Covid-19. Busca por vacina em Espanha evidencia falta de capacidade de produção

por RTP
Para além de precisar de garantir a segurança e eficácia da vacina, quem produzir uma vacina terá de assegurar uma enorme capacidade de produção industrial. Foto: Euan Rocha - Reuters

A Viralgen, empresa sediada na cidade espanhola de San Sebastián, está há dois meses a tentar desenvolver uma vacina eficaz contra o novo coronavírus. Essa nunca foi, no entanto, a sua intenção, pois para além de habitualmente se dedicar a outra área, a empresa teme que a capacidade de produção em Espanha não seja a necessária para conseguir distribuir a vacina a nível global.

Dedicada à terapia genética, os tratamentos habitualmente realizados pela Viralgen consistem em utilizar um vírus como meio de transporte para introduzir nas células dos pacientes o gene cuja ausência causa determinada doença rara.

Essa técnica ajudou a empresa a entrar no mercado da terapia com células CAR-T, um novo tratamento para alguns tumores no sangue que consiste em extrair glóbulos brancos do paciente (linfócitos T), introduzir nos mesmos uma modificação e voltar a injetá-los.

“Não tínhamos a menor intenção de fabricar vacinas”, reconheceu ao El Pais o diretor-executivo da Viralgen. Javier García Cogorro explicou, no entanto, que a técnica de infetar muitas células com um vírus poderia ser relevante na produção de uma vacina e, por essa razão, à semelhança de várias outras empresas, também esta se propôs a procurar resposta para a crise pandémica.

No final de março, altura em que a Covid-19 já se tinha alastrado pelo mundo, o diretor do Centro de Terapia Genética de Massachusetts contactou a Viralgen e lançou a proposta, passando depois a tornar-se o líder científico do novo projeto. “Ligou-nos no final de março para perceber quem poderia fazer uma vacina assim, com um método de produção que permitisse garantir até centenas de milhões de doses”, explicou García Cogorro.

A Viralgen passou então a integrar um consórcio liderado pelo Massachusetts General Brigham Hospital e no qual participam ainda as empresas norte-americanas Aldevron e Catalent, a Universidade da Pensilvânia e a farmacêutica multinacional Novartis.

Durante os meses seguintes passaram a desenvolver e a testar, primeiro em animais e depois em humanos, uma entre mais de 100 vacinas em todo o mundo que tentam atualmente alcançar uma proteção contra o novo coronavírus.

Existe, porém, um entrave. Para além de precisar de garantir a segurança e eficácia da vacina, quem produzir uma vacina terá de assegurar uma enorme capacidade de produção industrial. Em Espanha, até a vacina anual contra a gripe comum é importada por falta de capacidade de produção.

De acordo com a Viralgen, mesmo que exista capacidade de fabrico de uma vacina contra o novo coronavírus, há ainda a incerteza quanto às matérias-primas essenciais para a mesma e que, em Espanha, são escassas. “Há 30 anos estávamos melhor, mas entretanto as fábricas importantes retiraram-se de Espanha”, declarou.
"É difícil calcular a capacidade de produção"
Em Espanha, a ideia de que era necessária a capacidade de produção de vacinas internamente intensificou-se depois da epidemia de gripe A, em 2009. Chegou mesmo a ser criada uma empresa de produção de vacinas no país. No entanto, “uma vez passada a emergência, os governos tendem a esquecer-se desses episódios e dedicam os fundos a outras necessidades”, considerou ao El Pais José Escribano, fundador da empresa de biotecnologia para a saúde animal Algenex.

Especialista na vacinação para travar doenças em animais, a Algenex considera que a sua tecnologia pode adaptar-se à produção de vacinas para humanos. “As plataformas de fabricação de vacinas para uso veterinário e humano são muito parecidas, e as técnicas para introduzir a proteína que gera a resposta imunitária também”, elucidou por sua vez César Hernández, da Agência Espanhola de Medicamentos e Produtos Sanitários (AEMPS).

“Em Espanha temos pouca capacidade de fabricação de vacinas para humanos, mas a nível de vacinas veterinárias somos uma potência mundial”, afirmou, acrescentando que “é difícil calcular a capacidade de produção” no caso de uma vacina contra o novo coronavírus.

“Não sabemos ainda que antígeno terá de ser produzido nem em que quantidade. Também não sabemos se a vacina requer uma segunda dose de reforço para que seja obtida a resposta desejada. E também é importante saber a idade das pessoas que vamos vacinar. As pessoas idosas precisam de doses maiores”, explicou.

Desde o seu início, em dezembro, o novo coronavírus já infetou 6,2 milhões de pessoas em todo o mundo, das quais 375 mil são vítimas mortais. Há, até ao momento, registo de 2,6 milhões de recuperados.
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