Kremlin pediu “notícias positivas” a 45 empresas russas

por RTP
Pavel Golovki - Reuters

O Governo russo instou grandes empresas do setor da energia à publicação de notícias positivas, segundo um documento consultado pela agência Reuters. Com esta medida, o Kremlin pretende destacar a melhoria de qualidade de vida para a população russa e os avanços científicos alcançados, a apenas quatro meses das eleições presidenciais.

Num documento de sete páginas enviado pelo ministro russo da Energia a 45 empresas do setor, o governo russo detalha que tipo de notícias está à procura: criação de novos empregos, avanços científicos e novas infraestruturas, especialmente as que envolvem apoio e financiamento do Estado.

“Para a maioria das pessoas, a vida ficou mais calma, mais confortável, mais atrativa. Mas muitos desses exemplos escapam à atenção dos media. A nossa missão, através de uma abordagem criativa e cuidadosa, é selecionar esses tópicos e conteúdos e oferecê-los aos meios de comunicação”, refere o documento citado pela agência Reuters

Sem fazer referência ao clima pré-eleitoral, uma vez que a Rússia se prepara para as eleições marcadas para março de 2018, a missiva enviada pelo Governo russo pede às empresas para alimentar um “fio de notícias positivas”, que devem corresponder a dois tópicos principais: “A vida está a melhorar” e ainda “Como eram as coisas antes; como são agora”.

O documento data de 9 de outubro e foi enviado pelo Ministério russo da Energia para executivos responsáveis pelas relações públicas e relações com o Governo de 45 diferentes empresas, 17 das quais são controladas pelo Estado. As restantes pertencem ao setor privado.

A missiva era também acompanhada de um convite endereçado a vários representantes das empresas para um encontro no Ministério da Energia a 12 de outubro, em Moscovo, onde seria discutido de que forma seria levado a cabo o pedido do Governo russo.

Entre as empresas destacam-se quatro gigantes: a Rosneft e a Lukoil, que operam no setor petrolífero, e ainda a Gazprom e a Novatek, especializadas na produção e exportação de gás natural.
Notícias todas as semanas
Segundo o documento consultado pela Reuters, a iniciativa partiu inicialmente de Sergei Kiriyenko, diretor-adjunto da administração da Presidência de Vladimir Putin. Questionados pela agência de notícias, nem este responsável nem o Ministério russo da Energia quiseram comentar a carta.

Certo é que o encontro de 12 de outubro acabou mesmo por acontecer, tendo sido presidido por Anton Inyutsyn, o ministro russo da Energia. Um responsável próximo de Putin também esteve presente no encontro, de acordo com a Reuters.

Mais uma vez, a eleição que se aproxima não foi mencionada pelos presentes. Os dois responsáveis delinearam algumas instruções a serem seguidas pelas empresas. Tal como no documento enviado, o Governo pediu a divulgação de histórias sobre unidades de negócio, sobretudo aquelas “onde é possível afirmar que a ajuda do Estado os retirou da crise, restabeleceu uma produção moderna e trouxe novos equipamentos e novos empregos a residentes locais”. Em fevereiro, o Ministério da Energia tinha requerido às empresas do setor que informassem antecipadamente o Governo russo de desenvolvimentos com possível influência sobre a opinião pública.

As instruções do governo estipulavam que as empresas em causa deveriam enviar "notícias positivas" todas as semanas, à segunda ou terça-feira de manhã. Essas histórias deveriam ser entregues no formato de uma tabela, acompanhadas de comunicados que pudessem ser reenviados para os órgãos de comunicação social com edição "mínima" por parte do Governo.

No documento, o executivo russo refere que a empresa deve também anexar o contacto de um responsável, disponível para responder às perguntas dos jornalistas ou prestar declarações às televisões sobre a história divulgada.

De forma a auxiliar as empresas na identificação de “casos de sucesso”, a missiva enviada pelo governo dá o exemplo do maior banco russo, Sberbank, que criou recentemente 700 empregos na cidade de Togliatti, ou ainda o caso de Yevgeny Kosmin, um mineiro na Sibéria Ocidental que fez com que a sua equipa recolhesse o valor recorde de 1,6 milhões de toneladas de carvão durante o mês de julho.

A investigação da agência Reuters surge a apenas quatro meses das eleições presidenciais da Rússia, que se vão realizar em março de 2018. Vladimir Putin, que ocupa a Presidência desde 2012, tendo anteriormente servido como primeiro-ministro do país, ainda não anunciou oficialmente que se irá recandidatar, mas as sondagens já dão como certa a sua reeleição.

A notícia surge também num momento em que a Rússia é acusada por vários países e entidades ocidentais de ingerência em vários escrutínios, desde o alegado conluio da equipa de Donald Trump com responsáveis russos, às acusações de "ciberespionagem" e de interferência em eleições por parte de Theresa May, ou mesmo à tentativa de influenciar a questão catalã em Espanha, situação entretanto denunciada pela União Europeia.
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