Líder trabalhista disposto a apoiar novo referendo sobre o Brexit

por Andreia Martins - RTP
“Se essa decisão for tomada, não vou fugir dela e vou agir de acordo com a mesma”, assume Jeremy Corbyn Hannah McKay - Reuters

Jeremy Corbyn, líder do Labour, disse este domingo que está disponível para apoiar um segundo referendo sobre a União Europeia caso esse seja o desejo dos membros do Partido Trabalhista, ainda que prefira o cenário de novas eleições gerais.

No dia em que decorre em Liverpool a conferência anual do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn revela em entrevista à BBC que apoiaria a solução de um segundo referendo sobre a União Europeia, caso essa fosse a posição adotada pelos responsáveis partidários.

“Vamos ver o que sai desta conferência. Obviamente, estou comprometido com a democracia do nosso partido”, afirmou à televisão britânica. 

No entanto, esclarece que não pode ser dado como certo que qualquer proposta de referendo que saía da reunião do partido mencione especificamente a saída da União Europeia. “Isso seria estar a especular. Não sabemos sobre o que seria”.

Já em declarações ao jornal Sunday Mirror, Corbyn explica que vai “seguir o que sair da conferência”.  

“Mas não estou a pedir um segundo referendo. Espero que concordemos que a melhor maneira de resolver isto é com uma eleição geral”, frisa o líder trabalhista, apontado o mês de novembro como uma possibilidade.  

Assinala, no entanto, que foi eleito para representar o partido. “Se essa decisão for tomada, não vou fugir dela e vou agir de acordo com a mesma”, refere ao jornal. 
Vozes dissonantes
Desde a votação do referendo que ditou a saída do Reino Unido da União Europeia que o Partido Trabalhista nunca rejeitou a opção de um segundo voto, mas o líder do partido tem antes optado por defender a antecipação de uma nova eleição geral no final de 2018.  

Na reunião do Partido Trabalhista, deverão ser apresentadas mais de uma centena de propostas relacionadas com a marcação de um novo referendo sobre a saída ada União Europeia.  

Mesmo que não haja novo referendo, o Labour poderá apresentar nos próximos dias uma moção de censura contra o Governo de Theresa May, caso o plano da primeira-ministra para o Brexit seja rejeitado, já depois de este ter sido descartado na cimeira de líderes europeus, que decorreu esta semana em Salzburgo.

Ainda que o líder trabalhista se mostre agora disposto a apoiar um novo referendo, à imagem do que for defendido pela maioria do partido, Len McCluskey, secretário-geral do Unite the Union - segundo maior sindicato britânico de trabalhadores, de grande relevância para o Partido Trabalhista – considera que qualquer votação deverá excluir a possibilidade de manutenção do Reino Unido na União Europeia.  

“As pessoas já decidiram sobre isso. Raramente temos referendos no nosso país. As pessoas decidiram contra o que eu queria e contra o que o meu sindicato queria, mas decidiram. Entrarmos novamente numa campanha que voltasse a abrir essa questão seria errado”, defende o responsável.

John McDonnell, figura de relevo do partido, avisava no sábado que a possibilidade de um novo referendo poderá trazer "riscos sérios", nomeadamente com a possibilidade de recrudescimento das tensões raciais ou do populismo de extrema-direita.

Por outro lado, vários membros do Parlamento já expressaram apoio total a um novo voto popular. O deputado David Lammy pede não só um referendo, mas também que "a opção de permanência na União Europeia esteja no boletim de voto".
Londres e Bruxelas ainda sem acordo
Entretanto, no centro de Liverpool, milhares de pessoas desfilaram este domingo em defesa de um novo referendo para o Brexit. Um protesto que ocorreu em Pier Head, onde decorre a conferência dos trabalhistas.

Milhares de manifestantes anti-Brexit desfilam no centro da cidade de Liverpool. Foto: Phil Noble - Reuters

De acordo com um inquérito da plataforma YouGov que entrevistou 1.054 membros do Partido Trabalhista, 86 por cento defende um novo referendo sobre o desfecho das negociações para o Brexit, quando apenas oito por cento se opõe ao mesmo escrutínio.   

A cinco meses de se concretizar a saída do Reino Unido, que deverá acontecer a 29 de março de 2019, Londres e Bruxelas ainda não chegaram a um acordo sobre o futuro da relação do antigo Estado-membro com a União Europeia, um entendimento que já está a ser negociado há quase dois anos.  

Na quinta-feira, os líderes europeus rejeitaram o plano de Chequers, delineado pela primeira-ministra britânica. Theresa May avisou que preferia sair sem qualquer entendimento com Bruxelas do que “aceitar um mau acordo”.

O plano de May previa a criação de uma área de livre comércio para bens depois do Brexit, evitando dessa forma os controlos de alfândega, o que permitiria a Londres manter aberta a fronteira entre a Irlanda - membro de pleno direito da União Europeia - e a Irlanda do Norte, pertencente ao Reino Unido.

O tema da fronteira é mesmo um dos mais relevantes para a resolução do impasse e o Governo britânico quer evitar essa medida de forma a não prejudicar o processo de paz entre os países alcançado há duas décadas, naquele que ficou conhecido por Good Friday Agreement. Cerca de 30 mil pessoas cruzam a fronteira entre as Irlandas todos os dias.   

Por sua vez, a União Europeia rejeita a possibilidade de qualquer forma de livre comércio, uma vez que Bruxelas vê como indivisíveis as quatro vertentes das liberdades de movimento: serviços, bens, pessoas e capital.

Na sequência da rejeição do documento preparado pela primeira-ministra britânica, o jornal The Sunday Times avançou este domingo que o Governo já admitia o cenário de eleições antecipadas para novembro. De acordo com o diário, a nova eleição serviria como uma forma de tentar angariar apoio público a uma nova estratégia do Governo.

Uma fonte em Downing Street veio entretanto desmentir as informações veiculadas e negou que tenham decorrido quaisquer reuniões para discutir o tema. Em comunicado, a primeira-ministra veio afirmar que este é o momento para "manter a cabeça fria" e "controlar os nervos".

Theresa May acusou ainda os vários partidos de oposição, incluindo os Trabalhistas, de tentarem angariar apoio político à custa do resultado das negociações sobre o Brexit com Bruxelas.

No poder desde julho de 2016 após a saída de David Cameron, a primeira-ministra Theresa May convocou eleições antecipadas para junho de 2017, de forma a alcançar uma maioria mais expressiva antes de se iniciarem as negociações para a saída da União Europeia. Acabou, no entanto, por perder a maioria absoluta que detinha no Parlamento.
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