Marrocos suspende relações com embaixada da Alemanha

por Inês Moreira Santos - RTP
Villar Lopez - EPA

O Governo de Marrocos decidiu "suspender todos os contactos" com a embaixada da Alemanha no país, devido a "profundos desentendimentos" sobre a questão do Saara Ocidental, segundo anunciaram fontes diplomáticas marroquinas.

A decisão do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Marrocos, que ocorreu esta semana, surge num contexto de tensões diplomáticas em torno do Saara Ocidental e após a administração do ex-presidente Donald Trump ter decidido em dezembro reconhecer a soberania de Marrocos sobre o território.

A imprensa local publicou, na segunda-feira, uma carta do ministro marroquino dos Negócios Estrangeiros, Nasser Bourita, dirigida ao chefe do Governo, Saad-Eddine El Othmani, na qual explicava a decisão de suspender as relações com a embaixada alemã.

"Solicita-se a todos os departamentos ministeriais (...) que suspendam todos os contactos, interações ou ações (...) tanto com a embaixada alemã em Marrocos como com as fundações políticas e agências de cooperação alemãs relacionadas", diz a mensagem oficial.

"O Ministério dos Negócios Estrangeiros também tomou a decisão de suspender todos os contactos ou relações com a embaixada", continua carta, que evoca "profundos desentendimentos" com a Alemanha a respeito de "questões" fundamentais para Marrocos.

Um responsável oficial do Governo de Rabat confirmou, esta terça-feira, a autenticidade da carta, mas sublinhou que esta não deveria ser revelada publicamente.

O mesmo responsável, que não quis ser identificado, disse à Associated Press que a decisão se deve à recente posição da Alemanha sobre a questão do Saara Ocidental, em particular no rescaldo da decisão norte-americana e acrescentou que uma bandeira da Frente Polisário, que luta pela independência, foi hasteada no exterior da assembleia regional da cidade alemã de Bremen, norte do país.

"Marrocos deseja preservar a sua relação com a Alemanha, mas esta é uma forma de alerta que expressa o desconforto sobre vários assuntos", afirmou a mesma fonte. "Não haverá contacto até que sejam dadas respostas a diferentes questões colocadas".
Rabat retalia críticas de Berlim

Entre os pontos críticos está, para além da posição da Alemanha sobre o Saara Ocidental, que critica a decisão dos EUA de reconhecer a soberania marroquina no território disputado, o afastamento de Rabat nas negociações sobre o futuro da Líbia numa conferência organizada em Berlim em janeiro de 2020.

O Governo marroquino ficou consternado com as críticas alemãs ao reconhecimento do ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, da soberania marroquina sobre o Saara Ocidental em troca de ações de Rabat para normalizar as relações com Israel, explicou uma fonte do MInistério dos Negócios Estrangeiros de Marrocos.

Estas posições revelaram "desrespeito" por parte das autoridades alemãs, afirmou ainda a mesma fonte.

Em geral, Marrocos tem boas relações com a Alemanha.

No início de dezembro de 2020, o chefe da diplomacia marroquina comemorou num comunicado "a excelência da cooperação entre os dois países", após uma reunião virtual com o ministro alemão da Cooperação Económica e de Desenvolvimento, Gerd Müller. Na altura, Berlim tinha disponibilizado 1,39 mil milhões de euros para apoiar as reformas financeiras de Marrocos e ajudar no combate à pandemia da Covid-19.

Entretanto, o Ministério dos Negócios Estrangeiros alemão disse estar ao corrente das informações divulgadas nos ‘media’ sobre a carta, mas não emitiu mais declarações. Esta terça-feira, o Governo de Berlim considerou não vislumbrar motivos para a deterioração das boas relações diplomáticas com Marrocos.

O embaixador de Marrocos foi já solicitado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros alemão a fornecer explicações do incidente numa "conversa urgente".

A Frente Polisário, apoiada pela Argélia, combate pela independência do Saara Ocidental após a anexação por Marrocos da antiga colónia espanhola em 1975.

Uma força da ONU permanece no terreno para monitorizar o cessar-fogo instaurado em 1991, apesar das recentes acusações mútuas de violação das tréguas. A ONU, que ainda não designou um novo mediador para o conflito, manifestou apreensão pela decisão de Trump – em troca da normalização das relações diplomáticas entre Marrocos e Israel –, e que poderá comprometer os esforços de negociação do prolongado conflito.

Numerosos países, incluindo a Alemanha, apoiam uma solução política impulsionada pelas Nações Unidas.
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