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Paralisia na Irlanda do Norte reflete complexidade do sistema político

por Lusa

A paralisia política na Irlanda do Norte provocada pelo Partido Democrata Unionista (DUP), que recusa viabilizar a Assembleia e Governos regionais enquanto persistirem problemas causados pelo `Brexit`, reflete a fragilidade do sistema de partilha de poder, segundo analistas. 

Desde que foi criada, um ano após os acordos de paz de 1998, a Assembleia de Stormont esteve suspensa 35% do tempo, devido à instabilidade política na província britânica. 

O mais longo interregno foi entre 2002 e 2007, quando os trabalhos foram interrompidos na sequência de uma rusga da polícia aos escritórios do Sinn Féin no parlamento por suspeitas de espionagem, o que levantou questões sobre a motivação da polícia, mas também da idoneidade do braço político do grupo paramilitar Exército Republicano Irlandês (IRA).

O parlamento norte-irlandês esteve novamente interrompido entre 2017 e 2020 devido a desacordos entre o DUP e o Sinn Féin, com este último a exigir compromissos para a introdução do ensino da língua gaélico no sistema educativo da região.

Tudo isto acontece porque o acordo de paz de 1998, designado de Acordo de Belfast ou da Sexta-feira Santa, desenhou um sistema que assenta num frágil equilíbrio entre as comunidades republicana - que defende a unificação com a República da Irlanda - e `unionista` - que quer a permanência da Irlanda do Norte no Reino Unido.

Segundo o sistema de partilha de poder, o governo autónomo regional tem de distribuir de forma igual os cargos entre os principais partidos `unionista` e nacionalista.

As eleições de 05 de maio foram ganhas pela primeira vez por um partido republicano, o Sinn Féin, com 27 deputados, tendo direito a nomear o primeiro-ministro, enquanto o DUP, com 25 assentos, fica com a posição de vice primeiro-ministro.

Mas enquanto o DUP recusar nomear ministros para o Executivo, este não pode ser formado. 

O DUP invocou como argumento o desacordo com o Protocolo da Irlanda do Norte, a solução encontrada durante o processo de saída do Reino Unido da UE para evitar uma fronteira física na Irlanda do Norte, um dos princípios dos acordos de paz. 

A província britânica ficou com um estatuto especial, dentro da união aduaneira britânica mas associada ao mercado único europeu e sujeita a regras da UE, com controlos aduaneiros e burocracia adicional para a entrada de mercadorias que chegam do Reino Unido. 

Porém, os unionistas consideram que este mecanismo cria barreiras económicas e políticas que afastam a região do resto do país, exigindo que o Governo britânico tome "ação decisiva" e revogue o Protocolo, que faz parte do Acordo de Saída do Reino Unido da UE.  

Para Brendan O`Leary, politólogo da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, é impressionante como "um pequeno partido minoritário de uma pequena assembleia regional dentro de um país, o Reino Unido, quer, na prática, que o Reino Unido acabe numa guerra comercial" com a UE.

Este especialista irlandês considera que esta é uma tentativa de o DUP tentar manter a influência na região, perante o declínio nas eleições que tinha ganho desde 2003, e travar um referendo sobre a unificação com a Irlanda, que o Sinn Féin deseja. 

"A hegemonia unionista está decididamente acabada", afirmou na quinta-feira, durante um debate organizado pela Universidade de Edimburgo, apontando para a mudança do perfil dos eleitores, menos conservadores e menos tribalistas.

Na opinião deste académico irlandês, são as graduais mudanças demográficas na região que vão ditar a organização de um futuro referendo, o que acredita que só acontecerá depois de 2030, quando "em todas as faixas etárias, exceto possivelmente os maiores de 80 anos, haverá uma maioria não protestante".

Clare Rice, professora da universidade de Liverpool, concorda que o referendo sobre a saída da Irlanda do Norte vai acontecer "num futuro não muito distante", ironicamente por causa do `Brexit`. 

"Provavelmente muito mais rapidamente ou mais cedo do que o que aconteceria se o `Brexit` não tivesse acontecido", sublinhou Rice.

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