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Zuckerberg debaixo de fogo. Facebook continua a pagar fatura da complacência para com Trump

por Paulo Alexandre Amaral - RTP
Erin Scott, Reuters

"When the looting starts, the shooting starts" (quando começam as pilhagens, começam os tiros). A frase deixada num tweet de Donald Trump foi o toque de alvorada para uma guerra que está a apanhar Mark Zuckerberg, patrão do Facebook, no fogo cruzado. Contestado primeiro pelos próprios funcionários por não remover o post que na sua rede replica uma mensagem do presidente no Twitter, são agora líderes dos Direitos Humanos a criticar esta complacência de Zuckerberg para com o presidente norte-americano.

Na noite desta segunda-feira, Mark Zuckerberg, CEO e maior accionista do Facebook, esteve reunido com líderes de três organizações de defesa dos Direitos Humanos. No final do encontro, ficou uma ideia: a decisão do patrão do Facebook de manter a mensagem do presidente em que instigava os militares a usarem fogo real para controlar os tumultos de Minneapolis cria um precedente perigoso.

A morte de George Floyd às mãos de uma patrulha policial de Minneapolis mergulhou os Estados Unidos numa onda de violência que continua a encher as ruas por todo o país. As autoridades enfrentam manifestações em centenas de cidades sem perspectiva de colocar um ponto final à escalada que já leva uma semana.

Na última quinta-feira, o presidente Trump colocou na sua conta do Twitter uma mensagem em que ameaçava controlar a situação com fogo real: “Quando começam as pilhagens, começam os tiros”. O Twitter ocultou a mensagem. O Facebook decidiu mantê-la quando foi replicada na sua rede.

A par da luta pelos Direitos Humanos, os últimos dias estão também a escrever um pouco do que é a caminhada das redes sociais nas encruzilhadas que colocam as plataformas da Internet face a face com momentos críticos da história.
Facebook isolado "com o presidente"

Os primeiros dados revelam um isolamento do Facebook face a todos os parceiros da net: por exemplo, o Twitter decidiu ocultar os tweets de Donald Trump e o Youtube deu folga aos empregados para poderem participar em marchas de protesto. O Spotify, numa mensagem inequívoca – “O Spotify está ao lado da comunidade negra na luta contra o racismo e a injustiça” –, encorajou os seus funcionários a juntarem-se ao espírito das manifestações.

O Facebook, pelo contrário, tem mantido toda a abertura para os discursos violentos de Trump, mesmo nesse caso em que o presidente ameaçou manifestantes com fogo real nas ruas norte-americanas. É uma linha que está a ser traçada e que não agrada aos funcionários de Zuckerberg, apesar de este se defender com o mote de que “as redes sociais não devem ser donas da verdade”.

Durante o fim de semana foram vários os funcionários superiores do Facebook que usaram as suas contas no Twitter para mostrar o desagrado face à política neutra que está a ser seguida na sua empresa em relação à atitude permanentemente beligerante do presidente dos Estados Unidos.

Após a reunião com Zuckerberg, os líderes de três importantes organizações de defesa dos Direitos Humanos também não esconderam a desilusão face à posição defendida pelo dono do Facebook, de nada fazer quanto à mensagem de Donald Trump a ameaçar os “saqueadores” com fogo real. “Um perigoso precedente para outras vozes que poderão vir a colocar mensagens igualmente perigosas no Facebook”, lamentaram.
"Explicações incompreensíveis de Zuckerberg"

“Estamos desapontados e estupefactos com as explicações incompreensíveis de Mark [Zuckerberg] para permitir que os posts de [Donald] Trump permaneçam na rede, disseram Vanita Gupta, Sherrilyn Ifill e Rashad Robison em comunicado. Não demonstrou perceber a histórica supressão de voto e recusa-se a reconhecer como o Facebook está a facilitar o apelo de Trump à violência contra os manifestantes”, referiram num comunicado conjunto Vanita Gupta, Sherrilyn Ifill e Rashad Robison, líderes da Leadership Conference on Civil and Human Rights, da NAACP Legal Defense and Educational Fund e da Color of Change.

Em cima da mesa esteve a discussão do post de Trump da última quinta-feira e que, ao invés de funcionar como um travão aos protestos mais violentos, acabaria por ter o efeito de gasolina atirada para uma fogueira.

Depois de a rede Twitter de Jack Dorsey ter restringido a visibilidade desse tweet do presidente, Mark Zuckerberg tomou pessoalmente esta crise em mãos para decidir manter o post no Facebook com o argumento de que a empresa tem uma política que permite "alertas de uso da força por actores do estado".
A repulsa "pessoal" de Zuckerberg

O portal de notícias The Verge publicou entretanto as gravações de uma reunião interna do Facebook, na última sexta-feira, durante a qual Zuckerberg terá confessado o seu desagrado pessoal relativamente ao post de Donald Trump.

“Lidar com este post do presidente tem sido muito difícil (…) A minha primeira reação foi de repulsa. Não é desta forma que eu penso que os nossos líderes devem emergir nestes tempos”, afirmou Zuckerberg, considerando que “este é um momento que exige unidade, calma e compreensão para com as pessoas que estão em dificuldades”.

Durante a reunião, Mark Zuckerberg terá deixado uma porta aberta a discussões futuras sobre as políticas editoriais do Facebook que permitiram, agora, manter o post do presidente Trump, mas isso não evitou que a resistência interna àquela decisão seja cada vez maior. Depois da manifestação na rede Twitter de opiniões de quadros de topo contrárias ao CEO, centenas de funcionários do Facebook “saíram” esta segunda-feira numa manifestação virtual, deixando de trabalhar, numa espécie de greve de zelo.

Em declarações a The Guardian, uma porta-voz dos trabalhadores sublinhou que, “neste momento, vemos a dor que é sentida pela nossa gente, em especial a comunidade negra, [e] encorajamos os funcionários [do Facebook] a falar abertamente sempre que discordarem da chefia [do Facebook]”.
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