Comissão Europeia quer retoma de viagens e turismo na UE mas com restrições

por RTP
Reuters

Os países mais afetados pela pandemia vão demorar a abrir fronteiras e a retomar a circulação normal, mas a Comissão Europeia pretende que haja "alguma forma de turismo" na Europa no verão, embora ainda limitado. No entanto, as viagens para fora da União Europeia estão desaconselhadas, pelo menos, até ao final do ano. Quanto aos reembolsos dos voos cancelados nas últimas semanas, a UE recusa alterar as regras dos direitos passageiros.

Numa altura em que a Comissão Europeia se prepara para divulgar orientações relativamente ao levantamento das restrições no setor turístico e dos transportes - que acabam por estar interligados devido às fortes restrições às viagens na UE por causa da covid-19 - a comissária europeia dos Transportes, Adina Valean, indicou que a retoma do turismo depende das "condições sanitárias" em cada país.

"Espero que aconteça alguma forma de turismo este verão em alguns destinos [europeus], onde as condições em termos sanitários forem mais favoráveis e onde as autoridades consigam implementar algumas estratégias para atrair a confiança dos viajantes, mas penso que será sempre muito limitado", disse em entrevista à agência Lusa, em Bruxelas.

"Não é possível retomar o turismo a nível europeu ao mesmo tempo", esclareceu Adina Valean, acrescentando que é provável que os países mais afetados pela pandemia, em número de contágios, retomem mais tarde este setor.

Apesar de reconhecer que isso causa problemas de concorrência no turismo e no mercado interno da UE, a comissária europeia frisou que é necessário "considerar, primeiro que tudo, a situação sanitária".

"Não é possível imaginar que as pessoas teriam confiança para viajar para um destino onde o número de casos é bastante elevado e onde não existem possibilidades de testar", exemplificou, indicando que "não se trata apenas das regras em vigor, mas também da confiança das pessoas para voltar a viajar para turismo" na Europa.

Contudo, a responsável romena notou que "alguns países esperam poder abrir-se [ao turismo] ainda a tempo desta temporada de verão, com a adoção de algumas medidas de segurança".

Ainda não se sabe quando é que os países levantarão as restrições às viagens, estando as fronteiras externas e internas da UE praticamente fechadas, o que acaba por criar uma certa incerteza sobre a retoma do turismo, que deverá centrar-se, numa primeira fase, no doméstico.

"Seria também ótimo que todos decidissem recomeçar [as viagens] na mesma altura, mas isso é impossível por causa da situação sanitária, que é diferente de Estado-membro para Estado-membro".

Mesmo com datas diferentes, Adina Valean realçou a necessidade de haver "uma abordagem coordenada a nível europeu", razão pela qual a Comissão Europeia vai apresentar, em meados de maio, "recomendações para todos os países adotarem".

"O que podemos recomendar é que, quando se restabelecerem as viagens" sejam considerados aspetos como a "não discriminação com base na nacionalidade, isto é, assegurando que quem quiser viajar para um determinado destino consegue fazê-lo, do ponto A para o ponto B", precisou a comissária europeia.

"Acho que isto é o mínimo que podemos imaginar neste momento, como a situação sanitária é diferente de país para país, não podemos pedir a todos que abram ao mesmo tempo", disse Adina Valean.

A comissária europeia dos Transportes ressalvou, ainda, que esta é uma responsabilidade dos Estados-membros, cabendo aos países "decidir quando é seguro o suficiente para os seus cidadãos viajarem ou para receber viajantes de outros países".
Comissão Europeia desaconselha viagens para fora da UE

O executivo comunitário não aconselha os cidadãos europeus a viajar para fora da UE até ao final do ano ou até a pandemia estar "numa situação estável", com tratamento disponível, de forma a evitar casos de pessoas retidas em países terceiros.

"Não recomendo que as pessoas considerem destinos fora da UE até não estarmos numa situação estável, como por exemplo com um tratamento ou com uma vacina disponível, e não penso que esse seja o cenário até final do ano", afirmou Adina Valean.

Apelando a que as pessoas não pensem deslocar-se a "países terceiros nesta fase", a comissária europeia dos Transportes frisou que a Bruxelas "não quer voltar a ver cidadãos europeus retidos" fora da UE.

"Essa foi a situação no início da crise e, por isso, tivemos de organizar vários voos para repatriar pessoas que estavam retidas em destinos afastados e que não puderam utilizar transportes para voltar", ressalvou, recomendando "cautela nesta questão".

Estão impostas fortes restrições à circulação nas fronteiras externas e internas da UE, desde meados de março, devido às medidas de contenção adotadas pelos Estados-membros para tentar minimizar a propagação da infeção provocada pelo novo coronavírus.

De acordo com a informação da Comissão Europeia, disponível no `site` sobre a resposta ao novo coronavírus, existem de momento (dados de final de abril) limites às viagens internacionais em todos os países da UE, embora alguns sejam apenas parciais ou regionais.

Em Portugal, por exemplo, estão proibidas as viagens internacionais, mas existe alguma permissão para aterragem de voos europeus, nomeadamente de repatriamento, com exceção das ligações a Itália e Espanha.

A 17 de março, os chefes de Estado e de Governo da UE, reunidos em videoconferência, acordaram a interdição de entradas internacionais "não essenciais" em território europeu por 30 dias, como proposto antes pela Comissão Europeia.

Mas a 08 de abril, a Comissão Europeia convidou os Estados-membros a prolongarem esta interdição até 15 de maio, o que se mantém.

Estas restrições de viagens aplicam-se a todos os Estados-membros da UE que fazem parte do espaço Schengen, mas também a Bulgária, Croácia, Chipre e Roménia, assim como aos quatro países associados, nomeadamente Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça, num total de 30 Estados (a Irlanda tem uma derrogação).

Até à data, não existem datas para levantar estas restrições, tanto a nível europeu como para fora, mas no que toca às viagens internacionais a comissária europeia admitiu que esta é uma "situação muito complexa".

"Por um lado, sabemos que existe cooperação e troca de informação ao nível da UE sobre o que acontece em cada Estado-membro, mas para retomar as viagens internacionais teríamos de dar aos viajantes informação suficiente [sobre esses destinos] que não existe exatamente, pelo que teríamos de depender de terceiras partes", adiantou.
UE recomenda máscaras nos voos mas não quer lugares vazios
Quando os voos forem retomados, a Comissão Europeia aconselha que os passageiros usem equipamentos de proteção como máscaras. No entanto, Bruxelas não quer adotar a regra de colocar assentos vazios para garantir distanciamento, por isso afetar a viabilidade económica das operações.

"Utilizar equipamentos de proteção - máscaras, em particular - deve ser uma das condições. É o mínimo que podemos fazer para nos protegermos a nós e aos outros ao pé de nós", explicou Adina Valean.

A comissária europeia dos Transportes sublinhou que outro dos conselhos de Bruxelas é que "seja garantida alguma distância [entre passageiros], o que é mais fácil de assegurar em aeroportos, em estações e mesmo em autocarros e comboios".

Em meios de transporte como autocarros e comboios, explica, é possível circularem "com um número mais baixo de passageiros, com indicações para as pessoas se sentarem, mantendo alguma distância entre elas, e com maior frequência".

Mas quanto às viagens aéreas, em aviões, a opinião não é a mesma.

"Aqui temos de garantir equilíbrio entre a viabilidade económica de um voo e o número de passageiros e claro que é mais difícil manter grandes distâncias, pelo que é um risco que a pessoa assume, apesar de tudo".

Quanto a uma eventual disposição de assentos vazios entre passageiros para garantir o distanciamento social, Adina Valean afastou esta medida como regra.

"Não recomendo, como norma, manter espaços livres [entre passageiros]".

"Dentro da indústria, também há posições diferentes, porque existem alguns que preferiam ter mais regras para assim restabelecer a confiança das pessoas para voltarem a apanhar um voo, e outros estão mais reticentes, afirmando que apanhar um voo corresponde a um risco aceitável".

Apresentando posições contra como a da transportadora Ryanair, que já veio dizer que não retoma a sua operação se tiver de voar com lugares vazios por não considerar viável economicamente uma taxa de ocupação a rondar os 60 por cento, Adina Valean afirmou que "eles têm alguma razão".

"Não devemos ser demasiado rígidos e é por isso que digo que devemos manifestar alguma flexibilidade sobre o que poderá ser aplicado, encontrando o equilíbrio certo com a viabilidade económica de um voo".

Todas estas questões vão ser, no entanto, consideradas nas recomendações que a Comissão Europeia divulgará em meados deste mês de maio sobre o funcionamento dos transportes em altura de pandemia.

"Não estamos a inventar nada de revolucionário, mas todas as recomendações visam clarificar e proporcionar uma adoção comum por todos os Estados-membros para que as pessoas saibam o que esperar quando viajam", afirmou a comissária europeia.

Bruxelas vai ter principalmente em conta a segurança desde o ponto de partida da viagem, embora considere que cabe também "às autoridades locais do local de destino assegurar que um viajante está o mais seguro possível".

Ainda assim, "a responsabilidade não pode ser atribuída a outra pessoa do que ao próprio passageiro, pelo que não podemos transferir essa responsabilidade para as empresas ou para os aeroportos para fornecerem máscaras", argumentou Adina Valean.

Em Portugal, a partir de segunda-feira, o transporte aéreo de passageiros vai ser limitado a dois terços da lotação normalmente prevista para cada avião, segundo definiu este domingo o Governo.

Divulgadas em Diário da República, esta medida "estabelece para o transporte aéreo um limite máximo de passageiros, bem como as exceções a esse limite e respetivos requisitos, por forma a garantir a distância conveniente entre os passageiros e a garantir a sua segurança”, prevendo igualmente as exceções à regra geral de dois terços da capacidade das aeronaves, que entra em vigor já este domingo.
UE não muda regras apesar de Estados-membros pedirem `vouchers` para passageiros

Apesar de Portugal e outros 11 países europeus terem pedido para Bruxelas considerar `vouchers`, dadas as dificuldades das companhias aéreas, a Comissão Europeia rejeita alterar as regras dos direitos dos passageiros, que obrigam a reembolsos em voos cancelados.

"Tenho conhecimento de que vários Estados-membros estão a solicitar essa mudança, mas de momento não a apoio, e incentivo antes toda a gente a tornar os `vouchers` mais atrativos para os passageiros fazerem uma escolha voluntária", afirmou a comissária europeia dos Transportes.

"Assim é a lei e assim deverá manter-se".

Numa declaração conjunta, Portugal, Bélgica, Bulgária, Chipre, República Checa, Grécia, França, Irlanda, Letónia, Malta, Holanda e Polónia realçaram que o regulamento europeu que estabelece regras comuns para assistência aos passageiros dos transportes aéreos em caso de cancelamento dos voos está a colocar "as companhias aéreas numa situação difícil, em que se veem confrontadas com um sério desafio em termos de liquidez", uma vez que determina a obrigação de as companhias darem a escolher entre reembolsos em dinheiro ou `vouchers` para futura utilização.

Estes países apelaram "à Comissão Europeia para que proponha com urgência uma alteração temporária do regulamento, [...] que permita às companhias aéreas escolher os meios de reembolso dos passageiros", considerando que a medida "constituiria uma solução para as atuais restrições de liquidez das companhias aéreas, preservando, simultaneamente, a competitividade da aviação europeia".

Embora compreenda "perfeitamente que existe um problema de liquidez para algumas companhias aéreas", que viram as suas receitas cair abruptamente devido à redução dos voos de passageiros e à queda da procura, a solicitação foi rejeitada por Adina Valean, para quem a atual legislação "é algo bastante importante para os cidadãos europeus por saberem que, quando compram um bilhete, estão protegidos em várias situações, como cancelamentos".

Insistindo que está "nas mãos dos Estados-membros e das empresas" tornar estes `vouchers` mais apelativos, a comissária europeia sugeriu que as empresas façam "ofertas atrativas" e que os Estados-membros assumam garantias contra riscos nestes vales, como perante eventuais insolvências.

Com as fronteiras externas e internas da UE praticamente fechadas, o setor da aviação está a ser um dos mais afetados, com quebras na operação que chegam aos 90 por cento.

Nesse sentido, além das medidas já adotadas por Bruxelas, como as mexidas temporárias nas regras de atribuição dos `slots` e o alívio da carga regulamentar, a responsável romena sugeriu que os Estados-membros apoiem as suas transportadoras aéreas com ajudas estatais, "através de empréstimos, subvenções, garantias".


c/ Lusa
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