Partido de Erdogan perde a capital da Turquia em eleições municipais

por Carlos Santos Neves - RTP
“Vamos admitir que ganhámos os corações do povo nas áreas em que ganhámos e vamos admitir que não fomos suficientemente bem-sucedidos nas áreas em que perdemos” Erdem Sahin - EPA

É o primeiro abalo encaixado nas urnas pelo AKP, a força política de matriz islamista do Presidente turco, em 16 anos à frente do poder executivo. O Partido da Justiça e do Desenvolvimento deixou fugir em eleições municipais a administração da capital, Ancara. “Cada vitória e cada derrota são a vontade do nosso povo”, reconheceu Recep Tayyip Erdogan.

Ao início da manhã desta segunda-feira, os resultados das eleições da véspera eram ainda incompletos. Contudo, a quebra do AKP de Erdogan neste processo - parcialmente convertido num plebiscito a 16 anos de poder pela erosão do desempenho da economia turca – era já um dado sólido.
O AKP governava Ancara há 25 anos. Mansur Yavas, à cabeça de uma aliança da oposição, é o candidato vencedor com 50,9 por cento dos votos, contra 47 por cento de Mehmet Ozhaseki, do partido de Erdogan.

Carimbada a derrota em Ancara, o Partido da Justiça e do Desenvolvimento ainda se arrisca a ver a histórica Istambul a ficar nas mãos do candidato oposicionista Ekrem Imamoglu.

Na segunda maior cidade do país, cuja câmara foi liderada no passado por Erdogan, o AKP reclama vitória. Mas o campo adversário afiança ter batido a lista do antigo primeiro-ministro Binali Yildirim por 28 mil votos.

A contagem em Istambul ainda não está fechada e a mútua contestação pode perdurar. Ali como em Ancara, uma vez que o AKP fez saber, na noite de domingo, que tenciona interpor recursos para a recontagem de dezenas de milhares de boletins de voto na capital que considera nulos.

“Vamos utilizar até ao limite os recursos jurídicos à nossa disposição. Não deixaremos que a vontade dos habitantes de Ancara seja desvirtuada”, afirmou Fatih Sahin, secretário-geral do partido.

Em declarações citadas pela edição online do jornal britânico The Guardian, o Presidente turco reconheceu, por sua vez, que “cada vitória e cada derrota” correspondem à “vontade do povo”.

“Vamos admitir que ganhámos os corações do povo nas áreas em que ganhámos e vamos admitir que fomos suficientemente bem-sucedidos nas áreas em que perdemos”, acrescentou Erdogan em Istambul, antes de partir para a capital.
“Sobrevivência da nação”

No domingo foram chamados às urnas na Turquia mais de 57 milhões de eleitores, aos quais coube designar os autarcas de três dezenas de grandes cidades, 51 capitais provinciais e 922 distritos.Pelo menos quatro pessoas morreram em confrontos, durante as eleições, no sul e no leste da Turquia. Em Diyarbakir, cidade de maioria curda, dezenas de pessoas ficaram feridas em situações de violência.

Quando estavam já apurados 90 por cento dos votos à escala nacional, o AKP obtinha, sozinho, 45 por cento, contra 30 por cento do principal partido da oposição, o secular Partido Republicano do Povo, CHP na sigla turca. Por outro lado, o pró-curdo HDP – Partido Democráticos dos Povos – reconquistou peso no sudeste do país.

O significado destas eleições para o AKP foi traçado pelo próprio Presidente turco durante a campanha, ao descrevê-las como cruciais para a “sobrevivência da nação”. Recep Tayyip Erdogan emprestou o peso da Presidência ao partido, comparecendo a mais de uma centena de reuniões e comícios em menos de dois meses, como observa a France Presse.

No início da gestão da derrota em Ancara, já a partir da sede do AKP na capital, o Presidente procurou destacar o facto de a aliança entre o seu partido e o MHP – Partido de Ação Nacionalista – ter obtido 51 por cento dos votos em todo o país.

Erdogan tratou depois de lembrar que o calendário eleitoral turco não prevê mais eleições até 2023, prometendo dar agora prioridade a “reformas económicas”.

c/ agências
Tópicos
pub