Marcelo aponta Portugal como "primeira porta" para a América

por Carlos Santos Neves - RTP
O Presidente da República falou de Portugal como “um país fiável, que trilha um caminho consistente” e que “foi capaz de lidar com a crise” Nuno Fox - Lusa

De manhã coube ao primeiro-ministro promover Portugal como potencial “segunda casa” de empresários norte-americanos após o Brexit. À tarde o Presidente da República falou do país enquanto “primeira porta da América do Norte para a União Europeia do futuro”. Foi assim que Marcelo Rebelo de Sousa fechou esta segunda-feira uma conferência, na Fundação Calouste Gulbenkian, dedicada às relações com os Estados Unidos.

“Gostaríamos de continuar a confiar nos Estados Unidos da América”, clamou o Chefe de Estado no encerramento da conferência Os Estados Unidos e Portugal: Uma Parceria para a Prosperidade.

Num contexto de crispação crescente nas relações entre Estados Unidos e alguns dos tradicionais aliados ocidentais, fruto das políticas comerciais protecionistas prosseguidas pela Administração Trump, Marcelo Rebelo de Sousa levou à Fundação Calouste Gulbenkian uma aspiração: ver “cultivada todos os dias” a relação com a primeira potência mundial.A conferência da Gulbenkian realizou-se no dia em que foi noticiada a morte de Frank Carlucci, embaixador dos Estados Unidos em Lisboa nos primeiros anos após o 25 de Abril.


“Sabemos que toda a verdadeira aliança e amizade tem de ser cultivada todos os dias. E que atos e omissões unilaterais devem visar reforça-la e não enfraquecê-la. Mas estamos naturalmente cientes de que o significado destes gestos só pode ser inteiramente apreendido se houver conhecimento mútuo, empatia, e é por isso que temos vindo a apostar em dar-nos a conhecer melhor nos Estados Unidos da América”, afirmou o Presidente.

Se António Costa apelou durante a manhã, no mesmo palco, aos empresários norte-americanos para que passem a encarar Portugal como “segunda casa”, uma vez concretizada a saída britânica da União Europeia, Marcelo quis promover o país como “a primeira porta da América do Norte” para o espaço comunitário “do futuro”.

O Presidente da República pintou mesmo o quadro de “um país fiável, que trilha um caminho consistente, que foi capaz de lidar com a crise”. “Como dizia o senhor primeiro-ministro esta manhã, o destino ideal para o investimento americano na nova Europa pós-Brexit”, martelou.

Sob o olhar de George E. Glass, o atual embaixador dos Estados Unidos em Lisboa, Marcelo lembrou que Portugal foi “o primeiro país neutral” a reconhecer a independência da América, “um gesto político ousado na altura, porque a Inglaterra era o nosso mais velho aliado”, o que “não obstou à decisão que tomámos”.

“Nós confiámos. Percebemos que podíamos continuar a confiar. E gostaríamos de continuar a confiar nos Estados Unidos da América, independentemente das conjunturas políticas específicas dos nossos percursos históricos. Nós confiamos em vocês, confiem em nós de volta”, exortou.
“América não tem alternativa à UE”

Já à saída da conferência, diante dos jornalistas, Marcelo Rebelo de Sousa defenderia que os Estados Unidos não dispõem de alternativa aos europeus enquanto aliados. Sem fazer, todavia, qualquer referência direta às taxas alfandegárias sobre importações de aço e alumínio da União Europeia impostas pela mão de Donald Trump.

“A América não tem alternativa na Europa e não tem alternativa no diálogo como outros continentes, porque a Europa esteve onde os Estados Unidos não estiveram”, propugnou o Presidente.

“A Europa conhece África melhor do que os Estados Unidos, conhece uma parte da Ásia melhor do que os Estados Unidos, mantém um relacionamento muito intenso, de que a Organização Ibero-Americana é exemplo, com a América Latina”, enumerou, antes de estimar que “é do interesse das duas partes permanecerem não só aliadas como amigas”.

“Eu penso que isso é tão óbvio, tão óbvio, tão óbvio, que aquilo que é óbvio tem muita força”, rematou.
Soares e Carlucci, a “cumplicidade”
Na declaração que proferiu sobre a morte de Frank Carlucci, ainda no fórum da Fundação Calouste Gulbenkian, Marcelo Rebelo de Sousa evocou a “importância nuclear” do antigo embaixador dos Estados Unidos em Portugal no período que se seguiu ao 25 de Abril, designadamente em 1975. Recordou também a “cumplicidade estratégica” construída com Mário Soares.

Destacando a “qualidade diplomática” de Carlucci, Marcelo recuou ao “tempo em que, entre 74 e 76, se afirmou o avanço português para a democracia”.

“Um tempo de um mundo bipolar em que os embaixadores norte-americano e soviético, Frank Carlucci, ontem desaparecido, e Arnold Kalinin, simbolizavam outro contexto geoestratégico, bem diferente do atual em que os Estados Unidos da América e a República Popular da China discutem o comércio internacional e a situação da República Popular da Coreia”.

“Pois foi nesse outro tempo, que mostra a minha provecta idade, que pude testemunhar a qualidade diplomática de Frank Carlucci. Chegado a Portugal no início de 75, em plena revolução, teve durante algumas semanas de ir viver para Madrid, por razões de segurança. Mas durante o longo tempo em que esteve em Portugal não só criou com o futuro Presidente Mário Soares uma cumplicidade estratégica essencial, como demonstrou dotes particularmente relevantes na aproximação entre os Estados Unidos e Portugal”, fez notar.

Marcelo voltaria a falar do papel histórico de Carlucci no pós-25 de Abril após a conferência, quando se dirigiu aos jornalistas.

“Foi um embaixador muito importante, nomeadamente criou, como acabei de dizer, uma cumplicidade estratégica com o futuro Presidente Mário Soares”, insistiu.

“Apresento as condolências à família e recordo da experiência do jovem que vivia a revolução, jovem constituinte e jovem dirigente partidário, a importância nuclear desses dois vultos e, em especial, a importância de Frank Carlucci”, concluiu o Chefe de Estado.

Frank C. Carlucci III, embaixador em Lisboa de 1975 a 1978, morreu no domingo, aos 87 anos, na sua residência em McLean, no Estado norte-americano da Virginia. A notícia só foi divulgada esta segunda-feira.

c/ Lusa
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