Jovens estudantes preparam grande marcha contra as armas em Washington

por Paulo Alexandre Amaral - RTP
Jonathan Drake, Reuters

O massacre da última quarta-feira na escola secundária Marjory Stoneman Douglas de Parkland, Florida, colocou de novo a questão do controlo das armas na agenda norte-americana. Mas, desta vez, quem tomou os microfones não foram nem as vozes anti-armas nem a poderosa NRA - National Rifle Association, acérrima defensora da segunda emenda. Foram os próprios estudantes, que se juntaram em manifestações e procuram agora organizar uma grande marcha em Washington, sede do poder federal nos Estados Unidos.

A comunidade escolar já antes tinha saído à rua na ressaca dos muitos tiroteios do género que abalaram o país nas últimas décadas. Fazendo a contabilidade só a partir de 2013, houve quase 300 ataques com armas de fogo em escolas do país, numa média de um ataque por semana.A espingarda automática AR-15 usada no massacre de quarta-feira pertencia a Nikolas Cruz. Na Florida, pode-se comprar e deter este tipo de armas a partir dos 18 anos.

Na quarta-feira, o massacre de 17 pessoas levado a cabo por Nikolas Cruz, 19 anos, um ex-aluno da Marjory Stoneman Douglas, voltou a levantar a questão da compra e circulação de armas de grande calibre no país.

No que vai de ano, este é já o 18.º incidente a envolver armas de fogo em escolas ou locais próximos de estabelecimentos de ensino nos Estados Unidos e, de súbito, parece ter havido aqui uma mudança de atitude, com a rédea dos protestos a mudar de mãos. Não são já os professores ou as autoridades locais, nem as organizações a tomar a iniciativa nos dias pós-Marjory Stoneman Douglas. Os microfones estão nas mãos de jovens, adolescentes, ainda sem idade para votar, mas que têm uma pergunta muito significativa para colocar aos líderes em Washington: “Sou eu o/a próximo/a?”.“Sinto que é a nossa vez de agir. Somos nós que estamos nessas escolas, somos nós que temos os atiradores a entra-nos pelas salas de aula dentro” (Lane Murdock, 15 anos)

É uma questão que não tem resposta. Os tiroteios nos Estados Unidos são tão frequentes que deixam de ter lugar como acontecimento extraordinário nas notícias, a não ser que o número de vítimas se aproxime ou ultrapasse os dois algarismos.

O episódio de Parkland resultou na segunda maior perda de vidas num tiroteio numa escola pública norte-americana, logo a seguir ao massacre de Sandy Hook. É ainda o mais mortífero de sempre numa escola secundária, superior em números ao massacre de Columbine (Littleton, Colorado), onde morreram 13 pessoas. O elemento invulgar nos dias que se seguiram não é assim a questão que se repete mas o sujeito: a própria comunidade estudantil. Que, mais do que interrogar os políticos do país, lhes aponta o dedo.

Preparados para levar a questão à sede política de Washington, os estudantes mobilizaram-se este domingo em manifestações e caminhadas para reivindicar leis para um maior controlo de armas, desafiando os políticos que - dizem - falharam na protecção que deviam aos alunos.

A estudante Emma Gonzalez é uma dessas vozes contestatárias que ocupou os écrans de televisão nos últimos dias. Ontem, durante uma manifestação em Parkland, deixou uma mensagem para o Congresso: “Esta luta agora é nossa, porque vocês fizeram tanta asneira que têm de ser os miúdos a tratar do assunto. Agora é a nossa tarefa e vocês não podem tirar-nos isso”.


A onda de contestação da inacção política não parece entretanto ter um fim à vista e, para o próximo sábado, está a ser organizada uma grande marcha em Washington (March for Our Lives – Marcha pelas Nossas Vidas). Uma forma de chamar a atenção para a segurança nas escolas, ao mesmo tempo que vão pedir aos representantes no Congresso para promulgarem nova legislação sobre o controlo de armas.

Estes assuntos serão também a bandeira de uma manifestação agendada para a próxima quarta-feira em Tallahassee, capital do Estado da Florida, onde líderes estudantis deverão reunir-se com um deputado que trabalha no dossier para acabar com a venda de armas de assalto. Como a AR-15 usada por Nikolas Cruz na última quarta-feira.

A par destas acções, no Connecticut, Lane Murdock, estudante de 15 anos que vive a 32 km da localização da escola primária de Sandy Hook, onde 20 crianças de 6 e 7 anos e sete membros do corpo escolar foram mortos em 2012, reuniu 50 mil assinaturas numa petição em que pede aos alunos norte-americanos para no dia 20 de abril abandonarem as salas de aula e protestarem nesse dia do 19.º aniversário do massacre de Columbine.
Trump dá sinal de endurecer controle
Um pouco sem norte nesta questão das armas e da defesa da segunda emenda – que criticou em determinadas circunstâncias, mas aceitando de bom grado o apoio de grupos ligados à NRA na campanha presidencial de 2016 – o Presidente Donald Trump quis esta segunda-feira dar um sinal de que apoia o reforço da verificação de antecedentes daqueles que possuem armas.

A referência ao assunto veio da Casa Branca, com a assessora de imprensa Sarah Huckabee Sanders a sublinhar que estando essas “revisões a ser consideradas, o Presidente é favorável aos esforços para melhorar o sistema federal de verificação de antecedentes”.

Trump terá abordado com o senador republicano John Cornyn um projeto de lei bipartidário de 2017 para procurar melhorar os procedimentos que antecedem a compra de armas.

O Presidente foi entretanto duramente criticado pela insensatez e insensibilidade revelada num tweet após o massacre de quarta-feira. Na ressaca do episódio, Trump apontou baterias ao FBI, acusando o bureau de estar demasiado ocupado a tentar provar o conluio com o Kremlin para seguir a pista que poderia ter evitado o massacre na secundária da Florida.



A resposta de um adolescente de 18 anos foi demonstrativa do que vai na cabeça de muitos destes jovens: “O senhor não pode culpar a burocracia por isto quando é você, senhor Presidente, o maior responsável de todos”, declarou David Hogg, de 18 anos.
Tópicos
pub