Segurança israelita sobre brasas. Fuga de dados põe em causa secretas e exército

por Paulo Alexandre Amaral - RTP
Ronen Zvulun, Reuters

Israel pode estar perante o mais complexo caso de fuga de informação da sua breve história enquanto país. Os dados de 6,5 milhões de eleitores - nomes completos, números de bilhete de identidade, cartas de condução, moradas, etc - poderão ter ido parar às mãos de agências de informações inimigas, em particular dos serviços secretos iranianos.

De acordo com o Haaretz, os serviços de informações da Mossad e das operações especiais são pontos sensíveis da organização israelita que poderão agora estar expostos a interesses inimigos nesta fuga de dados de 6,5 milhões de cidadãos.

O jornal escreve que os serviços de informações da Mossad e das operações especiais são pontos sensíveis da organização israelita que poderão agora estar expostos a interesses inimigos nesta fuga de dados de 6,5 milhões de cidadãos.

O deslize ocorre a escassas três semanas de um acto eleitoral crucial para o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e envolve a Elector Software, uma pequena empresa que desenvolveu uma app para os telemóveis com vista às campanhas e que estão a ser usadas pelo Likud de Netanyahu e outros partidos.O cruzamento de dados poderá permitir identificar pessoas vivas ou falecidas cujas identidades estão a ser usadas em missões secretas para ocultar ou dar credibilidade a cenários de encobrimento.

Esta app permite aceder a todo o caderno eleitoral e é usada para pôr as eleições em andamento e manter o contacto com vai votar. É neste contexto que são revelados todos os dados sobre os eleitores: nomes completos, número dos bilhetes de identidade, género, números de telefone e moradas.

O Haaretz refere aqui o problema que esta violação de sigilo representa para milhares de funcionários da Mossad e do Shin Bet, os principais serviços de informações israelitas. Em causa igualmente departamentos como a comissão israelita da energia atómica ou as forças armadas (IDF – Israel Defense Forces), em particular pilotos, pessoal dos serviços secretos, forças especiais e cientistas nucleares.

Trata-se aqui de uma falha de segurança que poderá, em última instância, obrigar o aparelho israelita a chamar a casa agentes infiltrados em outros países e reconfigurar toda a rede de espionagem no estrangeiro. Os receios serão os de terem sido queimados agentes através da revelação de dados que poderão levar – uma vez que muitas das vezes os espiões recorrem a identidades que não as suas – à sua identificação através do cruzamento com outros dados.Elector Software. A questão faz lembrar o escândalo com a britânica Cambridge Analytica, que interferiu em vários processos eleitorais, sendo o mais célebre o norte-americano que resultou na eleição de Donald Trump.

O site israelita sugere mesmo que este leak constitui uma mina de ouro para inimigos como os serviços de informações iranianos e o Hezbollah, não desprezando a valia que têm igualmente para agências com relações mais ou menos amistosas com Israel.

O Haaretz lembra que “nas últimas três décadas agentes da Mossad ficaram expostos enquanto viajavam com passaportes falsos” de várias nacionalidades que não a de Israel.

No quadro desta fuga em massa de dados, a questão que mais parece preocupar é a possibilidade de ligar as identidades do registo eleitoral com actividades levadas a cabo por israelitas no estrangeiro. Em causa ficam as operações e a segurança dos agentes envolvidos.

O referido cruzamento de dados pode levar agências hostis a identificar não apenas pessoas vivas como também pessoas falecidas cujas identidades estão a ser usadas em missões secretas para ocultar ou dar credibilidade a cenários de encobrimento.

No imediato, poderá verificar-se desde logo uma intromissão no processo eleitoral israelita, crucial para o primeiro-ministro Netayahu, que enfrenta várias acusações que poderiam levá-lo a prisão efectiva em caso de condenação. Mas, claro, para enfrentar o julgamento, Benjamin Netanyahu terá, antes de tudo, perder a proteção da sua imunidade enquanto chefe do Governo.

Numa dimensão que não a da segurança israelita, a questão da app da Elector Software faz ainda lembrar o escândalo Cambridge Analytica, a empresa britânica que durante anos interferiu de forma decisiva em vários processos eleitorais, o mais célebre a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos.

E tudo começava para a Cambridge Analytica com o aproveitamento de dados pessoais, provenientes de fugas, de recolhas, de compra ou de roubo informático. A fase seguinte era manipulação e a fabricação de receitas personalizadas para reverter o sentido de voto na direcção dos candidatos que recorriam aos seus serviços de consultoria.

A empresa enfrentou processos legais que levaram ao seu encerramento. Alguns dos seus principais colaboradores reconheceram o carácter ilegal da sua acção durante os processos eleitorais em que estiveram envolvidos e o perigo que a Cambridge Analytica representava para a democracia.
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