Bélgica começa a julgar suspeito dos ataques de Paris de 2015

por Paulo Alexandre Amaral - RTP
Salah Abdeslam não permitiu a captura de imagens durante o seu julgamento. A cara do arguido foi pixilizada por ordem do tribunal. Reuters

Salah Abdeslam foi capturado em Bruxelas quatro meses depois dos ataques que em novembro de 2015 fizeram 130 mortos e centenas de feridos num raide mortífero levado a cabo na capital francesa por vários grupos de terroristas. Começou a ser julgado esta segunda-feira, não pelos atentados de Paris, mas por tentativa de homicídio de membros das forças especiais. A procuradoria belga pede 20 anos de prisão.

A 15 de março de 2016, Salah Abdeslam, francês de origem marroquina (pais) nascido na Bélgica, foi encurralado por forças especiais belgas num apartamento da capital belga juntamente com Sofien Ayari, tunisino que combateu na Síria, e Mohamed Belkaid, argelino.A polícia foi recebida a tiro quando bateu à porta do apartamento da Rua du Dries à Forest, onde se escondiam Abdeslam e Ayari.

Três membros das forças de segurança ficaram ligeiramente feridos. Abdeslam foi atingido numa perna. Belkaid morreria no hospital.


Mohamed Belkaid, um combatente que já havia sido ferido duas vezes em Raqqa, o bastião do Estado Islâmico na Síria, abriu fogo assim que as forças especiais se aproximaram do apartamento. Belkaid, que se acredita ter coordenado por telefone os vários terroristas na noite de 13 de novembro de 2015, acabaria por morrer no hospital, mas permitiu a fuga dos companheiros, que seriam capturados três dias depois no Bairro de Molenbeek.

A representante da Procuradoria belga, Kathleen Grosjean, pediu 20 anos de prisão para ambos os acusados, o máximo na Bélgica para a tentativa de assassinato de um polícia, com a garantia acessória de que cumprirão um mínimo de dois terços da pena. Grosjean defendeu perante o tribunal que era clara a intenção de matar: "Foi uma autêntica cena de guerra aquela com que a polícia se deparou. É um milagre que ninguém tenha morrido".

No início do julgamento, que apenas incide sobre posse de arma proibida e ataque às forças de segurança que os capturaram, Sofien Ayari respondeu ao tribunal que apenas Belkaid é responsável pelos tiros contra os polícias envolvidos na primeira tentativa de captura.

Na sua intervenção, Grosjean sustentou que, ainda que seja verdade que tenha sido Belkaid a alvejar as equipas de segurança para cobrir a fuga de Ayari e Abdesalem, esse é um factor que não serve de atenuante para estes últimos. Pouco importa quem tinha as armas, declarou, “o ataque foi decidido e aceite por todos eles, que eram combatentes treinados”.

“Ao perceber que era a polícia que estava a bater à porta, porque é que não fugiram? O facto de permaneceram significa que seu objetivo era atacar, lutar contra o inimigo, matar os polícias se fossem descobertos”, declarou a representante da Procuradoria.
Abdeslam mantém silêncio
Diferente foi a reação de Abdeslam, que deverá manter-se em silêncio durante o resto do julgamento. Na sua declaração inicial, o único suspeito vivo dos ataques de Paris fez passar a insatisfação pela forma como está a ser tratado pelas autoridades francesas.

“Julguem-me. Façam de mim o que quiserem. Mantenho a confiança em Allah. Eu não tenho medo de vocês”, declarou Abdeslam, sublinhando que “o meu silêncio não faz de mim um criminoso, é a minha defesa (…) Já percebi que que os muçulmanos são julgados e tratados da pior forma”.

Pouco antes recusara-se a levantar-se e a identificar-se. Disse que ao longo dos dois anos que tem estado detido em Fleury-Mérogis, a maior prisão da Europa, uns quilómetros a sul de Paris, o tratamento a que é submetido é muito duro e que, por isso, estava demasiado cansado para se levantar.

Reuters

O julgamento deverá durar quatro dias, durante os quais Salah Abdeslam retornará todas as noites a França, não para Fleury-Mérogis, mas para uma prisão próxima da fronteira com a Bélgica. É uma operação que envolve duas centenas de agentes. Durante o período do julgamento, o trânsito está condicionado na área do tribunal e há helicópteros a sobrevoar a capital em busca de movimentações suspeitas.

Para já, Abdeslam apenas responde pelo episódio do recontro com as forças policiais. São crimes pelos quais, tal como Sofien Ayari, chegou a falar-se de 40 anos de prisão. “Para estes actos, pode receber uma sentença de até 40 anos de prisão”, afirmou em declarações registadas pela Reuters Luc Hennart, presidente do tribunal de Bruxelas de primeira instância, antes do início do julgamento.

Em relação aos crimes relativos aos atentados de Paris, durante os quais morreu o seu irmão Brahim Abdeslam ao fazer-se explodir frente a um café, não deverá ser julgado em França antes de 2020. Apesar de sempre ter recusado responder nos interrogatórios, os investigadores franceses acreditam que, tal como o seu irmão mais velho, Abdeslam teve um papel determinante nos ataques de Paris.
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