Países Baixos. Luta contra a Covid-19 incendeia as ruas pela terceira noite consecutiva

por Paulo Alexandre Amaral - RTP
Reuters

A estratégia do Executivo de Mark Rutte para fazer frente ao recrudescer da pandemia de Covid-19 fez subir a temperatura dos protestos, com grupos violentos a sequestrarem as ruas em vários pontos do país. As regras do confinamento e o recolher obrigatório imposto no passado sábado entre as 21h00 e as 4h30 continuou, pela terceira noite consecutiva, a ser violentamente contestada em protestos que obrigam as forças de segurança a deitar mão de toda a sua capacidade para controlarem a situação.

Foi no sábado que Mark Rutte, chefe de um Executivo de saída devido a um escândalo relacionado com subsídios para responder ao contexto da pandemia, impôs para o país um recolher obrigatório. A resposta foi dada ainda na noite desse dia com vários grupos a saírem à rua por todo o país com ações violentas a que os Países Baixos não estavam habituados.

Nas localidades mais pequenas foram assinalados os incidentes mais preocupantes: durante a noite de sábado, em Urk, os protestos começaram com um buzinão que rapidamente escalou para o fogo posto a um centro de testagem à covid que deixou o edifício destruído. Na cidade de Enschede a multidão visou um hospital, lançando pedras contra as janelas e aterrorizando o pessoal médico e profissionais de saúde que se encontravam encurralados no interior.
A situação atingiu proporções tão preocupante que foram enviados agentes militares num esforço para controlar aquelas cidades.

Mas a noite de domingo acabou por não revelar sinais de que a tensão estivesse a diminuir no país e pela segunda noite consecutiva vários grupos saíram de novo à rua para fazer ouvir a sua contestação ao plano de Mark Rutte. Lojas saqueadas e incêndios marcavam a imagem dessa noite em cidades como Eindhoven e Amesterdão, com a polícia a deter centenas de pessoas.

Num apelo marcado pelo dramatismo, o presidente da Câmara de Eindhoven, John Jorritsma, declarava temer que, “se continuarmos por este caminho, vamos rumo a uma guerra civil”. Mas as palavras de Jorritsma – que já apelidou os manifestantes que recorrem à violência de “escória da terra” – não tiveram qualquer efeito e a noite desta segunda-feira não foi diferente das anteriores. Os protestos violentos foram a resposta dos holandeses aos apelos das autoridades, num claro sinal de revolta contra o que consideram ser uma restrição à sua liberdade.
Segunda-feira e a noite volta a ser violenta

Em várias cidades a rua foi de novo palco de confrontos, com a polícia a responder com mão pesada. Em Amesterdão e Roterdão, a polícia fez centena e meia de detenções numa noite marcada pelos saques e vandalização de estabelecimentos comerciais.

Temendo o descontrole da rua, o presidente da câmara de Roterdão tinha já alargado os poderes de ação da polícia. “Estas pessoas não passam de ladrões sem vergonha, não posso dizê-lo de outra forma. Tivemos de os ameaçar com o uso de gás lacrimogéneo. Isso deixa-me triste, porque nunca tive de fazer isso em todo o meu percurso enquanto presidente da câmara”, lamentou Ahmed Aboutaleb, que lidera o executivo municipal desde 2009.
Antena 1

O mesmo cenário de terror foi vivido por todo o país, em localidades mais pequenas; em Den Bosch, Zwolle, Amersfoort, Alkmaar, Hoorn, Gouda e Haarlem foram incendiados carros e a polícia chegou a ser visada por apedrejamentos.

“Estamos perante um grave distúrbio da ordem pública. As medidas são difíceis para todos, todos queremos ter liberdade de irmos onde queremos. Mas isso não dá a ninguém o direito de começar um incêndio (…) e de cometer vandalismo”, considerou o presidente da Câmara de Haarlem, Jos Wienen.

O primeiro-ministro Mark Rutte condenou os motins do fim de semana, verberando os autores dos protestos: “O que motivou estas pessoas não tem nada a ver com protestos; isto é violência criminosa”.
Mas os holandeses recusam-se a ouvir tanto as críticas como os apelos e continuam a não aceitar as regras do recolher noturno que deve estender-se pelo menos até 9 de fevereiro, uma realidade que não era vivida no país desde a II Guerra Mundial, o que marca claramente a gravidade da posição dos Países Baixos nesta crise pandémica. Face ao descontrolo de uma facção mais violenta da população, autarcas de várias cidades anunciaram entretanto medidas de emergência para evitar novos atos de vandalismo.

O líder do sindicato nacional da polícia holandesa afirmou numa declaração a uma televisão que os agentes estavam preparados caso os tumultos continuassem: “Espero que tenha sido uma situação pontual, mas receio que possa ser um prenúncio para os dias e semanas que aí vêm”, assinalou Koen Simmers.
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