"Morte à América", o grito de Teerão em véspera de sanções

por Carlos Santos Neves - RTP
Milhares de iranianos assinalam este domingo os 39.º aniversário da tomada da embaixada norte-americana em Teerão, durante a Revolução Islâmica Abedin Taherkenareh - EPA

Largos milhares de iranianos concentraram-se este domingo em Teerão para assinalar mais um aniversário da tomada da embaixada dos Estados Unidos, no auge da Revolução Islâmica de 1979. A manifestação, que reeditou o grito de “morte à América”, teve sobretudo por alvo as sanções ressuscitadas pela Administração Trump. A imposição destas medidas à indústria petrolífera do país dos ayatollahs acontece na segunda-feira.

A 4 de novembro de 1979, pouco depois da queda do xá Reza Pahlavi, estudantes da linha dura invadiam a representação diplomática dos Estados Unidos na capital iraniana. Cinquenta e dois norte-americanos estiveram cativos durante 444 dias.O acordo de 2015, denunciado por Trump, previa o levantamento de maior parte das sanções económicas e financeiras aplicadas ao Irão, em troca da abertura do programa nuclear do regime à fiscalização das Nações Unidas.


O 39.º aniversário destes acontecimentos levou este domingo milhares de pessoas às ruas de Teerão. Houve manifestações semelhantes em mais cidades do país. A televisão estatal refere milhões de iranianos mobilizados para os protestos contra Washington.

Aos juramentos de fidelidade ao Guia Supremo do Irão, o ayatollah Ali Khamenei, somaram-se gritos de “morte à América”, além de bandeiras dos Estados Unidos e pelo menos uma efígie do simbólico Uncle Sam reduzidas a cinzas. Foram ainda queimadas fotografias do 45.º Presidente norte-americano às portas da embaixada.

Esta é uma tradição anual. Mas é agora potenciada pelo atual contexto de regresso das sanções económicas pela mão da Administração de Donald Trump, que rasgou em maio deste ano o acordo nuclear de 2015. Grã-Bretanha, França, Alemanha, Rússia e China continuam comprometidas com este instrumento assinado sob os auspícios da Administração Obama.

António Mateus - RTP

A retórica da República Islâmica subiu de tom nos últimos dias, com a aproximação da data da entrada em vigor das sanções norte-americanas. No flanco militar, a resposta passa por 48 horas de exercícios de defesa aérea, a partir desta segunda-feira.

“Podemos garantir ao nosso povo que o inimigo não será capaz de concretizar as suas ameaças ao nosso país”, clamou nas últimas horas uma alta patente iraniana, citada pela agência IRNA.
“Donald Salman”, um cartoon

“É humor negro, mas o público pode também ser levado a refletir sobre as contradições no comportamento de Trump e Al Saud”. O iraniano Masoud Shojaei Tabatabai explicou assim, na televisão estatal, o cartoon que criou para repudiar os laços entre o Presidente dos Estados Unidos e a casa real da Arábia Saudita, em particular o Rei Salman.

“Donald Salman” é o título do desenho animado de Tabatabai, cuja exibição é parte das comemorações em Teerão.



No sábado, o Guia Supremo do Irão dedicara já um discurso à exposição do que Teerão descreve como um mal-estar de alcance global perante a política externa da Administração Trump.

“O objetivo da América tem sido restabelecer o domínio que teve, mas falhou. A América tem sido derrotada pela República Islâmica ao longo dos últimos 40 anos”, afirmou Ali Khamenei.
Acordo em risco?
Enquanto as vozes de milhares de iranianos se erguiam nas ruas contra a América e Trump, o Conselho dos Guardiões da Constituição iraniana reprovada um crucial projeto de lei relativo ao financiamento do terrorismo, tido como crucial para manter colados os fragmentos do acordo internacional de 2015.

Trata-se de um diploma que permitiria ao Governo iraniano aderir à Convenção Internacional da ONU para a Eliminação do Financiamento do Terrorismo. O texto fora aprovado a 7 de outubro, no Parlamento de Teerão, com 143 votos favoráveis e 120 contra.

No entender do Conselho dos Guardiões, onde o peso da linha conservadora se impõe, o projeto de lei contrariava a lei islâmica e a própria Lei Fundamental do país, pelo que foi reenviado ao Parlamento para correção.

Este projeto forma, com outros três, um conjunto de leis preparadas nos últimos meses pela liderança política iraniana em resposta a exigências do Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI), tendo em vista a saída do país de uma curta lista negra de Estados não cooperantes: Irão e Coreia do Norte são os únicos países na lista.

O primeiro prazo estabelecido pelo GAFI para que Teerão reforçasse a legislação contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo esgotou-se no final do mês passado. Foi entretanto dilatado até fevereiro de 2019.

c/ agências internacionais
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