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"Caça às bruxas". Amnistia Internacional suspende atividades na Índia

por RTP
Carlos Jasso - Reuters

A Amnistia Internacional (AI) anunciou esta terça-feira a suspensão das suas atividades na Índia e o despedimento de todos os funcionários depois de o Governo indiano ter congelado as suas contas bancárias. A organização não-governamental denuncia aquilo que considera ser uma “incessante caça às bruxas contra organizações de Direitos Humanos”.

As contas bancárias da Amnistia Internacional da Índia foram congeladas este mês, sem qualquer aviso prévio, pela direção de fiscalização, depois de a organização ter publicado dois relatórios altamente críticos ao histórico de Direitos Humanos do Governo indiano.

"O congelamento total das contas bancárias da Amnistia Internacional Índia pelo Governo indiano, algo que foi conhecido em 10 de setembro, interrompeu completamente todo o trabalho que a organização estava a fazer" no país, declarou a AI num comunicado, acrescentando que foi “obrigada a despedir o seu pessoal na Índia e a suspender todo o seu trabalho de investigação e campanhas em curso".Desde 2018 foram realizadas várias buscas aos escritórios e residências de executivos por suspeitas de lavagem de dinheiro, um processo descrito pela Amnistia como uma “incessante caça às bruxas por acusações infundadas contra organizações de Direitos Humanos” pelo Governo de Narendra Modi.

A organização considera que este foi o culminar de uma campanha de perseguição que dura há dois anos por parte do Ministério da Administração Interna.

A Amnistia negou todas as alegações de má conduta financeira e afirmou estar em total conformidade com todas as leis indianas e internacionais aplicáveis. Nenhuma acusação foi apresentada contra a organização.
"Graves violações dos Direitos Humanos"
O afastamento da Amnistia ilustra claramente a tolerância cada vez menor para a oposição na Índia, uma repressão que aumentou durante a pandemia da covid-19. No comunicado, o diretor-executivo da Amnistia Internacional India, Avinash Kumar, insistiu que "a pressão contínua nos últimos dois anos" e o congelamento das suas contas por supostas irregularidades na captação de recursos "não é algo acidental".

Recentemente, a Amnistia Internacional publicou dois relatórios críticos às autoridades indianas: um onde são expostas violações aos Direitos Humanos e o envolvimento da polícia em motins em Nova Deli e outro que condena as restrições à liberdade na Caxemira, um ano depois de o Governo ter anulado a autonomia política da região.

Para Kumar, "o constante assédio por agências governamentais" ocorre devido à recente pressão da AI e de outras organizações para que a polícia e o Governo indiano respondam às "graves violações dos Direitos Humanos" na Caxemira indiana e nos recentes confrontos em Nova Deli.

Os confrontos de fevereiro na capital deixaram mais de 50 mortos e, embora as autoridades indianas culpassem os grupos de esquerda por incitarem a revolta, organizações como a AI acusaram pessoas próximas do partido nacionalista hindu (BJP, do primeiro-ministro indiano) de fazerem um discurso de ódio, destacando a falta de resposta da polícia. No centro da agitação está a polémica Lei da Cidadania, promulgada pelo Governo de Modi e aprovada pelo Parlamento indiano em dezembro, que acelera a cidadania para imigrantes de países vizinhos, mas exclui imigrantes muçulmanos.

Além disso, a AI censurou as limitações das liberdades impostas pelo Governo na Caxemira indiana, como o corte da internet ou da telefonia móvel e a limitação dos movimentos, para evitar possíveis protestos contra a decisão unilateral do Executivo de retirar o estatuto especial que a região possuía.

Enquanto o Governo de Modi defende que a retirada desse estatuto especial significaria uma aceleração da modernização da Caxemira, os críticos veem na decisão uma forma de alterar a demografia da única região com maioria muçulmana na Índia.

O diretor-executivo da AI concluiu que o objetivo final de tratar os integrantes da ONG como "criminosos" serve para "alimentar o clima de medo e desmantelar as vozes críticas na Índia".

"Para um movimento que não faz mais nada que lutar contra a injustiça, este último ataque é semelhante a um congelamento da dissidência"
, enfatizou Kumar.
“Ato flagrante e vergonhoso”
A secretária-geral da Amnistia Internacional, Julie Verhaar, descreveu as represálias como “um ato flagrante e vergonhoso do Governo indiano” que faz parte “do esforço do Governo para silenciar vozes críticas e criar um clima de medo”.

“A equipa da Amnistia na Índia demonstrou grande dignidade face a uma campanha de difamação orquestrada e perversa de alegações falsas, invasões de várias agências de investigação, fugas maliciosas nos media e intimidação sem um pingo de evidências credíveis sobre irregularidades”, disse Verhaar.

“É um dia triste quando um país com a estatura da Índia, uma potência global em ascenção e membro do Conselho de Direitos Humanos da ONU, com uma constituição que se compromete com os direitos humanos e cujos movimentos nacionais de direitos humanos influenciaram o mundo, procura tão descaradamente silenciar aqueles que buscam responsabilidade e justiça”, defende a secretária-geral da AI, garantindo, porém, que este incidente “não marca o fim do nosso firme compromisso na luta pelos Direitos Humanos na Índia”.

c/ agências
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