Trump coloca em causa nacionalidade de Kamala Harris: "Ouvi dizer que não cumpre os requisitos"

por Joana Raposo Santos - RTP
Esta não é a primeira vez que Donald Trump apoia teorias que colocam em causa a nacionalidade e elegibilidade dos seus rivais. Kevin Lamarque - Reuters

Donald Trump disse na quinta-feira ter "ouvido" que Kamala Harris, a escolhida por Joe Biden para a vice-presidência norte-americana em caso de vitória nas eleições de novembro, "não cumpre os requisitos" necessários para esse cargo, promovendo dúvidas sobre a nacionalidade da candidata. Especialistas na Constituição já contestaram as palavras do Presidente e garantem que Harris é elegível.

As declarações de Trump surgiram depois de este ter sido questionado, em conferência de imprensa, sobre a teoria de um professor de direito segundo a qual Kamala Harris não é elegível devido ao estatuto de imigração dos pais da candidata na altura do seu nascimento.

“Eu ouvi dizer hoje que ela não cumpre os requisitos e, já agora, o advogado que escreveu esse artigo de opinião é um advogado altamente qualificado e muito talentoso”, afirmou Donald Trump.

“Não faço ideia se ele está certo”, admitiu, no entanto, o Presidente. “Assumiria que os democratas tivessem verificado isso antes de a escolherem para a corrida à vice-presidência. Mas isso é muito sério, o que estão a dizer. Estão a dizer que ela não se qualifica porque não nasceu neste país”.

Em resposta, o jornalista que questionou Trump clarificou que não há dúvidas sobre o local de nascimento de Kamala Harris e que a teoria apenas questiona se os pais da candidata eram residentes permanentes dos Estados Unidos na altura em que a mesma nasceu.

Horas antes da conferência de imprensa, uma conselheira da campanha de Donald Trump tinha partilhado um tweet do grupo conservador Judicial Watch no qual surgia a hipótese de Harris “não ser elegível para vice-presidente sob a Constituição norte-americana com base na cláusula de cidadania”.

Está comprovado que Kamala Harris nasceu na Califórnia a 20 de outubro de 1964, filha de pai jamaicano e mãe indiana. Por ter nascido nos Estados Unidos, é elegível para o cargo de vice-presidente e até para o de Presidente.

Esta não é a primeira vez que Donald Trump apoia teorias que colocam em causa a nacionalidade e elegibilidade dos seus rivais. Durante vários anos, defendeu que o ex-Presidente Barack Obama não tinha nascido nos EUA, apesar das provas do seu nascimento no Havai, um dos Estados norte-americanos.
Em que consiste a teoria contra Harris?
Foi John Eastman, professor de direito na Chapman University, na Califórnia, quem começou por levantar dúvidas sobre a elegibilidade de Kamala Harris. Num artigo de opinião para a revista Newsweek, o especialista cita o Artigo II da Constituição norte-americana segundo o qual “nenhuma pessoa, exceto um cidadão nascido nos EUA, pode ser elegível para o gabinete da presidência”.

Eastman levanta questões sobre a cidadania dos pais de Harris na altura do seu nascimento, argumentando que a agora candidata pode “dever a sua fidelidade a uma potência estrangeira” caso os seus pais fossem, na altura, apenas “visitantes temporários” e não residentes permanentes nos EUA.

“O seu pai era (e é) um cidadão jamaicano, a sua mãe é da Índia, e nenhum foi naturalizado como cidadão norte-americano pela altura do nascimento de Harris. Isso, segundo comentadores, faz com que ela não seja uma cidadã dos EUA – e, por isso, não é elegível para o gabinete da presidência”, argumenta o professor. Os pais de Kamala Harris concluíram os seus doutoramentos na Universidade da Califórnia em 1963 e estavam a trabalhar na área académica quando a filha nasceu, em 1964.

Segundo especialistas na Constituição, o estatuto de imigração dos pais de Haris na altura do seu nascimento é irrelevante pois qualquer pessoa nascida nos Estados Unidos adquire automaticamente cidadania americana.

“Todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos, e portanto sujeitas à jurisdição desse país, são cidadãs dos EUA e do Estado onde residem”, indica a 14.ª Emenda constitucional, e vigor desde a década de 1890.

“O vice-presidente tem de cumprir os mesmos requisitos de elegibilidade que o Presidente”, explicou à Associated Press a professora de direito Juliet Sorensen. “Kamala Harris tem de ser uma cidadã norte-americana, tem de ter pelo menos 35 anos e residir nos EUA há pelo menos 14 anos. Ela cumpre todos esses requisitos”.

Harris foi eleita na terça-feira por Joe Biden para a vice-presidência caso este consiga a vitória nas eleições de novembro, nas quais terá Donald Trump como rival.
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