Almaraz e Donald Trump: perigo nuclear

Ambos podem poluir, contaminar, envenenar tudo o que os rodeia. O desastre é imprevisível, tal como são as consequências, desastrosas e irreparáveis.

“Nada pior que um louco com uma arma.” Esboço um sorriso, quando oiço a frase de um comentador da Cadena Ser, no carro. Ainda não tomou posse e Donald Trump já conseguiu desestabilizar o mundo. Sabemos que o multimilionário adora dar nas vistas, escandalizar, provocar, no entanto, na Casa Branca tudo muda de figura. Enquanto tento aquecer as mãos, numa Madrid soprada a frio polar, a discussão aquece na rádio, apesar de todos estarem de acordo. Trump tem, para além de língua afiada, um arsenal nuclear ao dispor e um jeito particular para cometer incidentes diplomáticos, tão poderosos e letais como um ataque químico. Em vésperas da tomada de posse já abriu fogo, em várias frentes:

  • Saúda o Brexit e insta outros países da União Europeia a fazerem o mesmo, a promoverem referendos para se separarem do projeto europeu. Claro que desmantelar, enfraquecer a Europa é a melhor forma de destruir económica e politicamente qualquer "rival”;
  • Assegura que a Nato está obsoleta;
  • Acusa Angela Merkel de potenciar atentados terroristas graças à política migratória da Alemanha;
  • Atiça a ira dos palestinianos quando, em plena Cimeira do Médio Oriente, em Paris, faz saber que pretende mudar a Embaixada norte-americana de Telavive para Jerusalém;
  • Espicaça os mexicanos, continua a provocar o Presidente Peña Nieto que já assegurou que não vai pagar muro nenhum, a separar os dois países.

O diretor da CIA não poupa nas críticas mordazes ao Presidente eleito. John Brennan pede a Donald Trump para pensar antes de falar e lança um alerta, assegura que Trump não compreende a ameaça real que os russos representam para os EUA. O problema é que, ao que tudo indica, Donald terá o “rabo preso” e bem “preso” por Putin. Estará mais condicionado do que se sabe ou pensa.

Numa semana, marcada pelas decisões unilaterais de Espanha quanto à construção de um cemitério de resíduos nucleares em Almaraz, a menos de uma centena de quilómetros de Portugal, o mundo inteiro estremece perante os riscos da “loucura” de um único homem.

Em Espanha, Almaraz nem sequer é notícia. Não aparece nas páginas dos jornais. No encontro, no imponente Ministério da Agricultura e Ambiente de Madrid, só apareceu, para além da imprensa portuguesa, uma televisão e uma rádio regionais, da Estremadura. Portugal apresentou queixa em Bruxelas. Espanha não comenta.

Em nada me surpreende o desfecho. Sempre disse nas intervenções em direto, para os noticiários da RTP e da Antena 1, que seria quase impossível o Executivo de Mariano Rajoy voltar atrás, retroceder depois de dar luz verde às mais distintas etapas do processo, em vários ministérios e instituições estatais. Mais, questiono se, alguma vez, ponderaram a possibilidade de o fazer.

Quem ficou mal na fotografia foi o próprio Rajoy e o Rei Filipe VI. Em novembro, na Moncloa, o Presidente do Governo de Espanha garantiu a António Costa que tudo seria feito com transparência (e foi, mas sem consultar Portugal). Quanto ao monarca, por ocasião das cerimónias fúnebres de Mário Soares, reuniu-se com o Presidente da República a quem deixou a certeza de não existirem decisões unilaterais quanto a Almaraz. Terá sido mesmo esta afirmação que desbloqueou o encontro entre o Ministro do Ambiente português e a homóloga espanhola, contudo, as duas horas de reunião não serviram para nada e tanto as palavras de Mariano como as do Rei caíram em saco roto.

Mesmo assim, deve ser mais fácil travar e desmantelar Almaraz, do que parar um homem que nem sequer se sabe comportar como homem, quanto mais como político e ainda mais como presidente do EUA.

Quanto aos riscos de ambos, mantem-se o equilíbrio: são imprevisíveis, tóxicos e potencialmente letais.

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