Incumprimento de decisões ameaça Tribunal Africano dos Direitos Humanos e Povos

por Lusa
Tiksa Negeri - Reuters

Nairobi, 21 out 2020 (Lusa) -- O incumprimento das decisões do Tribunal Africano dos Direitos Humanos e dos Povos pelos governos africanos está a comprometer o futuro deste tribunal, advertiu a Amnistia Internacional (AI) hoje, Dia dos Direitos Humanos em África.

Num relatório intitulado "O estado dos organismos e mecanismos regionais de direitos humanos em África 2019-2020", a AI observou que alguns países "declararam descaradamente que não cumpririam as ordens e sentenças do Tribunal", estabelecido em 2004 e atualmente sediado em Arusha, na Tanzânia.

A maioria das sentenças do Tribunal Africano foram proferidas contra a Tanzânia, que também tem o maior número de processos pendentes contra si, enquanto o Benim, o Quénia, a Líbia e o Ruanda não deram cumprimento a nenhum deles.

O Burkina Faso é o único país que as cumpriu plenamente, de acordo com a organização que monitoriza o desempenho dos direitos humanos.

"Os governos africanos estão a minar seriamente os organismos regionais de direitos humanos ao não cumprirem as suas decisões, ignorando os seus apelos urgentes, não os informando das situações nacionais de direitos humanos e privando-os dos recursos de que necessitam desesperadamente para as suas operações", refere a Amnistia.

Após o Ruanda, em 2016, três países -- Benim, em novembro de 2019, Costa do Marfim, em março de 2020, e Tanzânia, em abril de 2020 - decidiram retirar o direito dos indivíduos e das organizações não-governamentais de apresentar processos diretamente ao Tribunal Africano dos Direitos Humanos e dos Povos.

Uma decisão que estes governos terão tomado a fim de "contestar o Tribunal sobre decisões com as quais discordaram", o que, segundo a AI, é "muito preocupante".

"Os Estados africanos devem abster-se de utilizar o espaço político contra instituições, cujo objetivo é precisamente assegurar que a justiça esteja disponível para todos, independentemente da política do seu governo", advertiu Netsanet Belay, diretora de Investigação e Advocacia da Amnistia.

A AI considera "desencorajador" o fracasso geral dos países africanos no cumprimento das suas obrigações de informação sobre a situação dos direitos humanos no seu território.

Apenas seis apresentaram relatórios periódicos e seis outros - Comores, Guiné Equatorial, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Somália e Sul do Sudão - nunca forneceram nenhum.

"Dada a escala das graves violações dos direitos humanos em todo o continente, os organismos regionais de direitos humanos desempenham um papel crucial na prestação de justiça e responsabilização", disse Netsanet Belay.

A organização observou também que nem um único Estado-membro da União Africana (UA) ratificou ainda o Protocolo sobre Pessoas com Deficiência em África, dois anos após a adoção do tratado.

E cinco anos após a adoção do Protocolo dos Idosos, apenas dois países - Benim e Lesoto - o ratificaram.

"A Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos terá 40 anos em 2021. É dececionante que tantos governos ainda não tenham transformado a sua retórica em ações concretas de apoio aos organismos e instrumentos regionais de direitos humanos", concluiu Netsanet Belay.

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