Os que me conhecem sabem o gosto que tenho pela floresta, onde cresci. O verde da Serra da Lousã, que defendi enquanto jovem e adolescente no trabalho extenuante na pista de combate aéreo e nos bombeiros, faz parte do melhor das minhas memórias e do mais fabuloso do tempo em que consigo andar por ali de bicicleta ou fazendo uma caminhada pelas margens da ribeira de São João.
O fogo é uma imensa tragédia que leva as vidas, a esperança, as árvores que demoraram séculos a consolidar aquela paisagem, a fauna que ali foi crescendo, um cenário de paraíso, que se pode transformar num minuto apenas num inferno.
Sei, por experiencia própria nesses dias em que tentava a maior eficácia nas descolagens e aterragens de aviões e helicópteros na apertada Torre da Lousã, que a presença de governantes e lideres políticos no momento do combate acaba por ser profundamente perturbadora da lucidez necessária nesses pontos fulcrais.
Estamos perante uma catástrofe e o abraço dos políticos, do Presidente, é fundamental para incentivar as populações, mas não deve passar demasiado tempo pelos centros de comando. Numa sala de comunicações, um minuto apenas de falta de atenção pode ser fatal na coordenação dos meios e na perceção de uma realidade extremamente volátil.
Recordo um ano cheio de fogos, onde meio governo nos entrou na torre de controlo e o aperto que tivemos no coração até que voltasse o nosso sereno caos, com concentração total, na busca de uma resposta sempre à altura.
Permitam-me que sugira a quem vai ao terreno que não esqueça mesmo esta tragédia e se crie mesmo um consenso alargado que permita aplicar uma reforma séria da floresta, sem pressões do "lobby" dos eucaliptos, pensando no valor que tem uma vida, duas, três, quarenta e seis vidas que se perderam no meio de uma floresta criminosamente desordenada num dia cheio de avisos para fenómenos extremos no clima.
Ainda nos lembramos de Arouca, de Mação, e Águeda e de muitas outras tragédias e das outras tantas promessas de mudar tudo, acontecendo pouco ou nada.
Voltar a ter uma floresta mais segura em Portugal vai demorar décadas, mas é preciso não se perder mais tempo.