Venezuela. Serviços secretos detêm chefe de gabinete de Guaidó

por Carlos Santos Neves - RTP
Danos na porta da casa de Roberto Marrero em Caracas, alvo da operação denunciada pelo campo de Juan Guaidó Ivan Alvarado - Reuters

Os serviços secretos da Venezuela detiveram durante a madrugada desta quinta-feira Roberto Marrero, chefe de gabinete do autoproclamado presidente interino, confirmou Sergio Vergara, líder do grupo parlamentar da Vontade Popular, partido de Juan Guaidó. A operação do SEBIN foi denunciada no Twitter pelo próprio presidente da Assembleia Nacional.

“Desde as 2h24 funcionários do SEBIN assediam as casas do deputado e chefe de bancada da VP Sergio Vergara e o chefe do meu gabinete, o advogado Roberto Marrero. Neste momento mantêm-nos sequestrados no local”, começou por escrever Juan Guaidó na sua conta no Twitter.


O presidente da Assembleia Nacional escreveria, adiante, novo tweet para denunciar o que descreveu como um sequestro.


Foi pouco depois das 5h00 locais (9h00 em Lisboa) que o denominado Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional deteve o braço direito do autoproclamado presidente interino, Roberto Marrero.

Os operacionais do SEBIN terão entrado sem mandado judicial nas casas de Marrero e Vergara no bairro de Las Mercedes, em Caracas.

O momento da partida das viaturas do serviço de informações foi captado em vídeo.

Sergio Vergara e Roberto Marrero - à esquerda e à direita, respetivamente, na fotografia - acompanharam Juan Guaidó no périplo que este realizou, em fevereiro, por países da América Latina, assim como Francisco Sucre, presidente da Comissão de Política Externa da Assembleia Nacional da Venezuela.



Sucre, que tem operado como um ministro dos Negócios Estrangeiros de Juan Guaidó, está ao corrente desta operação. O responsável esteve em Lisboa até quarta-feira, tendo entretanto partido para Rabat, na Argélia.

A RTP apurou que o presidente da comissão parlamentar não conta regressar a Caracas a breve trecho.
O testemunho de Vergara

O líder da bancada parlamentar da Vontade Popular descreveu os acontecimentos da madrugada em Las Mercedes.

“Mantiveram-me no chão, entraram em casa e perguntaram-me se estava com mais alguém. Perguntaram-se se sabia onde vivia Roberto Marrero, ao que não respondi. Repeti-lhes que estavam a violar um direito constitucional, como a imunidade parlamentar, pelo que de nenhuma forma tinha de obedecer a ordens inconstitucionais”, contou Sergio Vergara.

“Entraram mais de 15 na minha vivenda, encapuzados”, acrescentou o deputado.

“Depois entraram dois fiscais, muito contrariados, e mandaram sair todo o pessoal. A partir desse momento, começaram a golpear a porta da casa de Roberto Marrero, a alguns metros da minha porta, até que conseguiram entrar”, prosseguiu.

A RTP obteve um registo em áudio do momento em que os elementos dos serviços secretos arrombam a porta da casa do chefe de gabinete de Juan Guaidó.

“Roberto Marrero gritou-me que lhe tinham apontado duas armas e uma granada. Eles mandaram que se calasse e eu disse-lhe que tivesse muita força”, relatou ainda Sergio Vergara.

“Estamos nesta luta para libertar a Venezuela. Fica claro que a ditadura continua a sequestrar os corpos de segurança, continua a sequestrar os cidadãos, que estes funcionários, tal como nós, padecem das mesmas penúrias, que não entendem a situação que estão a viver, mas continuam a cumprir estas ordens inconstitucionais”, afirmou.

A RTP teve igualmente acesso a um vídeo que mostra como ficou a casa de Roberto Marrero após a operação denunciada pelo campo de Guaidó.


País em colapso e debaixo de sanções

Na quarta-feira, um dia depois do anúncio de novas sanções por parte do Tesouro dos Estados Unidos contra o Governo de Nicolás Maduro, a alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, advertiu contra o impacto desta via sobre um país a viver uma crise profunda – social, política e economicamente.

“A dimensão e a gravidade das crises nos domínios alimentar, sanitário e dos serviços de base não foram plenamente reconhecidas pelas autoridades [venezuelanas], da mesma forma que as medidas que adotaram foram insuficientes”, avaliou a antiga Presidente do Chile perante o Conselho dos Direitos Humanos da ONU.
A Administração Trump e meia centena de países – entre os quais a maior parte dos Estados-membros da União Europeia, incluindo Portugal – reconheceram a legitimidade ao autoproclamado presidente interino da Venezuela.
Para acrescentar: “Ainda que esta crise social e económica devastadora tenha começado antes da imposição das primeiras sanções económica, em 2017, preocupa-me que as recentes sanções sobre transferência financeiras ligadas à venda de petróleo venezuelano aos Estados Unidos possam continuar a agravar a crise económica, com possíveis repercussões sobre os direitos fundamentais das pessoas e o seu bem-estar”.

Em causa está um embargo de Washington ao petróleo venezuelano que deverá entrar em vigor a 28 de abril, garroteando assim exportações vitais para a economia daquele país da América Latina.

Na terça-feira, em Genebra, a secretária de Estado adjunta dos Estados Unidos para os Assuntos Interamericanos, Carrie Filipetti, procurava garantir que as sanções não teriam por finalidade depauperar ainda mais a população venezuelana: “Tentámos direcionar ao máximo as nossas sanções para que possam afetar o regime e preservar, dentro do possível, os venezuelanos”.

Michele Bachelet, cujo gabinete conta publicar em junho um relatório sobre a Venezuela, denunciou também o que disse ser a contração “do espaço democrático” no país, “em particular a criminalização contínua de manifestações pacíficas e de dissidentes”.

Dados recolhidos pelo Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos indicam que as forças especiais de segurança da Venezuela foram responsáveis, em 2018, pelas mortes de pelo menos 205 pessoas. Outras 37 foram abatidas em janeiro de 2019 em Caracas.

Jorge Valero, o embaixado da Venezuela junto do Conselho dos Direitos Humanos, contrapôs que o Governo de Maduro reconhece o “direito à manifestação”, acrescentando que as últimas vagas de protesto constituíram “atos de vandalismo e criminosos” levados a cabo “por um sector violento da oposição financiado pelo exterior”.

c/ agências
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