Covid-19. Doentes jovens e de baixo risco apresentam sequelas em vários órgãos

por Inês Moreira Santos - RTP
Stephane Mahe - Reuters

Doentes jovens que eram saudáveis e não faziam parte dos grupos de risco elevado da Covid-19 ficaram com sequelas da doença e danos em vários órgãos quatro meses depois de terem sido infetados pelo novo coronavírus. De acordo com um novo estudo britânico, o cansaço, a falta de ar e dores são alguns dos sintomas que permanecem durante um longo período de tempo nestes doentes.

Pessoas saudáveis ​​e jovens têm, à partida, menos risco de ter complicações causadas pela Covid-19 ou de desenvolver doença grave. No entanto, um novo estudo britânico revela que podem surgir e permanecer sequelas a longo prazo, principalmente nos casos da chamada "Covid de longa duração".

De acordo com o estudo, divulgado este domingo pelo Guardian, estas pessoas supostamente de menor risco apresentam determinados sintomas durante muito tempo depois de terem sido infetadas pelo Sars-Cov-2. Neste estudo preliminar, uma equipa de cientistas identificou danos em vários órgãos do corpo de jovens quatro meses após a infeção.

"Numa população jovem de baixo risco com sintomas contínuos, quase 70 por cento dos indivíduos apresentam comprometimento de um ou mais órgãos quatro meses após os sintomas iniciais da infeção por Sars-Cov-2", lê-se no documento divulgado recentemente.

"Existem implicações não apenas para os casos de covid de longa duração, mas também para as abordagens de saúde pública que assumiram que os jovens sem doenças adjacentes são de baixo risco", acrescenta. 

Entre os órgãos mais afetados destacam-se o coração, os pulmões, o fígado e o pâncreas. Este estudo foi realizado através de uma combinação de ressonâncias magnéticas, análises sanguíneas, medidas físicas e questionários a cerca de 500 pacientes com idade média de 44 anos e sem outros problemas de saúde.

Esta investigação visa perceber os fundamentos físicos e desenvolver tratamentos para alguns dos sintomas estranhos e mais longos em pessoas com "Covid longa", que afeta mais de 60 mil pessoas no Reino Unido. Fadiga, problemas de memória ou confusão mental, falta de ar e dor estão entre os sintomas relatados com mais frequência por estes pacientes.
Qual o impacto a longo prazo?

Em alguns casos, os órgãos afetados estão associados aos sintomas da Covid-19 experimentados pelos pacientes. Isto é, uma pessoa que seja afetada a nível pulmonar quando está infetada pelo novo coronavírus terá problemas respiratórios. No entanto, o estudo não esclarece se as sequelas nos órgãos afetados são a causa dos sintomas persistentes dos pacientes de "Covid longa".

"A boa notícia é que o comprometimento é leve, mas mesmo com um olhar atento há algum comprometimento e em 25 por cento das pessoas afeta dois ou mais órgãos", disse Amitava Banerjee, cardiologista e professora associada de ciências humanas e dados clínicos da University College London, citada pelo diário britânico. "Isto é interessante porque precisamos de saber se [essas deficiências] persistem ou estão a melhorar - ou se há um subconjunto de pessoas que podem piorar".

Amitava Banerjee explicou que esta investigação, na qual participou, "apoia a ideia de que há um ataque ao nível dos órgãos e, potencialmente, ao nível de múltiplos órgãos, que é detetável e pode ajudar a explicar pelo menos alguns dos sintomas e a trajetória da doença".

Um outro estudo que analisou 58 pacientes hospitalizados com Covid-19 também obteve resultados semelhantes: 60 por cento apresentavam sequelas semelhantes nos pulmões, 29 por cento nos rins, 26 por cento no coração e dez por cento no fígado, dois a três meses após a infeção inicial, assim como alterações nos tecidos em algumas partes do cérebro.

"As descobertas iniciais de um estudo que examinou o impacto de longo prazo da Covid-19 revelaram que uma grande proporção de pacientes com Covid-19 que teve alta hospitalar ainda apresentavam sintomas de falta de ar, fadiga, ansiedade e depressão dois a três meses após contrair o vírus", indica esse estudo.

Ambos os estudos referem que os pacientes em estudo não foram monitorizados nem analisados antes de serem infetados pelo Sars-Cov-2, pelo que é impossível garantir que não tinham, de facto, qualquer outro tipo de problema adjacente.

Contudo, os cientistas concordam que é necessário investigar as sequelas que a Covid-19 deixa em alguns pacientes, bem como monitorizar os pacientes com alta médica para compreender a evolução da doença, dos danos que deixa e que tratamentos se poderá aplicar.

Além disso, Amitava Banerjee sugere que haja colaboração entre profissionais e especialistas e que, desse modo, os doentes Covid-19 sejam encaminhados para as especialidades de cardiologia, neurologia ou gastroenterologia, consoante os sintomas e as sequelas observadas após a alta médica.
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