Covid-19 fez disparar número de mortes por malária

por Joana Raposo Santos - RTP
A África Subsariana é a região mais afetada por esta crise, registando 95 por cento de todos os casos de malária do mundo. Stephen Morrison - EPA

A malária matou, em 2020, mais 180 mil pessoas do que estava previsto pela Organização Mundial da Saúde e a "culpa" foi, em grande parte, da covid-19. Segundo a agência de saúde da ONU, a pandemia veio fazer regredir os processos que tinham já sido alcançados no combate à doença, que afeta maioritariamente o Continente Africano.

No ano passado, foram cerca de 241 milhões os casos de malária detetados em todo o mundo: mais 14 milhões do que no ano anterior. A doença, provocada pela picada de um mosquito, matou também no ano passado 627 mil pessoas, mais 69 mil do que em 2019.

O número de vítimas mortais superou, assim, em 180 mil o número estimado pela Organização Mundial da Saúde. Segundo esta entidade, cerca de dois terços dessas mortes adicionais estão relacionadas com perturbações no processo de prevenção, diagnóstico e tratamento da malária.

Mas a situação “poderia ter sido muito pior”, sublinhou Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor da organização. “Graças ao trabalho árduo das agências de saúde pública nos países afetados pela malária, as piores projeções do impacto da covid-19 não foram alcançadas”.

Inicialmente, a Organização Mundial da Saúde tinha estimado que as mortes por malária poderiam duplicar em 2020.

“Agora precisamos de direcionar essa mesma energia e compromisso para revertermos os retrocessos causados pela pandemia e acelerar o ritmo da luta contra esta doença”, apelou Tedros.

Até há pouco tempo, o progresso no combate à malária encontrava-se num nível sem precedentes: os casos da doença caíram, entre o início do século e 2017, cerca de 27 por cento. Já as mortes diminuíram em mais de 50 por cento.

No entanto, entre 2017 e 2019 os avanços estagnaram e, a partir de 2020, pioraram.

A África Subsariana é a região mais afetada por esta crise, registando 95 por cento de todos os casos de malária do mundo e 96 por cento de todas as mortes. A grande maioria dessas mortes – cerca de 80 por cento – ocorre em crianças com menos de cinco anos.
Arranque da vacinação contra a malária essencial para travar crise
O mais recente relatório da Organização Mundial da Saúde refere ainda que 24 países registaram aumentos nas mortes por malária desde 2015, ano em que a agência de saúde da ONU arrancou com uma estratégia global para a erradicação da doença.

Nas 11 nações com os números mais altos de malária, os casos aumentaram de 150 milhões em 2015 para 163 milhões em 2020. Já as mortes cresceram de 39 mil para quase 445 mil no mesmo período.

“Penso que estamos na iminência de uma potencial crise de malária”, avisou aos jornalistas Pedro Alonso, diretor do Programa Global da Malária da OMS. Segundo este responsável, não só a erradicação da doença está longe de ser alcançada, como o problema está mesmo a agravar-se em muitas partes do Continente Africano.

Entre 2000 e 2020, apenas 23 países conseguiram passar três anos consecutivos sem transmissão local da doença.

A esperança reside, agora, na aposta numa vacina eficaz contra a malária. Na passada semana, a Gavi (Aliança Global de Vacinas) anunciou a aprovação de um financiamento de 156 milhões de dólares para a distribuição de vacinas às crianças da África Subsariana.

Pedro Alonso já alertou que este e outros fundos devem ser aplicados com a máxima urgência. Caso contrário, o potencial das vacinas pode reverter-se e tornar-se num “gigantesco falhanço”.

“A verdadeira barreira é a solidariedade internacional”, considerou. “Irá o mundo permitir que a primeira vacina contra a malária salve as vidas de dezenas de milhares de crianças africanas todos os anos, ou irá deixar que essa vacina fique parada numa prateleira?”, questionou o responsável.
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