HRW denuncia inação do Governo para travar ataques xenófobos na África do Sul

por Lusa

A perseguição e a violência contra africanos estrangeiros e asiáticos na África do Sul tornaram-se "rotineiros" e, por vezes, letais, segundo um relatório divulgado hoje, que denuncia a inação das autoridades para travar e investigar os ataques.

Em 64 páginas, o relatório "Roubaram-me a vida: Violência xenófoba contra estrangeiros na África do Sul", da organização não governamental Human Rights Watch, detalha os incidentes xenófobos no ano que decorreu após o governo sul-africano ter adotado o Plano de Ação Nacional de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Relacionada.

Durante este período, a Human Rights Watch (HRW) documentou mortes, ferimentos graves, deslocações forçadas, discriminação e barreiras no acesso à justiça e serviços básicos de que foram alvo os estrangeiros no país, nomeadamente africanos e asiáticos.

Os problemas incluem indiferença, negação e aprovação tácita de ações xenófobas por parte do governo e autoridades responsáveis pela aplicação da lei, barreiras à representação legal e dificuldade em adquirir e renovar documentos para manter o estatuto legal e aceder a serviços, incluindo educação e cuidados de saúde.

"Os cidadãos não sul-africanos têm sofrido onda após onda de violência xenófoba e vivem com medo constante de serem alvo apenas por não serem sul-africanos", disse Kristi Ueda, membro da divisão de África da Human Rights Watch e autora do relatório.

"O governo sul-africano deveria responsabilizar os responsáveis em toda a extensão da lei. A impunidade apenas encoraja os outros e perpetua a xenofobia", acrescentou.

Para a HRW, apesar da adoção, em março de 2019, de um plano de ação para combater a xenofobia, o governo "tem feito muito pouco" para assegurar que os ataques por parte da população, polícia ou funcionários governamentais sejam investigados e para que os responsáveis sejam responsabilizados.

Para o relatório foram entrevistadas 51 pessoas - incluindo crianças - nas províncias do Cabo Ocidental, Gauteng, e KwaZulu-Natal e analisados relatos dos meios de comunicação social, leis, regulamentos e decisões das autoridades sul-africanas.

O documento relata como os estrangeiros são "bodes expiatórios" e apontados como culpados pela insegurança económica, criminalidade e falhas governamentais na prestação de serviços.

Têm sido alvo de protestos e visto os seus negócios ser fechados, pilhados e incendiados.

A HRW relata, nomeadamente, a onda de violência registada no início de setembro de 2019, quando uma multidão armada e entoando `slogans` anti-estrangeiros atacou vários imigrantes e refugiados, destruindo os seus negócios e as suas casas e provocado o seu deslocamento forçado.

O governo declarou que 10 dos 12 mortos na violência eram sul-africanos, mas a Human Rights Watch afirma ter conseguido confirmar que pelo menos 18 estrangeiros foram mortos durante a violência.

HRW denuncia também a "forma discriminatória e abusiva" de atuação da polícia e de outros agentes do Estado, adiantando que as rusgas para identificar a venda de bens contrafeitos e verificar documentação estrangeiros e as empresas que gerem.

"A polícia deteve pessoas por alegada falta de documentação em celas de esquadras e centros de deportação, nalguns casos negando-lhes audiências em tribunal ou não as levando perante um juiz no período de tempo exigido", aponta o relatório.

Os funcionários afirmam frequentemente ter perdido ou extraviado os documentos ou outros bens das pessoas detidas.

Classificando como positiva a aprovação de um plano nacional de ação contra a xenofobia, a HRW considera que a iniciativa parece ter tido "muito pouco impacto" na vida dos estrangeiros asiáticos e africanos que vivem no país.

"Foi um passo positivo, mas claramente mais urgente são medidas concretas, particularmente para acabar com a violência, o assédio policial, e a impunidade", disse Ueda.

"Proteger os não nacionais de novos ataques e acabar com a impunidade da violência xenófoba requer uma estratégia a longo prazo e não apenas palavras no papel", acrescentou.

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