Pentágono perplexo com estratégia de Trump na Síria

por RTP
Donald Trump justifica o envio de tropas à região síria com a necessidade de "proteger o petróleo" Kemal Aslan - Reuters

O Pentágono mostrou-se surpreendido pela estratégia assumida pelo Presidente dos Estados Unidos na fronteira síria com a Turquia. Donald Trump defendeu o regresso das tropas norte-americanas à região com a necessidade de "proteger o petróleo" - uma justificação contraditória à do Pentágono, que assegura que os militares permanecem na zona para ajudar a derrotar o Estado Islâmico.

No início de outubro, Trump ordenou a retirada das tropas norte-americanas da fronteira síria com a Turquia, depois de Ancara ter anunciado que iria avançar com uma ofensiva militar no nordeste da Síria.

O Presidente dos Estados Unidos admitiu que deixou algumas forças para trás.

“Nós queremos trazer os nossos soldados para casa, mas deixamos alguns soldados lá porque estamos a proteger o petróleo”, disse Trump. “Eu gosto de petróleo. Nós estamos a proteger o petróleo”, acrescentou.

De acordo com Donald Trump, centenas de militares norte-americanos ficaram na Síria com o apoio de maquinaria pesada e veículos de combate, para impedir que militantes do Estado Islâmico se apoderem dos poços de petróleo sírios na região.

A versão do Pentágono não corresponde totalmente à de Donald Trump.

Na quinta-feira, numa tentativa de clarificar esta questão, um porta-voz militar declarou que as forças norte-americanas permanecem na fronteira síria com a Turquia com a mesma missão, de derrotar o Estado islâmico juntamente com as Forças Democráticas Sírias (SDF), lideradas pelos curdos.

“A segurança dos campos de petróleo é uma tarefa secundária a essa missão. E o objetivo dessa tarefa é combater o ISIS (Estado Islâmico do Iraque e do Levante)”, declarou o comandante William Byrne. “Não tenho a certeza se o Estado Islâmico já se está a ir embora e é por isso que estamos lá: para os ajudar a irem-se embora”, continuou a clarificar Byrne. 

Durante a conferência de imprensa em que Donald Trump anunciou a morte do líder do Estado Islâmico Abu Bakr al-Baghdadi, o Presidente dos EUA levantou a possibilidade de as companhias petrolíferas norte-americanas começarem a explorar os poços de petróleo no nordeste da Síria, atualmente sob domínio das Forças Democráticas Sírias (SDF).

O Presidente norte-americano sugeriu que apossar-se do petróleo sírio seria uma “compensação” justa para a deslocação militar norte-americana para o local.
Aos olhos de Donald Trump, o Estado Islâmico foi “amplamente” derrotado depois de ter sido declarada a morte de al-Baghdadi.

Também nesta questão, o Pentágono pensa de outra forma.

A receita dos campos petrolíferos na região, esclareceu também na quinta-feira, será destinada às forças apoiadas pelos EUA e não ao próprio país, tal como sugeriu Trump. “A receita não vai para os EUA, mas para as SDF”, garantiu o porta-voz Jonathan Hoffman.

A estratégia abertamente assumida por Trump nem sequer é legal, alertou entretanto o senador democrata Tim Kaine, citado pelo Independent.

A missão, tal como a descreve o Presidente, é falaciosa, afirma. “Arriscar as vidas das nossas tropas para proteger poços de petróleo na Síria não só é imprudente, como não é legalmente autorizado”.

“O Presidente Trump traiu os nossos aliados curdos que lutaram ao lado de soldados americanos para garantir um futuro sem o Estado Islâmico e, em vez disso, transferiu as nossas tropas para proteger poços de petróleo”, acrescentou o senador.
O receio do regresso de combatentes do Estado Islâmico
A partir do momento em que a Turquia abriu fogo com a Síria, instalou-se um clima de receio pela possibilidade de regresso de combatentes do Estado Islâmico.

Em entrevista à agência Reuters, Ilham Ahmed, líder político curdo, alertou a União Europeia para este cenário, aconselhando a tomada de medidas “duras” com Ancara.

“A ameaça é muito grande devido à maneira arbitrária pela qual os EUA se retiraram. Isso permitiu que muitos membros (do Estado Islâmico) escapassem e eles irão retornar aos seus países para dar continuidade às duas atividades terroristas”, explicou Ahmed.

“Isto representa uma grande ameaça para a Grã-Bretanha e para a Europa em geral”, continuou a alertar o líder curdo.

Erodgan já tinha lançado este fantasma. Depois de a União Europeia ter tentado mediar a intervenção turca na Síria, apelando a uma interrupção da operação, Erdogan ameaçou “abrir os portões” e enviar 3,6 milhões de refugiados para a Europa.Erdogan diz que EUA não estão a cumprir promessa
O Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, também se pronunciou sobre o conflito na passada quinta-feira.

Erdogam acusou os EUA e a Rússia de não estarem a cumprir o acordo de retirada das tropas curdas da fronteira, afirmando que este é um dos assuntos que pretende discutir na sua reunião com Donald Trump no próximo dia 13, em Washington.

“Enquanto mantemos estas conversas, aqueles que nos prometeram que os YPG [Unidades de Proteção do Povo] sairiam daqui em 120 horas não o cumpriram”, declarou Erdogan. Depois de ter iniciado uma ofensiva militar com o objetivo de criar uma “zona segura” na fronteira com a Síria, Ancara chegou a um acordo com Washington e concordou com um cessar-fogo temporário para permitir a retirada das forças curdas. Mais tarde, a Turquia chegou igualmente a um entendimento com a Rússia que se comprometia a facilitar a retirada das tropas curdas.

“Nem os EUA, dentro de 120 horas, nem a Rússia, dentro de 150 horas, foram capazes de fazer com que os terroristas abandonassem a região”, acrescentou Erdogan, mostrando a sua disposição para se reunir com o presidente russo Vladimir Putin, depois do seu encontro com Trump.

O presidente turco deixou ainda claro que a Turquia não vai abandonar a Síria até que os outros países também se retirem do local. Erdogan garantiu que só irá cessar-fogo quando todos os curdos tiverem abandonado a região.

“Não vamos desistir até que todos os terroristas deixem a região”, decretou Erdogan. “Não saírem daqui até que os outros países também saiam”, sublinhou.
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