Advogados e juristas da Guiné Equatorial defendem que a corrupção "é a maior pandemia" que afeta os equato-guineenses e consideram que as leis anticorrupção aprovadas não mudaram a perceção sobre o país, que está sob assistência do FMI.
A posição da EG Justice e da Comissão de Juristas da Guiné Equatorial, a que a agência Lusa teve acesso, surge na sequência da divulgação, na semana passada, dos dados do Índice de Perceção da Corrupção da Transparência Internacional.
A avaliação anual atribuiu à Guiné Equatorial 16 pontos em 100 possíveis, colocando o país entre os 10 Estados mais corruptos do mundo.
"É uma pontuação que confirma que a maior pandemia que afeta os equato-guineenses é a corrupção", consideraram as organizações.
Nos últimos anos, o Governo da Guiné Equatorial ratificou a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção e a Convenção Africana para Prevenir e Combater a Corrupção, fruto de exigências previstas no acordo de assistência financeira assinado com o Fundo Monetário Internacional (FMI).
"As leis que deveriam sustentar o sistema jurídico na Guiné Equatorial são mera semântica, quase nunca se aplicam. O Governo não obedece à ordem jurídica internacional e regional da qual faz parte, muito menos às leis nacionais" disse Ponciano Mbomio Nvo, da Comissão de Juristas da Guiné Equatorial.
Os juristas assinalam também a publicação, em julho de 2020, de legislação anticorrupção, "com o único objetivo de parecer cumprir os compromissos internacionais" e lamentam que esta não preveja a existência de uma Comissão Nacional Anticorrupção.
Os juristas concluíram também que a lei não regula os processos de extradição, "um elemento importante", tendo em conta "os alegados casos de corrupção" que envolvem alguns dos mais altos cargos da administração.
A lei também parece isentar o Presidente, Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, e o vice-presidente e filho do chefe de Estado, Teodoro `Teodorin` Nguema Obiang Mangue, da obrigação de apresentarem declarações de bens, tal como exigido a todos os funcionários públicos, apontam os juristas.
"A corrupção flagrante e sistemática que afeta todas as camadas da administração é a verdadeira pandemia na Guiné Equatorial. É um modo de vida para os poucos da elite, à custa de todos os cidadãos", considerou, por seu lado, Tutu Alicante, diretor executivo da EG Justice.
De acordo com os juristas, a pandemia de covid-19, "que dizimou uma economia dependente do petróleo", fazendo disparar o desemprego e a inflação, tornou-se "rapidamente numa oportunidade para mais corrupção".
Como exemplo, apontam o facto de hotéis ligados a funcionários políticos terem recebido subsídios governamentais para alojar indivíduos em quarentena, a quem também cobravam as estadas.
"O recente acórdão do Tribunal de Justiça Internacional no processo dos bens apropriados [pelo vice-presidente e filho do Presidente da Guiné Equatorial) em França, as alegações de corrupção em Portugal contra o ministro das Minas (e também filho do Chefe de Estado), os escândalos de corrupção no Tesouro e nos portos nacionais, a tentativa falhada de aderir à Iniciativa de Transparência das Industrias Extrativas (EITI), ou os constantes desfiles de estrelas da música no país - a convite de funcionários do governo - apesar da economia esfarrapada, levaram os especialistas a perceberem corretamente o país como um dos mais corruptos do mundo", acrescentou Alicante.
Por isso, sustentou, "é inconcebível justificar a continuação da assistência monetária do FMI à Guiné Equatorial, dado o nível de corrupção".
Na edição de 2020 do índice de corrupção, a Guiné Equatorial manteve os 16 pontos do índice anterior, mas perdeu um lugar e passou para 174.º em 180 países da lista.
O Índice de Perceção da Corrupção, da Transparência Internacional, criado em 1995, é um dos principais indicadores à escala mundial sobre a perceção da corrupção no setor público de 180 países.
O índice reflete a perceção de especialistas e empresários e não da população em geral.