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May considera “muito provável” envolvimento russo na tentativa de homicídio de espião

por Andreia Martins - RTP
Will Oliver - EPA

Numa declaração esta segunda-feira perante o Parlamento britânico, a primeira-ministra britânica considerou que a tentativa de homicídio de Sergei Skripal, no passado dia 4 de março, constitui um ataque "indiscriminado e imprudente" contra o Reino Unido. Theresa May mostrou-se convicta de que Moscovo tem responsabilidades neste ataque, tendo sido diretamente responsável pelo envenenamento ou permitindo que o agente nervoso caísse nas mãos erradas.

Numa declaração perante os deputados na Câmara dos Comuns sobre o inquérito ao envenenamento de Sergei Skripal, a primeira-ministra britânica exigiu uma resposta por parte da Rússia até ao final do dia de terça-feira e avisou que não irá tolerar aquilo que considerou "uma tentativa descarada de assassinar civis inocentes" em solo britânico.

Caso não haja uma explicação "credível" por parte do Kremlin dentro deste prazo, o Reino Unido irá concluir que o ataque equivale "ao uso ilícito de força pelo Estado russo contra o Reino Unido", afirmou a primeira-ministra. 

Theresa May referiu ainda que o Embaixador russo no Reino Unido foi "convidado" a explicar como é que o agente nervoso foi encontrado no local do ataque. Segundo a líder do Governo britânico, o envenenamento terá acontecido por "ação direta" do Estado ou por "perda de controlo" do armazenamento russo deste agente nervoso. 

Segundo a primeira-ministra, o químico usado neste ataque deliberado é designado por "Novichok", um agente de qualidade militar desenvolvido pela Rússia que ataca o sistema nervoso. 

Boris Johnson, ministro britânico dos Negócios Estrangeiros, exigiu ainda ao representante diplomático em Londres que forneça "informação completa" à Organização para a Proibição de Armas Químicas sobre o programa russo de Novichok dentro do prazo estipulado. 

Segundo Theresa May, este episódio inscreve-se num "contexto de várias agressões" por parte do Estado russo, relembrando o conflito na zona leste da Ucrânia e a “anexação ilegal da Crimeia”, em 2014. A primeira-ministra falou ainda de “repetidas violações” do espaço aéreo de vários países europeus, bem como o “ataque bárbaro” contra Alexander Litvinenko, em 2006.

Numa referência às sanções que foram impostas contra cidadãos russos precisamente após o assassinato de Litvinenko, Theresa May garante que estas sanções se mantêm em vigor e que o Reino Unido está “pronto para assumir medidas mais importantes”.

"Na quarta-feira vamos analisar ao detalhe a resposta dada pelo Estado russo", disse ainda a chefe do Governo britânico, sublinhando que o Reino Unido está pronto a adotar "medidas muito mais amplas" do que as que foram tomadas no passado.

Na lista de agressões protagonizadas por Moscovo, Theresa May assinalou igualmente a campanha de "ciberespionagem" levada a cabo pelo Kremlin, incluindo a intromissão em eleições e recentes ataques de hackers ao ministério dinamarquês da Defesa ou ao Bundestag.
"Espetáculo de circo"
Antes da declaração no Parlamento, a primeira-ministra reuniu-se esta segunda-feira com o Conselho de Segurança Nacional do Governo britânico e revelou que a identificação do agente químico foi realizada por especialistas do laboratório de Porton Down.

Segundo a chefe do Governo, a Rússia tem histórico de produção deste agente nervoso e apresenta capacidades para continuar a sua produção.

A identificação clara de Moscovo como responsável nesta caso também advém, explicou, “do registo russo de assassinatos patrocinados pelo Estado” e a compreensão de que Moscovo vê “alguns desertores como alvos legítimos para assassinatos”.

Numa reação imediata à declaração de Theresa May, o Ministério russo dos Negócios Estrangeiros considerou que as palavras da primeira-ministra britânica têm "motivações políticas". 

"É um espetáculo de circo no Parlamento britânico. As conclusões são claras: uma nova campanha de propaganda informativa assente em provocações", disse a porta-voz Maria Zakharova, citada pela agência TASS. 

Sergei Skripal, espião condenado na Rússia em 2006, foi encontrado inconsciente no início do mês juntamente com a filha, Yulia Skripal, de 33 anos, numa rua de Salisbury, no sul de Inglaterra.  Os dois encontra-se hospitalizados e em estado crítico há mais de uma semana.

Ambos foram alvo de tentativa de homicídio com um agente nervoso, segundo confirmou a polícia inglesa. Nick Bailey, responsável das forças policiais, foi o primeiro responsável a chegar junto das vítimas e também continua hospitalizado.

A declaração de Theresa May surge depois de Vladimir Putin se ter recusado a falar sobre o assunto durante uma visita a Krasnodar, na região sul da Rússia. Segundo o correspondente da BBC em Moscovo, Putin exortou as autoridades britânicas a investigarem e apurarem o que esteve na origem deste ataque antes que haja qualquer colaboração entre Londres e Moscovo. 

“Investiguem tudo o que há a investigar, depois podemos discutir”, afirmou o Presidente russo. Vladimir Putin deverá ser reeleito para um novo mandato nas eleições que se realizam no próximo domingo. 

Na semana passada, o Kremlin garantiu que não estava a par do incidente, mas mostrou-se disponível para cooperar na investigação. “É uma situação trágica mas não temos informações sobre o que poderá ter acontecido” disse na altura Dmitry Peskov, porta-voz do Presidente russo.   Relações tensas entre Londres e Moscovo

Sergei Skripal, antigo responsável do Departamento Central de Inteligência, exilado no Reino Unido desde 2010, foi condenado em 2006 a 13 anos de prisão, tendo sido acusado de espiar ao serviço das autoridades britânicas e de colaborar com o serviço secreto de inteligência no Reino Unido, a MI6.

O “agente duplo” admitiu ter cedido nomes, moradas e nomes-código de “várias dezenas” de agentes russos às autoridades britânicas durante um período de dez anos.

Quatro anos depois, em 2010, Skripal integrou uma permuta de ex-espiões em Viena, ao estilo da Guerra Fria, onde a libertação de dez agentes plantados por Moscovo nos Estados Unidos implicou a libertação de quatro cidadãos russos. 
 
A imprensa britânica tem destacado as parecenças evidentes com o envenenamento de Alexander Litvinenko, dissidente de Moscovo e antigo responsável de inteligence, que morreu em Londres, em 2006, depois de ter ingerido uma bebida contaminada com Polonium-210, uma substância radioativa. Mais tarde, uma investigação revelaria que o homicídio fora muito provavelmente ordenado pelo Kremlin. 

Certo é que as desconfianças de um envolvimento da Rússia na tentativa de homicídio do antigo espião vulnerabilizaram ainda mais as relações entre Londres e Moscovo nos últimos dias. Na semana passada, o ministro britânico dos Negócios Estrangeiros levantou a hipótese de o Reino Unido boicotar o campeonato do mundo de futebol, que se realiza este ano na Rússia, com uma redução drástica da representação política enviada àquele país.

(com agências internacionais)
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