Infeções e internamentos diminuem em Inglaterra após suspensão de restrições

por Inês Moreira Santos - RTP
Andy Rain - EPA

Pouco mais de duas semanas depois de Inglaterra suspender grande maioria das restrições impostas para combater a pandemia, o número de novos casos de Covid-19 e de doentes internados no país está a diminuir. O Reino Unido é dos países europeus com mais pessoas com vacinação completa, as crianças e os jovens estão de férias, mas os especialistas ainda estão a analisar o fenómeno. Há até quem questiona se a pandemia estará próxima do fim.

No dia 19 de julho, o Governo britânico suspendeu todas as restrições sociais em Inglaterra para evitar a transmissão da doença, incluindo a obrigação de usar máscara em ambientes fechados. Para suspresa dos especialistas, mesmo com o alívio das medidas, o número de novas infeções e hospitalizações tem estado a diminuir no país.

Entre os dias 25 e 31 de julho, o Reino Unido teve uma diminuição de 33 por cento dos novos casos de Covid-19, comparativamente aos sete dias anteriores. Esta descida contraria as previsões do Governo e dos especialistas britânicos, que recearam que fosse uma "experiência perigosa", mas os efeitos do desconfinamento em Inglaterra só deverão começar a ser sentidos a partir do final da semana.

"É uma queda extremamente rápida e que poucos previram", disse numa conferência de imprensa Martin McKee, professor de Saúde Pública Europeia na Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres. "No geral, é um pouco misterioso".

Os novos casos diários no Reino Unido somaram quase 55 mil no dia 17 de julho e depois desceram para menos de 25 mil no início da semana passada. A situação epidemiológica muda de dia para dia, mas a tendência semanal parece promissora, segundo o especialista.

Entre as possíveis explicações apontadas para este fenómeno estão o facto de mais de 70 por cento dos adultos já terem a vacinação completa, o início das férias escolares e o fim do campeonato europeu de futebol. Além disso, com o bom tempo de verão que se tem feito sentir no território, a maioria dos britânicos tem preferido espaços ao ar livre, o que também contribuiu para a redução dos contágios.

Há cerca de duas semanas, recorde-se, a variante Delta estava a disseminar-se facilmente no Reino Unido e começava a recear-se o surgimento de um novo pico de casos de Covid-19. Mas com este decrécimos acentuado dos últimos dias, há quem acredite que o fim da pandemia está para breve.
Como se previram os internamentos e os contágios?
Quando se começou a analisar a suspensão de restrições no território, as autoridades de saúde previram que houvesse um pico de internamentos a seguir, com uma média de mil a duas mil hospitalizações por dia.

Mas o mais dificil de prever era o comportamento da população assim que entrasse em vigor a "liberdade". Segundo a BBC, no início do mês de julho, o número de contactos que as pessoas mantinham, em média, era ainda muito inferior ao registado antes da pandemia - quatro pessoas por dia, em comparação com as dez anteriormente.

Por outro lado, os cientistas previram que se houvesse uma retoma gradual da normalidade, as hospitalizações não iam ultrapassar os mil diários, tal como se tem verificado nos últimos dias.

"Se foi uma aposta, foi calculada", disse à emissora britânica um dos especialistas. "Este não é um acontecimento inesperado".

Uma coisa é certa: tanto ministros e como especialistas em saúde do Governo manifestaram recear que a situação epidemiológica fosse piorar.

O ministro britânico da Saúde, Sajid Javid, chegou a dizer que os casos podiam chegar aos 100 mil por dia. Já Neil Ferguson, um dos principais especialista do Governo, achava que podiam atingir o dobro e chegar até aos 200 mil casos.

Na altura as taxas de infeção eram altas e duplicavam em menos de uma semana, mas estas previsões mais extremas foram também usadas como forma de influenciar o comportamento da população, como forma de alerta.

"Confundimos a comunicação sobre o uso de máscaras", afirmou à BBC uma fonte do Governo. "Tinhamos ministros a afirmar que iam deixar de usar, quando precisávamos que a populção permanecesse cautelosa".

"Nós sabíamos que tínhamos que controlar as coisas novamente", explicou ainda.
Reino Unido livre da pandemia?

Não se sabe exatamente o que levou à diminuição de casos, nem se se vai manter a tendência de descida. mas há entre especialistas num ponto: o alto nível de vacinação no Reino Unido, onde cerca de 70 por cento da população já está imunizada, é uma vantagem.

Acredita-se que seja também a principal razão pela qual o nível de internamentos e mortes por Covid-19 no país nas últimas semanas esteja longe de se aproximar dos números recorde do inverno passado.

De acordo com David Matthews, virologista da Universidade de Bristol, a variante Delta, que é altamente transmissível, provavelmente infetou quase todas as pessoas no Reino Unido que ainda não tinham sido vacinadas. Contudo, isso não será o caminho para a "imunidade de grupo" que podia impedir a circulação da variante.

"É mais relevante dizer imunidade coletiva no contexto de impedir que as pessoas sejam hospitalizadas e morram"
, explicou Matthews. "Provavelmente, estamos a aproximar-nos desse cenário aqui no Reino Unido".

Estas descidas são, de certa forma, encorajdoras e dão alguma esperança que seja o fim da pandemia da Covid-19. Mas os cientistas garantem que há apenas duas coisas que contirbuem ou controlam a disseminação do vírus: o nível de imunidade da população e os contactos socias.

Também para Paul Hunter, da University of East Anglia, é óbvio que se está a atingir algum tipo de "equilíbrio" e que um novo aumento de casos relacionados com o alívio de restrições é improvável, considerando o que se tem verificado.

E por equilíbrio Hunter refere-se a uma situação em que o vírus é mantido sob controlo, sem os grandes surtos do ano passado e, em que vai diminuindo, como acontece com outras doenças.

A grande incógnita é, segundo este investigador, o que vai acontecer no outono, quando o tempo arrefecer e as pessoas passarem a estar mais tempo em espaços fechados, voltarem aos escritórios e as crianças estiverem na escola.

Este equilíbrio não é um estado permanente, acrescentou ainda.

A diminuição da imunidade e o aumento dos contactos, especialmente em espaços fechados, podem facilmente levar a um aumento de infeções novamente.

A professora Christina Pagel, membro do Independent Sage e uma das signatárias da carta que classificou o desconfinamento como "perigoso e antiético", disse à BBC que está muito preocupada com o desenvolvimento da epidemia no país depois do verão.

"A Covid-19 é tão imprevisível. Reconheço que estava errada sobre o que iria acontecer agora, mas isso não significa que acabou. Precisamos de reduzir os casos ainda mais - se entrarmos no outono com 20 mil casos por dia, eu ficaria muito preocupada".
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