Irão. Grupos de direitos humanos condenam sentença capital contra três manifestantes

por RTP
Reuters

A autoridade judicial iraniana anunciou, na terça-feira, a confirmação da pena de morte para três homens envolvidos nas manifestações de novembro de 2019, desencadeadas por um aumento do preço do combustível. A decisão está, no entanto, a gerar uma onda de protestos contra a pena de morte e os grupos de direitos humanos exigem que seja revogada.

A pena "foi confirmada pelo Supremo Tribunal após um recurso dos acusados e dos seus advogados", indicou o porta-voz do sistema judicial, Gholamhossein Esmaili, citado pelo Mizan Online, o ‘site’ oficial da justiça.

Esmaili disse que dois deles foram detidos num "assalto à mão armada" e que foram recolhidas provas nos seus telemóveis, mostrando que durante as manifestações tinham incendiado bancos, edifícios públicos e autocarros.

Embora tenha sido interposto recurso contra as sentenças, este foi rejeitado pelo tribunal mas, de acordo com os advogados, as confissões dos três detidos foram "extraídas em condições aberrantes".

A 15 de novembro de 2019 começou um movimento de contestação, após ter sido anunciado um grande aumento do preço do combustível em plena crise económica agravada com as sanções norte-americanas, que afetou uma centena de cidades iranianas. Na altura, edificios da polícia foram atacados, algumas lojas pilhadas e bancos e postos de combustível incendiados.

Os três homens - Saeed Tamjidi de 26 anos, Mohammad Rajabi de 28 e Amirhossein Moradi de 26 - foram detidos, pela primeira vez, durante um dos protestos, considerados dos maiores da história da República Islâmica.

"Eles filmaram isso tudo (…) e enviaram para agências de notícias estrangeiras", declarou Esmaili, segundo um extrato das suas declarações transmitido pela televisão do Estado.

"Foi assim que foi determinado que estes ladrões armados são os bandidos que cometeram esses crimes durante os distúrbios. Eles próprios forneceram as melhores provas", adiantou.

De acordo com o Guardian, Rajabi e Tamjidi procuraram asilo na Turquia, depois de terem sido libertados, onde passaram algumas semanas em campos de refugiados, tendo sido deportados no fim de dezembro. Após um primeiro julgamento à porta fechada já em janeiro, foram condenados por crimes como sabotagem, assalto à mão armada e saída ilegal do país.
Grupos de direitos humanos condenam sentença

A confirmação da pena de morte, na terça-feira, foi a primeira declaração de Teerão sobre o julgamento dos manifestantes Amirhossein Moradi, Mohammad Rajabi e Saeed Tamjidi.

Mas algumas discrepâncias relatadas e a denúncia de maus-tratos aos acusados ​​durante a detenção estão a gerar controvérsia, e o grupos de defesa dos direitos humanos estão a pedir às autoridades iranianas que revoguem as sentenças.

O anúncio das sentenças aplicadas aos três manifestantes provocou uma onda de protestos na Internet, envolvendo importantes influenciadores das redes sociais iranianas, atores, cineastas, políticos e atletas, que publicaram os nomes dos acusados e a hashtag "Não execute".

A Amnistia Internacional instou o líder supremo do Irão, o aiatolá Ali Khamenei, a revogar as decisões.

"Khamenei do Irão deve anular as sentenças de morte dos manifestantes Amirhossein Moradi, Saeed Tamjidi e Mohammad Rajabi imediatamente", twittou a Amnistia. "O julgamento deles foi injusto e eles disseram que foram submetidos a tortura por espancamento, choques elétricos e que foram pendurados de cabeça para baixo".



Também a organização Human Rights Watch pediu a revogação imediata da decisão: "Estas sentenças foram proferidas sob acusações de segurança nacional vagamente definidas, e os réus tiveram acesso restrito a advogados e alegaram que as autoridades os torturaram ou espancaram para conseguir confissões coagidas", escreveu ainda Tara Sepehri Far, invesigadora do HRW no Irã .




Algumas personalidades da sociedade iraniana também se manifestaram contra a sentença anunciada na terça-feira, incluindo Hossein Mahini, jogador da equipa nacional de futebol, e o ex-vice-presidente Mohammad Ali Abtahi, que aconselhou o governo iraniano a não ser teimoso diante de protestos públicos.

"Uma parte importante deste sistema, no caso de protestos, acredita que as medidas devem ser reforçadas", escreveu Abtahi. "Escrevi muitas vezes que o sistema não tem espaço para ser teimoso".

Em resposta à onda de protestos online, as autoridades do Irão suspenderam o acesso à Internet durante a noite de terça-feira. Uma organização de monitorização da Internet, a NetBlocks, confirmou as interrupções e as medidas do governo para limitar as comunicações online no país.


Não é a primeira vez, aliás, que Teerão limita e bloqueia o acesso à Internet como resposta a dissidência generalizada ou a apelos a manifestar.

Numa entrevista divulgada no sábado pelo jornal reformador Charq, o advogado dos acusados criticou o julgamento, afirmando que a defesa não teve acesso aos dossiês.

Segundo o advogado Mostafa Nili, aquelas três pessoas estavam nas manifestações de novembro "porque a sua vida tinha sido afetada pelo elevado preço do combustível".

Nili disse que a defesa vai exigir um novo julgamento, sublinhando que os homens "insistem que não cometeram qualquer ato de sabotagem, incêndio ou distúrbio" e que não existe "qualquer documento" provando más ações, além das suas "próprias confissões", que renegaram durante o julgamento.

Recorde-se que um forte aumento nos preços subsidiados da gasolina levou a quatro dias de agitação em muitas cidades do Irão, onde a Amnistia acredita que mais de 300 pessoas foram mortas em confrontos com forças policiais e de segurança.

Em 2019, o grupo defesa de direitos humanos classificou o Irão como o segundo país do mundo com maior número de execuções realizadas. Estima-se que tenham sido executadas pelo menos 251 pessoas só no ano passado, neste país.
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