Bento XVI. Questionada coautoria de livro que defende celibato sacerdotal

por RTP
A polémica no Vaticano surgiu no domingo, quando foi anunciado um novo livro assinado por Bento XVI e Sarah no qual o celibato é defendido Alessandro Bianchi - Reuters

De acordo com fontes próximas de Bento XVI, o livro assinado pelo cardeal Robert Sarah e pelo Papa emérito – onde é defendida a importância do celibato sacerdotal na Igreja - é uma manipulação editorial, da qual Joseph Ratzinger não participou. As fontes afirmam que Bento XVI “não viu, nem aprovou o livro”. O cardeal desmente.

Esta segunda-feira, fontes próximas do Papa emérito afirmaram que Bento XVI não foi coautor do livro Das Profundezas dos Nossos Corações, juntamente com o cardeal Robert Sarah.

O livro defende que, a tradição secular dentro da igreja, é essencial para que os padres se concentrem nos seus deveres, considerando “indispensável para que o nosso caminho na direção de Deus permaneça o fundamento da nossa vida”.

De acordo com o jornal italiano Corriere Della Sera, as fontes ligadas a Joseph Ratzinger afirmaram que “é evidente que existe uma operação editorial e mediáticas da qual o Papa emérito se distancia e está totalmente alheio. Ele não viu, nem aprovou o livro ou a capa, nem o assinou”.

O cardeal Robert Sarah terá tido um encontro com Bento XVI, numa altura em que Ratzinger se encontrava a escrever um texto onde falava sobre o sacerdócio. Sarah – responsável pelas questões litúrgicas da Igreja Católica – terá pedido para ler o texto, uma vez que estava a preparar um livro sobre o mesmo tema.

Robert Sarah, conhecido como fazendo parte da ala conservadora do Vaticano, terá posteriormente produzido todo o livro.

Esta segunda-feira, em entrevista ao jornal francês Le Figaro, Sarah falou da “crise impressionante” que a Igreja Católica está a passar e salientou que o livro pode ser considerado como um “grito de amor para a Igreja, o Papa, os padres e todos os cristãos”.

Na noite de segunda-feira, o Prefeito da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos reagiu às acusações na sua conta do Twitter, publicando fotografias de três cartas que Bento XVI lhe enviou.


As cartas confirmam que o Papa emérito enviou um texto sobre o sacerdócio e que o autorizou a publicar "da maneira que pretendia", mas não especificam em nenhum momento se é um livro, com uma introdução e uma conclusão assinada por ambos.

Matteo Bruni, diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, respondeu aos jornalistas divulgando que “a posição do Santo Padre sobre o celibato é conhecida. Vem-me à mente aquela frase de São Paulo VI: Prefiro dar a vida antes que mudar a lei do celibato. Pessoalmente penso que o celibato é uma dádiva para a Igreja. Não estou de acordo com permitir o celibato opcional. Haveria qualquer possibilidade apenas nos lugares mais remotos; penso nas ilhas do Pacífico. Haveria necessidade pastoral, e o pastor deve pensar nos fiéis”, cita o Vatican News.

Esta terça-feira, na mesma rede social, Sarah publicou um comunicado onde pediu ao Papa Bento XVI, a 5 de setembro que escrevesse um texto sobre o sacerdócio católico, “com especial atenção para o celibato”.

Sarah garante que, na altura, disse a Bento XVI que entedia que ele pensasse que “as suas reflexões possam não ser oportunas devido às polémicas que elas possam causar”.

De acordo com o comunicado, a 20 de setembro, o Papa emérito respondeu ao convite de Sarah, “agradecendo e afirmando que antes de receber a minha carta, começou a escrever um texto teológico. No entanto, a minha carta encorajou-o a retomar esse trabalho. E ele garantiu que me enviaria o texto quando a tradução para o italiano fosse concluída”.

Robert Sarah afirma que durante o Sínodo dos Bispos, na Amazónia, Bento XVI lhe deu “em sigilo um texto, fruto do seu trabalho nos últimos meses”.

“Após várias trocas de ideias para a preparação do livro, a 19 de novembro, enviei um manuscrito completo”, disse o Prefeito da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos.

No mesmo comunicado o cardeal garante que agradeceu pessoalmente ao Papa emérito “por me ter dado tanta confiança” e avisou-o de que o livro seria publicado a 15 de janeiro.

Termina o comunicado afirmando: “Perdoo todos aqueles que me difamam. O meu afeto por Bento XVI permanece intacto e a minha obediência final ao Papa Francisco é absoluta”.
A polémica relacionada com o celibato sacerdotal
A polémica no Vaticano surgiu no domingo, quando foi anunciado um novo livro assinado por Bento XVI e Sarah no qual o celibato é defendido, perante a decisão que terá de tomar o Papa argentino sobre a proposta de ordenar homens casados feita no Sínodo na Amazónia.

Segundo o livro, Bento XVI considera que “não é possível realizar duas vocações (sacerdócio e o casamento) ao mesmo tempo”.

O volume, publicado em francês, tem como título Das profundezas dos nossos corações, chegará às livrarias esta semana, enquanto o Papa encerra a sua exortação apostólica após o Sínodo da Amazónia, que para muitos é um movimento para pressionar Francisco.

Os media oficiais do Vaticano garantiram que no livro "os autores expõem as suas intervenções no debate sobre o celibato e a possibilidade de ordenar homens casados" e que Ratzinger e Sarah se definem como dois bispos que mantêm "obediência ao Papa Francisco", de acordo com um artigo do diretor editorial Andrea Tornielli.
Ordenamento de padres casados

Em outubro do ano passado, vários bispos católicos reuniram-se para discutir o futuro da Igreja na Amazónia.
Na conclusão da reunião, foi lançado um documento onde estavam detalhados os vários problemas que afetavam a Igreja.

Os bispos sul-americanos sugeriram que em algumas partes da Amazónia, alguns homens mais velhos e casados poderiam ser ordenados a padres, defendendo que isso seria um esforço para combater a escassez de sacerdotes na região.

Foi também pedido ao Vaticano para que reabrisse um debate sobre a ordenação de mulheres como diáconos, afirmando que “é urgente que a Igreja promova e confira na Amazónia ministérios para homens e mulheres de maneira equitativa”, cita a agência Associated Press.

As propostas, colocadas num documento aprovado no final de um sínodo de três semanas sobre a Amazónia, convocado pelo Papa Francisco em 2017, com o objetivo de alertar para as ameaças à floresta tropical e melhorar o sacerdócio junto dos povos indígenas.

O Papa Francisco tem sido advertido pela ala mais conservadora da Igreja Católica de que qualquer abertura papal a sacerdotes casados ou mulheres diáconos pode levar a Igreja à ruina, culpando a organização do sínodo e o próprio Papa de heresia, uma vez que consideram o celibato sacerdotal obrigatório.
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