Ex-PM são-tomense pede afastamento imediato de militares envolvidos em maus-tratos a detidos

por Lusa

O ex-primeiro-ministro de São Tomé e Príncipe Jorge Bom Jesus defendeu hoje o afastamento imediato dos militares envolvidos nos maus-tratos a detidos após o assalto ao quartel-general das Forças Armadas, que, sustentou, precisam de "refazer a sua imagem".

"O que aconteceu é demasiado grave para que as coisas continuem no estado em que estão. A primeira coisa que tem de haver é essa expurga dentro das Forças Armadas, dentro das chefias", comentou o líder do Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe/Partido Social Democrata (MLSTP/PSD), numa entrevista à Lusa em Lisboa.

Quatro pessoas morreram, quando estavam sob custódia dos militares, na sequência do ataque ao quartel-general, no dia 25 de novembro, que foi classificado pelas autoridades são-tomenses como "uma tentativa de golpe de Estado" e condenado pela comunidade internacional.

O primeiro-ministro são-tomense, Patrice Trovoada (Ação Democrática Independente - ADI), afirmou à Lusa esta quarta-feira que a morte dos quatro detidos -- três atacantes e um alegado mandante do assalto -- configuram "execuções extrajudiciais de pessoas que são testemunhas-chave".

Nos dias seguintes ao ataque, foram divulgadas nas redes sociais imagens e vídeos dos quatro detidos -- três atacantes e um suspeito de ser mandante do assalto, que foi detido na sua casa -, ensanguentados, com as mãos amarradas atrás das costas e a serem alvos de maus-tratos.

Jorge Bom Jesus condenou "com todo o vigor a forma como os quatro cidadãos foram barbaramente torturados e assassinados" e defendeu a necessidade de as Forças Armadas recuperarem a sua imagem junto da sociedade são-tomense.

"Naturalmente [que é necessário] um processo de reforma, inclusivamente porque as forças armadas vão precisar de refazer a sua imagem. Não são essas Forças Armadas democráticas, defensoras do povo. A verdadeira imagem das Forças Armadas tem de ser rapidamente reposta para que nós possamos continuar a confiar nessas Forças Armadas", sublinhou Jorge Bom Jesus, que terminou o seu mandato à frente do Governo são-tomense há cerca de um mês, na sequência das eleições legislativas de 25 de setembro, em que a Ação Democrática Independente (ADI), de Patrice Trovoada, obteve maioria absoluta.

Depois da demissão do chefe do Estado Estado-Maior das Forças Armadas, brigadeiro Olinto Paquete, na sequência dos maus-tratos aos detidos, o líder do MLSTP/PSD insistiu na saída da restante chefia militar.

"Exigimos também que as chefias militares e todos aqueles que estão direta ou indiretamente implicados neste processo, sejam demitidos e com urgência. Não é preciso esperarmos as investigações. Têm que ser afastados para que as investigações sejam que sejam conduzidas com toda a imparcialidade", sustentou.

Questionado sobre o apelo do maior partido a oposição para a demissão das chefias militares, nomeadamente do vice-chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, Patrice Trovoada respondeu à Lusa que é necessários aguardar pelas averiguações internas em curso.

Na quinta-feira passada, o Governo são-tomense anunciou ter feito uma denúncia ao Ministério Público para que investigue a "violência e tratamento desumano" de militares contra detidos após o ataque ao quartel-general das Forças Armadas.

No mesmo dia, o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas de São Tomé e Príncipe pediu a demissão, denunciando "atos de traição" e condenando os "factos horrorosos" que envolveram a morte de quatro detidos -- três atacantes, detidos no quartel, e Arlécio Costa, um antigo combatente do `batalhão Búfalo` que foi identificado como mandante do assalto e que foi detido em sua casa pelos militares e levado para o quartel.

Na sexta-feira, o Presidente da República, Carlos Vila Nova, nomeou João Pedro Cravid como novo chefe do Estado-Maior.

Nas primeiras horas após o ataque, os militares detiveram ainda, na sua casa, o ex-presidente da Assembleia Nacional Delfim Neves, alegadamente identificado pelos atacantes também como mandante do assalto.

Delfim Neves foi libertado três dias depois, após ter sido presente à juíza de instrução criminal, com apresentação periódica às autoridades e termo de identidade e residência, e negou qualquer envolvimento com este ato, que descreveu como "uma montagem" para o incriminar.

Além da missão de informação da Comunidade Económica dos Estados da África Central (CEEAC), já no terreno, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos vai enviar esta semana uma equipa para o país para averiguar a situação de maus-tratos aos detidos.

Portugal enviou, 48 horas depois dos acontecimentos, uma equipa de inspetores da Polícia Judiciária e do Instituto de Medicina Legal para apoiar as autoridades são-tomenses nas investigações.

Tópicos
pub