As duas caras de Trump

Não olhes para o que eu tweeto, olha para o que eu faço.

Donald Trump escolheu Jerome Powell para substituir Janet Yellen à frente da FED, o banco central americano, o que quer dizer que não estará tão lunático como se diz. O presidente não tinha como manter Yellen, depois das críticas que lhe fez – possivelmente só porque foi lá colocada por Obama –, mas acabou por trocá-la por alguém que pertenceu ao gabinete de Yellen e que deverá prosseguir a mesma política monetária.

Nada mau como exemplo de moderação de um homem que nos habituámos a ver como um bronco narcisista, impreparado para o lugar, e de quem até a sanidade mental ultimamente foi posta em causa, com o argumento de que o pai teve Alzheimer e de que quem sai aos seus também degenera. Porém, a escolha de Trump não admira, porque a última coisa que desejará é comprometer um dos poucos sucessos do seu primeiro ano, registados na frente económica e com a ajuda da FED.

Nem sempre isso é muito visível, numa imprensa distraída com os tweets matinais intempestivos do presidente, estimulados pelo Fox & Friends, a que assiste religiosamente na televisão. Mas, com Trump, a economia americana continuou a crescer acima dos 3%, o desemprego baixou de 4,8%, com Obama, para 4,1%, e os mercados bolsistas continuam de boa saúde e em crescendo, desde que Obama deixou a Presidência. Os salários estão a aumentar e, com eles, a confiança dos consumidores.

É verdade que Trump tem beneficiado de uma conjuntura económica internacional favorável. Pode-se igualmente dizer que o melhor que tem feito é não estragar aquilo que vinha de Obama. Mas nem tudo foi herdado. A política desregulatória e de cortes fiscais que promoveu é música para os ouvidos de empresários e investidores. Em Davos, Trump disse que os EUA nunca estiveram tão bem para os negócios e muitos dão-lhe razão. Um ano depois, não se pode dizer que não tem cumprido a promessa eleitoral de estimular a economia e criar empregos.

Houve outras áreas em que Trump não foi tão radical como se supunha, como na política comercial ou nas questões de imigração. Até agora, o nível de deportações de imigrantes ilegais nos EUA não foi diferente dos de anos anteriores, e o presidente até já admite apoiar uma reforma da imigração que trate de forma humana e justa os cerca de 11 milhões de ilegais que vivem na América e estão ameaçados de expulsão. Trump falou mesmo em “dar o peito às balas” para enfrentar a sua base eleitoral intolerante face a qualquer “amnistia” para os ilegais.

Surpreendentemente competente e discreto, ainda mais tratando-se de um louco, tem sido também o modo como tem vindo a preencher lugares nos tribunais federais, com juízes republicanos de direita de quem espera que garantam o seu legado nos próximos largos anos. Convém, por isso, não subestimar a controversa figura a quem muitos têm passado antecipadas certidões de óbito. Até porque, em 2018, Trump terá ainda boas razões para poder contar com o momento favorável da economia global e dos mercados acionistas internacionais. E ainda pode recorrer à arma dos investimentos públicos, que prometeu e dos quais se esperam novos estímulos económicos.

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