Depoimento de testemunha. Trump exigiu a Zelensky investigação sobre os Biden

por Joana Raposo Santos - RTP
Alexander Vindman foi interrogado durante 45 minutos pelos democratas e outros 45 pelos republicanos no Congresso Jonathan Ernst - Reuters

O tenente Alexander Vindman, veterano de guerra no Iraque e especialista em assuntos da Ucrânia no Conselho de Segurança Nacional dos EUA, testemunhou esta terça-feira no Congresso norte-americano e salientou que Donald Trump "exigiu" ao homólogo ucraniano uma investigação sobre a família Biden, recusando a referir-se a tal como um "pedido". O veterano considerou ainda que a chamada entre os dois presidentes foi "inapropriada" e disse ter ficado "preocupado" com a mesma.

“É impróprio que o Presidente dos Estados Unidos exija a um governo estrangeiro que investigue um cidadão norte-americano e opositor político”, argumentou Vindman, que fez parte de um grupo de funcionários designado para estar presente durante o polémico telefonema entre Donald Trump e o seu homólogo ucraniano, Volodymyr Zelensky.

O especialista em assuntos da Ucrânia acrescentou que ouviu a chamada a partir de uma sala da Casa Branca, em conjunto com outros colegas. “Fiquei preocupado com o telefonema, o que ouvi foi inapropriado”, declarou.

Essa preocupação levou a que Vindman sentisse “o dever” de “reportar estas inquietações às autoridades apropriadas”. Alexander Vindman foi interrogado durante 45 minutos pelos democratas e outros 45 pelos republicanos no Congresso.

O veterano de guerra revelou ainda que, durante uma reunião realizada a 10 de julho – duas semanas antes do polémico telefonema -, o embaixador dos Estados Unidos na União Europeia, Gordon Sondland, declarou que a Ucrânia teria de levar a cabo “investigações específicas” caso quisesse ter uma reunião na Casa Branca.

“Os ucranianos precisavam dessa reunião”, defendeu Vindman. “Seria uma demonstração de apoio ao Presidente Zelensky, um Presidente recente e, francamente, um político recente na cena política da Ucrânia (…), que queria ter uma reunião com os Estados Unidos, a mais poderosa nação do mundo, de modo a implementar a sua agenda”, argumentou.


“Ficou também claro que, se a Ucrânia tivesse realizado uma investigação sobre as eleições de 2016, sobre os Biden e a Burisma [empresa ucraniana de energia que chegou a ter o filho de Joe Biden na direção], isso seria interpretado como uma jogada partidária”.

“Tal resultaria, sem dúvida, na perda de apoio bipartidário na Ucrânia, o que colocaria em risco a segurança nacional dos EUA e permitiria à Rússia avançar com os seus objetivos estratégicos na região”, argumentou.
Ingerência russa
Quando questionado sobre se tinha conhecimento de “provas credíveis” acerca de uma eventual ingerência da Ucrânia nas eleições de 2016, o tenente respondeu que não. Já quanto a uma alegada ingerência por parte da Rússia, Vindman disse ser “consensual entre toda a comunidade de Inteligência dos EUA que os russos interferiram nessas eleições”.

A testemunha disse ainda ter “clara noção” de que o Presidente Vladimir Putin promoveu a teoria de que foi a Ucrânia a interferir nas presidenciais norte-americanas de 2016.

Quanto à acusação defendida por Donald Trump de que Joe Biden e o seu filho Hunter Biden estão envolvidos em casos de corrupção na Ucrânia e na China, Vindman declarou que “Hunter Biden não aparentava ter as qualificações necessárias para um trabalho altamente renumerado na direção de uma empresa ucraniana de energia chamada Burisma”.

No entanto, o tenente disse não conhecer as qualificações de Hunter Biden e não saber muito sobre ele.
“Maliciosos ataques”
O tenente Alexander Vindman tinha já falado em privado no Congresso em outubro, altura em que disse que a transcrição da chamada entre Trump e Zelensky, divulgada pela Casa Branca, omitia palavras e frases relevantes para a investigação.

Nessa altura, o Presidente dos EUA atacou Vindman e considerou que não competia ao tenente ouvir telefonemas presidenciais. Desde então, Trump já publicou tweets com ataques a outras testemunhas envolvidas neste processo.

Esta terça-feira, nas suas declarações de abertura frente ao Congresso, o veterano de guerra Vindman descreveu como “maliciosos” os ataques de Trump a testemunhas.

“Quero declarar que os maliciosos ataques ao carácter destes distintos e ilustres funcionários públicos é repreensível. É natural discordar de algo (…), mas somos melhores do que ataques pessoais”, defendeu.

O tenente declarou ainda que as alegadas falhas na transcrição do telefonema entre presidentes não são, afinal, verdadeiramente significativas.
“Nunca vi esse homem”, diz Trump
Esta terça-feira testemunham também no Congresso Jennifer Williams, assessora do vice-presidente Mike Pence, Kurt Volker, antigo enviado especial dos EUA à Ucrânia, e Tim Morrison, assessor do Conselho de Segurança Nacional norte-americano. Para além de Vindman, também Williams e Morrison ouviram a chamada entre Trump e Zelensky a 25 de julho.

Donald Trump disse esta terça-feira ter assistido a partes da audiência no Congresso e considerou que Alexander Vindman e Jennifer Williams estavam “a ir muito bem”, acrescentando que a investigação é “um grande esquema”.

“Os democratas estão a utilizar a ideia de um impeachment para o seu próprio ganho político”, considerou o Presidente, algo que acredita não estar a resultar. “Estou no momento mais alto de sempre nas sondagens”, afirmou.

Quando questionado sobre se Vindman é uma testemunha credível, Donald Trump disse não o conhecer. “Nunca vi esse homem”, garantiu o Presidente. “Vou deixar que as pessoas tirem as suas próprias conclusões”.

As quatro testemunhas estiveram em reuniões à porta fechada ainda antes da audiência no Congresso, para serem ouvidas pelo Comité de Inteligência da Câmara dos Deputados dos EUA, que está a liderar a investigação sobre o alegado abuso de poder por Donald Trump ao solicitar à Ucrânia que investigasse a família Biden com o objetivo de interferir nas eleições presidenciais de 2020.
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