência de retoma económica, e alegando que é um mecanismo mais rápido do que a negociação de empréstimos concessionais com entidades internacionais.

Do lado do PAICV, a posição assumida na votação foi explicada com a possibilidade de o Governo eliminar "gorduras e despesas" para financiar o Orçamento Retificativo para este ano, enquanto os deputados do Movimento para a Democracia (MpD), alegaram "vingança" do maior partido da oposição pela recondução do partido na liderança de Cabo Verde nas eleições legislativas de abril último, para ter "ganhos políticos baratos".

Durante o debate desta proposta, o vice-primeiro-ministro e ministro das Finanças, Olavo Correia, defendeu que a mesma permitiria ao Estado "continuar a intervir nas esferas económica, social e sanitária", no quadro da pandemia.

"O Governo precisa de meios financeiros para intervir já", afirmou Olavo Correia, alegando que ser incompreensível que os parceiros internacionais estejam a "colaborar" com a concessão de moratórias ao crédito do Estado e que "no plano interno" não se faça o trabalho de mitigar as consequências económicas da pandemia.

Cabo Verde vive uma profunda crise económica e social e registou em 2020 uma recessão económica histórica de 14,8% do PIB, quando antes da pandemia previa crescer mais de 6%.

Tópicos
pub