OLÍMPICOS - CRÓNICA DE BASTIDORES "O vil metal"

por Marco Hélio - RTP
RTP

Nunca tinha estado nuns Jogos Olímpicos. Confesso que era um sonho que tinha. Ver ao vivo os melhores dos melhores.

Sou daqueles tipos que até tem apetência para alguns desportos. Faço parte daquele grupo de pessoas que têm algum jeito para dar uns chutos numa bola com amigos ou dar umas braçadas na piscina. Mas isso não faz de mim um jogador de futebol ou um nadador olímpico.
Nem todos podemos ser Michael Phelps ou Simone Biles.
Nélson Évora ou Telma Monteiro.
Eles são os campeões que nós gostaríamos de ser. Mas não conseguimos. E não é porque não queremos ou não nos deram oportunidade para tentar. Simplesmente não conseguimos. Não nascemos para aquilo. E há muitos que mesmo nascendo, não aproveitam o dom. Não trabalham para tentar ser vencedores.
A esmagadora maioria de nós nunca será "o melhor do mundo" em coisa nenhuma. Esta é a realidade. Pouco interessante de tão óbvia. Mas é a realidade.
Nos Jogos Olímpicos estão os melhores do mundo. De cada país. De cada recanto do planeta. Todos campeões. Mesmo sem medalhas. Campeões só por terem conseguido aqui chegar.
Cerca de 11 mil atletas, de mais de 200 países que conseguiram apurar-se para Tóquio.
No mundo inteiro somos, assim por alto, perto de 8 biliões.
Não há Phelps, Biles ou Bolts ao virar de cada esquina.
Nem havia medalhas para todos se assim fosse. E era uma pasmaceira diga-se! Se ganhar, ser o melhor entre tantos, fosse assim tão fácil.
Os campeões não se definem apenas por aquilo que ganham.
Definem-se muito mais pelo que fizeram até se tornarem campeões.
Ganhar é apenas a face visível de um trajeto, esse sim, que os pode conduzir às conquistas.
É essa aprendizagem constante, o querer ser melhor cada dia e o trabalhar muito para que isso fique mais perto de acontecer, que os faz diferentes de quase todos nós.
Depois, há os que ganham e os que tentam ganhar. Estes últimos são os campeões sem medalhas. Não deixam de ser vencedores só porque o hino não se ouviu ou o peito não reluz.
Quando leio ou oiço que os atletas portugueses estão acomodados e não têm sede de vencer porque se contentam com um diploma olímpico ou apenas com o participar, fico a pensar porque somos nós tão críticos. Digo nós, porque eu me incluo algumas vezes nesse rol de vozes exasperadas com o suposto insucesso.
Em Tóquio já acompanhei algumas modalidades.
Em todas, os atletas que entrevistei falaram das dificuldades que tiveram de enfrentar para estar neste palco de sonho.
Quando escrevo estas linhas, a seleção de andebol já jogou com os vice-campeões do mundo. Perdeu com a Suécia por um golo. No tiro o João Paulo Azevedo foi 20° entre 29 participantes. Só falhou 5 pratos em 125. 5 em 125! Os que se apuraram para a final só acertaram em mais 3 pratos que o João. 3! Em 125! No atletismo a Lorene Bazolo foi quarta na série que fez nos 100 metros. Ficou a 13 centésimas da qualificação para a meia-final. 13 centésimas!
Em entrevista à RTP no fim da prova, a Lorene acabou a chorar. Por não ter correspondido ao que esperava dela própria. Ao que os portugueses esperavam dela. Mas chorou sobretudo ao recordar o que teve de sofrer para aqui chegar. Contando com estes, a Lorene já esteve em três edições dos Jogos. E nove anos depois de Londres 2012, emocionou-se a falar do quanto lutou para estar em Tóquio.
13 centésimas de segundo,
um golo ou uns míseros três pratos!
Alguém acredita que eles não quiseram marcar mais um golo, correr mais rápido ou ser mais certeiro no gatilho?
Breves instantes que para muitos são suficientes para tornar um caminho árduo, sinuoso e de superação constante ao longo de anos num retumbante insucesso.
Essa linha imaginária que separa a fama do fracasso. Que teimosamente criamos. Que temos de apagar se quisermos evoluir como fazem os melhores.
Para um dia sermos como eles. Para ganharmos mais vezes. Mesmo que não sejam medalhas.
No desporto como na vida.
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