Pilar Social. Costa traça prioridades da presidência portuguesa da UE ao Parlamento Europeu

por RTP
Francisco Seco - Lusa

Na condição de presidente em exercício do Conselho da União Europeia, António Costa debate esta quarta-feira com o Parlamento Europeu as prioridades da presidência portuguesa para o primeiro semestre do ano. Na sessão plenária em Bruxelas, o primeiro-ministro defendeu a realização "o mais rapidamente possível" de uma Conferência sobre o Futuro da Europa "centrada nos anseios e angústias dos cidadãos" e não nas instituições da UE.

Pouco menos de uma semana depois de ter recebido em Lisboa a visita de uma delegação do colégio da Comissão Europeia, liderada pela presidente Ursula von der Leyen, e de já ter recebido o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, no lançamento da presidência, António Costa culmina esta quarta-feira a ronda de discussões institucionais sobre o programa do semestre com o Parlamento Europeu.

Com o lema "Tempo de agir: por uma recuperação justa, verde e digital", a presidência portuguesa da UE, assume como grandes prioridades a promoção de uma recuperação da crise económica e social provocada pela pandemia alavancada pelas transições climática e digital, a concretização do Pilar Europeu dos Direitos Sociais da UE e o reforço da autonomia de uma Europa aberta ao mundo.

Na apresentação desta quarta-feira de manhã, no Parlamento Europeu, o primeiro-ministro defendeu a realização da "Conferência sobre o Futuro da Europa, como fórum de debate entre os Estados-membros e com os nossos cidadãos sobre o que queremos construir juntos como União no futuro".

Segundo Costa, esta "deve ser centrada nos anseios e angústias dos cidadãos e não nas questões das instituições".

"Enquanto presidência do Conselho [da UE], tudo faremos para que conferência possa ser lançada o mais rapidamente possível para que a possamos poder concluir com um debate aberto e esclarecedor", anunciou.

A conferência deve ainda ser "orientada para as políticas e as respostas comuns aos desafios estratégicos que temos de enfrentar num mundo cada vez menos eurocêntrico".

Para o primeiro semestre de 2021, que Portugal preside ao Conselho da UE, António Costa comprometeu-se a fazer  tudo "para que a conferência possa ser lançada o mais rapidamente possível para que possamos ter um debate aberto e esclarecedor com uma ampla participação".

O futuro da Europa passa pela partilha de "uma casa comum e os mesmos valores", respeitando as "diferentes visões da UE" sem renunciar à identidade nem à liberdade de cada um fazer as suas escolhas. Além disso, o primeiro-ministro considera que "não é compatível com um pensamento único, qualquer que ele seja", sublinhando a necessidade de se fazer "jus à divisa de uma Europa 'Unida na diversidade'".
Pilar social é melhor vacina contra "desigualdades, medo e populismo"
O Pilar Social é a "melhor vacina contra as desigualdades, o medo e o populismo", como defendeu António Costa perante os eurodeputados, e que pode "dar confiança aos europeus" de que as mudanças atuais "são uma oportunidade".

"Os populismos que minam as nossas democracias alimentam-se do medo. Concretizar o Pilar Social é por isso a melhor vacina contra as desigualdades, o medo, o populismo", referiu o primeiro-ministro no Parlamento Europeu.
Andrea Neves, correspondente da Antena 1 em Bruxelas

A concretização do Pilar Social é uma prioridade da presidência portuguesa e servirá de "base de confiança dos europeus na capacidade da Europa liderar as transições climáticas e digitais", mas como António Costa alertou, "não há tempo a perder" e agora "é tempo de agir".

"O desenvolvimento do Pilar Social é fundamental para dar confiança aos Europeus de que as mudanças que estamos a viver não são uma ameaça, mas podem e têm de ser uma oportunidade".

O primeiro-ministro referiu ainda que a sua concretização terá lugar no que qualificou de "evento central" da presidência portuguesa – a Cimeira Social, a 7 de maio no Porto – e que irá juntar "os parceiros sociais, a sociedade civil, os presidentes das instituições e os Estados-membros".

"O principal objetivo da Cimeira é dar um forte impulso político ao Plano de Ação, que a Comissão vai apresentar em março e que materializa a ambição expressa pelos nossos cidadãos de pôr em prática os 20 Princípios Gerais proclamados em 2017 em Gotemburgo", frisou.

António Costa esclareceu também que o Pilar Social visa "reforçar as qualificações dos cidadãos", de maneira a que estes "sejam atores e não vítimas" da transição climática e digital, e para "investir mais na inovação" e "reforçar a competitividade" das empresas.

Assim, segundo o primeiro-ministro, será possível garantir o "reforço da proteção social" e que "ninguém fica para trás".
"Motores das transições climática e digital" vão guiar retoma
Na sessão plenária no Parlamento Europeu, António Costa fez questão de destacar que a presidência portuguesa vai priorizar a retoma económica pós-pandemia guiada pelos "motores das transições climática e digital". O chefe do executivo português aproveitou ainda para apelar à rápida ratificação dos planos nacionais de recuperação.

A primeira prioridade, segundo apresentou, "é a recuperação económica e social da Europa" após a pandemia da Covid-19, "tendo como motores as transições climática e digital".

"Para isso temos de concluir os processos de ratificação da decisão de recursos próprios em todos os Estados-membros, de votar neste Parlamento o regulamento que foi já acordado e, finalmente, aprovar os 27 Planos Nacionais de Recuperação e Resiliência", apelou António Costa.

"Só venceremos esta crise no conjunto da União".

António Costa entregou no dia 15 de outubro o primeiro esboço do Plano de Recuperação e Resiliência à presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. E na semana passada, o Governo português aprovou, em Conselho de Ministros, a resolução relativa aos recursos próprios da União Europeia e requereu à Assembleia da República a ratificação do diploma com caráter de urgência.

Em causa está a decisão alcançada pelo Conselho Europeu em julho passado de um Fundo de Recuperação de 750 mil milhões para fazer face à crise gerada pela covid-19. Além do Fundo de Recuperação, esta ‘bazuca’ é constituída também pelo orçamento plurianual da União para 2021-2027, no montante global de 1,8 biliões de euros.

"Temos de pôr em execução os instrumentos de recuperação económica e social" na UE, apelou esta quarta-feira António Costa.

"Temos de iniciar a implementação dos programas do novo Quadro Financeiro Plurianual, designadamente aqueles que graças à determinação do Parlamento Europeu beneficiaram de um importante reforço, como os Programas Horizonte Europa, EU4Health, ou ERASMUS +, que tanto reforçam o espírito europeu", disse ainda.

Apesar da "máxima atenção que o combate à pandemia exige", não permite que a UE "descure os [seus] desafios estratégicos", razão pela qual "a recuperação europeia deve basear-se nos motores das transições climática e digital".

"Estamos em emergência sanitária, mas continuamos em emergência climática", apontou, instando à concretização do Pacto Ecológico Europeu para combate às alterações climáticas, nomeadamente através da aprovação da nova Lei do Clima a nível europeu.

"Esta é a década decisiva, que exige maior esforço e ambição, para conseguirmos cumprir o nosso compromisso de atingir a neutralidade carbónica em 2050".

Para António Costa, "esta é também a década da Europa Digital", por isso, a presidência portuguesa da UE irá dedicar "uma atenção particular ao novo Pacote dos Serviços Digitais, recentemente proposto pela Comissão, enquanto instrumento legislativo fundamental para a proteção dos direitos individuais e da soberania democrática, e para trazer maior concorrência ao mercado digital, estimulando o empreendedorismo e a criatividade".

"A recuperação não se pode limitar a responder às necessidades do presente com estímulos de conjuntura, mas com investimentos e reformas que nos permitam sair da crise mais resilientes, mais verdes, mais digitais"
, concluiu.
É hora de "pôr em marcha decisões históricas"
Ainda perante os eurodeputados, em Bruxelas, António Costa afirmou que o início do processo de vacinação, à aprovação do quadro financeiro plurianual e do Programa Next Generation EU "abrem uma porta à esperança".

O primeiro-ministro lembrou que Portugal assume esta pasta semestral, até junho, "num momento decisivo para pôr em marcha as decisões históricas que adotamos".

"É por isso que escolhemos como lema: tempo de agir, por uma recuperação justa, verde e digital", sublinhou, lembrando os três grandes prioridades da presidência portuguesa: a recuperação económica, o desenvolvimento do pilar social e o reforço da autonomia estratégica de uma Europa aberta ao mundo.

"A primeira condição da recuperação é o sucesso do processo de vacinação", defendeu o primeiro-ministro, acrescentando que é "indispensável que continuemos a trabalhar coordenadamente".

"Só em conjunto venceremos o vírus, restabelecendo a plena liberdade de circulação e todo o potencial do mercado interno".

"Mas também é indispensável solidariedade internacional para a erradicação da pandemia à escala global, seja nas nossas vizinhanças, seja no continente africano, seja na América Latina", rematou.
Relançamento das relações aberta com EUA e o mundo
No mesmo dia em que António Costa apresenta ao Parlamento Europeu, enquanto presidente em exercício do Conselho da UE, as prioridades para a presidência portuguesa, Joe Biden toma posse com novo Presidente dos Estados Unidos. Na sessão plenária em Bruxelas, o primeiro-ministro aproveitou para dirigir "votos dos maiores sucessos" ao novo Presidente norte-americano, sublinhando a necessidade de um relançamento das relações com os EUA.

Abordando a terceira prioridade da presidência portuguesa – a vertente de política externa, de "uma União Europeia aberta ao mundo" -, Costa referiu que espera que a mudança de administração em Washington abra as portas a uma nova relação transatlântica com os EUA.

"E neste dia em que tomará posse o Presidente Joe Biden, não posso deixar de lhe dirigir os votos dos maiores sucessos no seu mandato e de referir a necessidade de relançarmos as relações, cada vez mais próximas, com os Estados Unidos"
, nomeadamente nas áreas do clima, da luta contra a covid-19, na defesa do multilateralismo, da segurança, do comércio, e também do digital, declarou.

No contexto da maior abertura da Europa ao mundo, Costa defende que a Europa deve procurar também, "naturalmente, continuar a reforçar, desde logo, as parcerias de vizinhança, a Leste e a Sul, e a parceria estratégica com o continente africano", além das relações transatlânticas com o Reino Unido, os Estados Unidos e a América Latina.

O chefe do executivo português deixou também uma palavra em particular para o "novo vizinho e velho aliado" Reino Unido, que deixou em definitivo a União Europeia no dia em que Portugal assumiu a sua quarta presidência do Conselho da UE, 1 de janeiro de 2021.

"Atenção especial merece, obviamente, o Reino Unido, novo vizinho e velho aliado, que continuará a ser um importante parceiro para a União Europeia"
, disse Costa, que espera em breve o consentimento do Parlamento Europeu ao acordo de comércio e cooperação alcançado na véspera de Natal entre a UE e Londres.

Já "a principal marca" da presidência portuguesa, quanto ao Indo-Pacífico, "será promover uma parceria mais próxima e estratégica entre as duas maiores democracias do Mundo, a União Europeia e a Índia".

"Acolheremos uma cimeira UE-Índia, no Porto, em maio, centrada na cooperação em matéria do digital, comércio e investimento, produtos farmacêuticos, ciência e espaço"
, vincou.

De acordo com António Costa, a UE deve reforçar a sua autonomia estratégica apontando que, "como esta pandemia evidenciou, a Europa não pode estar totalmente dependente do fornecimento por terceiros de bens essenciais, nem de cadeias de valor tão extensas, que têm um elevado risco de interrupção".

"Trata-se de um debate muito exigente porque implica ao mesmo tempo a política industrial, a política de concorrência e a política comercial",
admitiu, ressalvando de imediato que tal "não pode significar nem uma deriva protecionista, nem a mirífica promoção de 'campeões europeus'".

Em tom de conclusão, Costa fez questão de se referir ao que classificou como "uma questão central da relação da Europa com o Mundo: as migrações", um tema que admite não ser consensual entre os 27.

"Estamos cientes das diferentes sensibilidades existentes. Mas as migrações são uma realidade desde que existem seres humanos no planeta. E assim continuará a ser enquanto a espécie humana conseguir sobreviver. É também inegável que a sua gestão exige uma ação europeia comum. Devemos, portanto, continuar o trabalho sobre o novo Pacto para as Migrações e o Asilo, tentando encontrar o equilíbrio adequado entre as suas dimensões interna e externa, sem esquecer também a migração legal", declarou
Von der Leyen agradece a Costa liderança no pilar dos direitos sociais
Depois de apresentadas as prioridades da presidência portuguesa ao Parlamento Europeu, a presidente da Comissão Europeia agradeceu ao primeiro-ministro português pela sua "liderança e apoio" no pilar dos direitos sociais.

"Quero agradecer ao António pela sua liderança e apoio nesta questão", declarou Ursula von der Leyen, falando no Parlamento Europeu, em Bruxelas.

A líder do executivo comunitário vincou que, como defendido por Portugal, "a recuperação ecológica e digital tem de ser algo que crie empregos", numa altura em que a UE atravessa uma das mais severas crises gerada pela pandemia de covid-19.

"Estou ansiosa para a cimeira social no Porto, em maio, onde poderemos passar uma mensagem unida juntamente com os sindicatos, associações de empresários, parceiros sociais e instituições da UE", referiu.

Ursula von der Leyen adiantou ainda que, em fevereiro, a Comissão Europeia irá "dar resposta a alguma das grandes tendências societais", para depois, em março, "apresentar o plano de ação dos direitos sociais".

Adotado há três anos, o Pilar dos Direitos Sociais defende um funcionamento mais justo e eficaz dos mercados de trabalho e dos sistemas de proteção social, nomeadamente ao nível da igualdade de oportunidades, acesso ao mercado de trabalho, proteção social, cuidados de saúde, aprendizagem ao longo da vida, equilíbrio entre vida profissional e familiar e igualdade salarial entre homens e mulheres.

A Comissão Europeia está a preparar a sua proposta para o plano de ação e deve apresentá-lo dentro de semanas, cabendo à presidência portuguesa conduzir o debate e negociar um compromisso entre os 27 que permita ‘fechar’ um acordo em maio, aquando da cimeira social no Porto.

A presidente da Comissão Europeia defendeu ainda a partilha pela União Europeia dos 2,3 mil milhões de doses de vacinas para a covid-19, o que colocará o bloco "do lado certo da história".

O mecanismo de partilha de vacinas da UE é uma demonstração de solidariedade e "os que mostram apoio a os seus parceiros com doses e ações não serão esquecidos, mas os que não auxiliam serão lembrados por razões muito diferentes e estou determinada a que a Europa fique do lado certo da história e da humanidade".

Através deste mecanismo, a UE vai canalizar vacinas contra a covid-19 diretamente ou através do consórcio Covax para países vizinhos dos Balcãs Ocidentais e os parceiros orientais e do Norte de África.

A líder do executivo comunitário reconheceu que "alguns perguntarão como é que podemos estar a falar de partilhar as vacinas com outros quando ainda não estamos todos vacinados".

"A estes eu respondo: esta não é apenas uma questão de solidariedade, mas também de interesse próprio, só juntos conseguiremos sair desta pandemia. Isto é válido para a nossa saúde, para as nossas economias, para as nossas cadeias de abastecimento e também para a nossa credibilidade e influência geopolítica", disse.

Após o debate no hemiciclo e a conferência de imprensa conjunta, o primeiro-ministro terá reuniões separadas com os líderes das duas maiores bancadas do Parlamento Europeu, o alemão Manfred Weber, presidente do grupo do Partido Popular Europeu (PPE), e a espanhola Iratxe García, presidente do grupo dos Socialistas e Democratas (S&D).

A terminar a agenda da deslocação desta quarta-feira de António Costa a Bruxelas, está prevista uma nova reunião com Charles Michel, na sede do Conselho, às 17h00 locais.


c/ agências
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