Como os discos de vinil, que muitos já nem sabem o que são, cada um de nós tem um lado B. O meu lado B, curiosamente, tem ainda mais a ver com os discos: é a música.

Passei uma vida a tocar as minhas duas vidas para a frente, como num gráfico de barras paralelas, onde num momento subia uma, noutro outra. Sem misturar.

Como é que o jornalismo se mistura com notas, se o destino não se armar aos cucos? Racional, objectivo, factual, o jornalismo exige-me desde 1988 frieza e ponderação, mais objectivos e menos subjectivos, horas de factos, de facto relevantes, um quase positivismo.

A música? Dá-me desde 76 a fuga para a frente, para o lado, em diagonal ou para cima. Para onde me apetecer. Salto de uma para outra desde 88, à medida da vontade, da possibilidade e da necessidade. Numa hora um lado é mar para mergulhar, outro é ar para respirar.

Vira e toca a dar.

Até há muito pouco tempo, a minha música, o exercício mais treinado do meu direito à subjectividade, não adivinhava cruzar-se, na mesma casa, com o meu dever de objectividade. Mas lá está: o destino é o autor de enredos mais imaginativo do Mundo.

É por isso, que neste entroncamento da vida, é possível que, sem pinga de vergonha minha, o tema que pinta a letras juntas o voto de esperança da RTP na seleção, tenha origem na mesma mão que escreve o resumo da selecção.

Desejos e factos. Facção e neutralidade. Do mesmo para os mesmos.

O subjectivo toca, o objectivo escuta. Vice-versa. Lado A, lado B.

Como a tinta garrida da foto, basta lavar e sai. Não custa nem pode custar. Para voltar a entrar quando saio de serviço. Saí assim... Que hei-de fazer?

Diria outra letra forte, adaptando: "Talvez! Talvez! ... Talvez viver."

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